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Brasil

Edição 142 > Uma celebração à obra referencial de Moniz Bandeira

Uma celebração à obra referencial de Moniz Bandeira

Cezar Xavier
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A União Brasileira de Escritores (UBE) prestou uma homenagem singela aos 80 anos do historiador e cientista político, Luiz Alberto Moniz Bandeira. Estudiosos de sua obra celebraram os livros que marcaram gerações na luta contra o imperialismo, em defesa da democracia e do socialismo

No dia 14 de junho, uma terça-feira fria de inverno, o auditório da União Brasileira de Escritores (UBE), no centro de São Paulo, foi calorosamente ocupado por cerca de quatro horas para um encontro com a obra de Moniz Bandeira, o cientista político e historiador brasileiro, especialista em política exterior do Brasil e suas relações, principalmente com a Argentina e os Estados Unidos. O escritor baiano nasceu em Salvador, dia 30 de dezembro de 1935, tendo completado 80 anos de escritos, lutas e lúcida análise das turbulências que atingem o Brasil e o mundo neste início de século.
Havia expectativa de uma conferência virtual com Moniz Bandeira, direto de Heidelberg, na Alemanha, onde ele se encontra radicado e é cônsul honorário do Brasil. Devido a uma cirurgia bucal, ocorrida às vésperas da homenagem, o historiador não pode realizar a conferência online. Apesar disso, não deixou de mandar uma mensagem, onde expressa sua preocupação pela democracia:
“Fiquei imensamente feliz pela iniciativa e muito agradecido em ver meus amigos tratarem de aspectos diversos da minha obra. A iniciativa da UBE é também de grande importância institucional neste momento histórico em que cabe a todos os brasileiros a defesa de nossa democracia, dos direitos fundamentais, do devido processo legal e de nossas instituições, bem como a reflexão sobre os perigos que nos ameaçam.” 

O furacão revolucionário passando pelo Brasil

O vice-presidente do PCdoB, Walter Sorrentino, considerou a iniciativa da UBE “brilhante”, porque Moniz Bandeira é um “grande brasileiro, patriota anti-imperialista, um homem comprometido”. “Mas, também, pelo momento que estamos vivendo, que tem muita relação com a obra dele, muito crítico para a evolução do mundo sob domínio imperialista. Isso tudo o Moniz Bandeira trata em profundidade, com clareza”, acrescentou. O dirigente do PCdoB disse estar muito orgulhoso de ter participado da homenagem. 
Sorrentino analisou uma obra tão densa, do ponto de vista da pesquisa, quanto as demais, mas talvez a mais literária de todas: O Ano Vermelho – A Revolução Russa e seus Reflexos no Brasil. “Apesar de densa, é uma leitura deliciosa, histórica”, afirmou. 
“Posso dizer de cátedra que o Ano Vermelho se tornou uma obra inexcedível até hoje, mesmo para a historiografia do Partido Comunista do Brasil, às vésperas das comemorações dos cem anos da Revolução Russa”, enfatiza o dirigente partidário. O livro faz um amplo levantamento dos reflexos da Revolução de 1917 em nosso país, entre os quais, o mais perene foi a fundação do Partido Comunista do Brasil em 1922.
Sorrentino ainda saudou um fato pitoresco envolvendo Moniz, que poucos talvez conheçam. “Uma outra amostra do compromisso de Moniz, um homem que não era sectário”. Foram descobrir numa entrevista recente com Moniz para a biografia de João Amazonas, que quem sugeriu o nome do PCdoB foi ele. “É pouco conhecido esse episódio. Ele conversava com Diógenes Arruda, com Maurício Grabois e João Amazonas. Numa conversa dessa, meio que brincando, ele disse: ‘Olha, tem que diferenciar. Porque vocês não chamam PCdoB, então-’. E nós, rapidamente... aquilo foi captado. Vida longa a Moniz Bandeira!”

A formação de um ultraimpério

O presidente da UBE, o advogado Durval de Noronha Goyos Jr., comentou a Formação do Império Americano, e sugeriu que este seria “o livro mais importante sobre a história dos EUA que jamais se escreveu em qualquer língua”. Ele destacou o fato de esse livro ter sido traduzido para o chinês e se tornado uma referência didática na China. 
De acordo com Noronha Goyos Jr., a cosmovisão que ele já apresentava nos primeiros trabalhos nas décadas de 1960 e 1970, na análise dos problemas brasileiros, ele transferiu para o cenário internacional, que transcende a fronteira dos EUA. Segundo ele, Moniz usa a análise dialética para estudar o fundamento teórico sobre o imperialismo, passando pelo debate entre Kautsky e Lênin, para situar o pano de fundo da sua visão sobre o assunto. “Moniz nos explica onde estão os interesses e o que os americanos fazem para consolidar as suas vantagens”, afirma Goyos Jr., após pontuar diversas situações históricas envolvendo a estratégia geopolítica norte-americana. 
“Esta obra magnífica, o fez recipiente do Prêmio Juca Pato, da UBE, e que é uma das maiores produções intelectuais de um historiador em qualquer lugar do mundo”, concluiu o advogado.
As relações suspeitas entre EUA e Brasil

O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães não economizou distinção a Moniz Bandeira, “certamente, o maior historiador brasileiro na área de política externa e política internacional”. “Ele faz a história sobre os tempos atuais. Seus livros sobre os EUA, sobre a presença americana no Brasil, sobre a integração latino-americana são muito importantes para conhecermos o momento político que nós vivemos”, complementou em entrevista à Princípios. 
Sobre Brasil, Argentina e Estados Unidos (Da Tríplice Aliança ao Mercosul), ele ressalta que, apesar do título, a obra revela a política norte-americana para a América do Sul, incluindo Cuba. “Ele procura mostrar as iniciativas americanas em cada uma das grandes questões que tiveram lugar na América Latina”.
Moniz mostra nesta obra, de acordo com o diplomata, todos os objetivos permanentes da política exterior americana para a América Latina. “Ele mostra como esses objetivos são perseguidos, sistematicamente, e como eles se desenvolvem através da utilização de todos os meios, ostensivos, ou do tipo que eles chamam operações encobertas”, diz Guimarães. 
Ele ainda cita como exemplo disso, o modo como os EUA estiveram presentes no consórcio golpista brasileiro contra o governo Dilma, de forma subterrânea e extraoficial. “Nós estamos vivendo, hoje, no Brasil, um episódio dessa estratégia. Estamos vivendo isso, hoje, nos dias que correm”, enfatizou. Em sua obra, Moniz revela como os EUA operam o financiamento de ONGs e movimentos rebeldes para desestabilizar governos não alinhados a sua política.
Ainda sobre o livro, Moniz mostra como, nesse processo, a estratégia dos EUA de evitar a cooperação entre Brasil e Argentina. “Desde a época da proposta do Barão do Rio Branco, de criação do Pacto do ABC, que era mais uma questão de entendimento político, nada demais, mas que foi considerado hostil pelo Departamento de Estado americano, no telegrama que Moniz cita”.
Estamos agora numa situação em que os EUA já incorporaram em seu sistema toda a América Central, e parte da América Latina. “E agora partiram para o ataque, do ponto de vista econômico, final Mercosul, que é feito através dessa proposta de acordo com União Europeia”, menciona Guimarães, atualizando a historiografia de Moniz. 
Ele explica que a estratégia americana na América Latina é eliminar todas as barreiras ao comércio, aos capitais, desregulamentar tudo.
“Segundo os defensores deste acordo, o que vai acontecer- As nossas empresas multinacionais poderosíssimas vão enfrentar a competição com as pequeninas empresas alemãs, francesas e inglesas, e vamos vencer a competição”, ironiza.

Rompendo paradigmas sobre a América do Sul

O cientista político Tullo Vigevani destaca a pesquisa documental de Moniz Bandeira como a grande força de sua obra. Ainda que sejam contestadas suas análises e conclusões, o trabalho exaustivo e raro de documentação histórica é inquestionável. “Trata-se de uma pesquisa documental que não muitos estão acostumados a fazer no Brasil. Por isso, nesta comemoração dos seus 80 anos, esse aspecto deve ser bem valorizado”, reafirmou. Para ele, a comemoração e avaliação dessa obra “é uma necessidade na vida intelectual e também política brasileira”. 
Vigevani apontou as originalidades da pesquisa e da análise de Moniz Bandeira em A expansão do Brasil e a formação dos Estados na Bacia do Prata. “Ele considera as influências da Bacia do Prata sobre o conjunto do contexto sul-americano, retomando, inclusive, a política de Simon Bolívar, e criticando-a até, em relação a alguns problemas vividos nas relações entre Brasil e Argentina, no início do século XIX”.
Um dos aspectos prioritários na leitura deste livro é a inversão de uma perspectiva ufanista da fundação e do desenvolvimento do estado brasileiro. Este é o aspecto primeiro destacado por Vigevani em sua leitura da obra. De acordo com ele, Moniz consegue provar e inverter um raciocínio tradicionalmente ufanista da política brasileira. “Ele não somente destrói o caráter ideológico, ou o caráter com que foram sempre lidas as operações bandeirantes e a expansão do território brasileiro. Ele também mostra, exatamente, como isso foi feito dentro da lógica da expansão comercialista internacional, para favorecer, primeiro, Portugal, depois Inglaterra, e, finalmente, EUA, em vez de colonizar para desenvolver as populações locais. 
“A ação da elite brasileira daquele período acabou formando o Estado brasileiro, mas um Estado brasileiro que vinha dentro de uma perspectiva de expansão e ‘rapinagem’ daqueles grupos, setores, áreas, povoados que não estavam dentro da formação da colônia portuguesa”, resume ele.
Outro aspecto que chama bastante a atenção nesta obra, segundo Vigevani, é a polêmica e a reinserção que Moniz Bandeira fez em relação à guerra do Paraguai. Ao contrário de uma leitura mais difundida das relações na Bacia do Prata, e particularmente da guerra do Paraguai, ele mostra as responsabilidades da elite paraguaia. “Ao contrário de considerar que foi o desenvolvimento do Paraguai que produziu e deu força a Solano Lopez para ter uma política de enfrentamento com o Império brasileiro, haviam sido a fraqueza e o atraso da sociedade paraguaia, que possibilitaram a Solano Lopez considerar a possibilidade de enfrentar uma aliança tão poderosa como era a Tríplice Aliança”, destaca o sociólogo, o raciocínio principal do livro a esse respeito. 

Guerras Frias e encobertas

O sociólogo Levi Bucalem Ferrari destacou o caráter internacionalista de sua obra. “Presta atenção, que a maioria dos grandes escritores brasileiros fala do Brasil, enquanto ele fala do mundo. Isso é raro. Em geral, só norte-americanos e europeus falam do mundo”, enfatizou. 
Sobre A Segunda Guerra Fria, geopolítica e dimensão estratégica dos Estados Unidos, Ferrari denunciou a acusação que fazem a Moniz de “usar e abusar da teoria da conspiração”. “De fato, só se deve usar teoria da conspiração quando tiver provas. Mas e se houver provas- E o Moniz vai atrás das provas”, defende ele.
Ao comparar as duas fases da Guerra Fria, conforme demonstra Moniz Bandeira, a concepção estratégica dos EUA muda e passa a ter uma atuação muito mais agressiva do que na primeira fase. “Na primeira guerra fria, os EUA tinham que jogar um jogo de xadrez. Dá cá, toma lá. Daí ter surgido o Estado de Bem-Estar Social na Europa. Na segunda guerra fria não precisa disso! É neoliberalismo direto. Quem acha ruim vai levar porrada, vai ser boicotado”, diz Ferrari.
Na segunda fase da Guerra Fria, momento que vivemos historicamente no Brasil, os EUA não aceitam nenhuma contestação a sua hegemonia. Diferente da primeira, em que os países discordantes se alinhavam aos seus blocos, agora não. “Você comprou, anteontem, aviões da França, quando eu queria vender os meus, então eu já te pus no meu caderninho”, exemplificou ele, citando uma transação comercial recente do Brasil. “Uma das causas do golpe branco é alguma desobediência de Lula e Dilma”, disse ele, sobre a derrubada de Dilma do poder, por meios institucionais. Portanto, diz Ferrari, é assim que os EUA ameaçam, com boicotes comerciais, atentados, falso terrorismo, derrubada de governo, invasões e guerras.
No longo prazo, a maior concorrência da política externa dos EUA é o BRICS (bloco de países emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Ferrari lembra que os BRICS chegaram a cogitar uma moeda única, que enfraqueceria o dólar. Agora, com o golpe no Brasil, o bloco deve sofrer baixa. 

A poética na obra acadêmica

Apresentadas as principais obras acadêmicas de Moniz Bandeira, a escritora e poetisa Cássia Janeiro ficou encarregada de comentar a obra poética do historiador, uma vertente que ele desenvolve desde adolescente, mas que publicou de forma esparsa e com grandes intervalos. Ela lembra de ter tido seu primeiro contato com a obra de Moniz por meio de O Ano Vermelho. “Eu fiquei estarrecida, em primeiro lugar, pela beleza desse livro”, enfatizou ela.
Para ela, não é difícil enxergar a importância da poesia na obra acadêmica desse grande pensador brasileiro. “Encontrei uma frase do Moniz Bandeira que corrobora isso de forma brilhante: Em tudo que escrevi, poesia ou prosa, existe uma unicidade em que a comunidade de propósitos e a práxis se entrelaçam”, comparou ela.
Verticais foi publicado em 1956 e Retrato e o Tempo em 1960, mas Poética, com sonetos de amor, só veio a público em 2009, revelando um hiato enorme na vida poética de Moniz Bandeira. Ele teria dito que a vida acadêmica roubou-lhe a lírica, mas Cássia discorda ao observar que a lírica está presente também nos estudos acadêmicos do autor. 
Sobre a obra mais recente, ela vê um diálogo interessante entre o historiador, o poeta e o amante. “São sonetos de amor de beleza ímpar, que revelam a complexidade inseparável do poeta, do estudioso acadêmico, do ser humano, homem e apaixonado”. 

O intelectual engajado

A professora Regina Gadelha fez uma apresentação emotiva e detalhada da trajetória de Moniz Bandeira, ao ressaltar seu comprometimento político e engajamento com as melhores causas durante estes 80 anos de vida. 
“Ele é o intelectual orgânico engajado. Não faz um livro pelo livro, vai além. Quer trazer matéria, não somente de denúncia, como de reflexão. A luta de classes está sempre presente; dos grupos que manipulam e estão em poder”, explica ela. 
Regina se sentiu inspirada pela homenagem a um “intelectual engajado, coerente, de imensa honestidade”, comprovada em mais de 60 anos de trabalhos ininterruptos. Ela fez um amplo relato de fatos biográficos que definem a trajetória acadêmica, política e pessoal de Moniz. Suas pesquisas nos arquivos dos EUA, suas dificuldades e prisão pela ditadura, seu exílio e luta com Leonel Brizola e João Goulart, suas relações com o PCB e a Polop [Organização Revolucionária Marxista – Política Operária]. Sua gratidão pelos muitos que o ajudaram a passar por toda a turbulência com dignidade. 
Regina salientou o modo como ele dá um depoimento da sua própria vida em cada prefácio que escreve. No caso de O Ano Vermelho, ele trata da trajetória para levar a cabo suas pesquisas e as dificuldades para publicação da primeira edição, em 1967, escrito em condições difíceis de clandestinidade e que só veio a público graças à coragem pessoal do seu editor Ênio Silveira. 
“Na ocasião da publicação desse livro, que ele entrega pouco antes de entrar na prisão, ele inclusive dá um depoimento de que trabalhou mais de 18 horas por dia, durante seis meses, porque sabia que ia ser preso”, cita ela. 
Ele relata no prefácio lido pela historiadora: “Entendi que não podia nem devia cuidar da minha vida pessoal. Abandonar a luta, enquanto muitos homens e mulheres, muitos dos quais eu pessoalmente conhecia, arrostavam com armas na mão o regime autoritário. Para mim, que não cria que a luta armada pudesse derrocar o regime autoritário, era necessário combatê-lo por outros meios, como intelectual que sempre fui”. 

*Cezar Xavier, jornalista, integra a equipe de redação da revista Princípios e do portal Grabois


Poesia

Canto do Outubro
Moniz Bandeira
Que ficou de teu mundo-
Onde aqueles que te ajudaram a construí-lo-
Os muros tragaram balas e palavras
e a erva cresceu sobre os lábios dos mortos
que a noite ocultou.
Sempre noite, sempre inverno,
flocos de neve caindo
na memória dos que marcaram
as estradas do tempo.
Os mortos.
Sangue, pólvora, cinza, pedra,
e um século preso nos seus dentes.
Vê a alvorada,
a alvorada que vem,
que ainda vem,
que surgirá de lágrimas e de sonhos,
quando nos campos,
verdes campos,
hoje cobertos de neve,
as sementes brotarem e as árvores florescerem.
Quando todas as vozes,
rasgando túmulos e quebrando espelhos,
vibrarem nos subterrâneos do mundo.
Vê quantos homens
caminham pela madrugada.
Eles esperam por ti.
Esperam que os relógios sangrem
à dor das horas.
Que os rios contidos
desemboquem pela boca dos mortos
despertados ao canto das aves
e dos clarins de fogo da alvorada.
E o sol,
O sol que tu levaste nas mãos,
será de todos.  

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