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Brasil

Edição 142 > Economia, dinâmica de classes e Golpe de Estado no Brasil

Economia, dinâmica de classes e Golpe de Estado no Brasil

Alexis Dantas* e Elias Jabbour
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(anatomia da crise brasileira)

 

1. INTRODUÇÃO

Uma crise política de dimensões quase inéditas levou recentemente ao impedimento da presidente do Brasil, Dilma Rousseff. Explicações padronizadas, e estilizadas, dão conta do término de um ciclo político causado por sucessivos governos maculados “moralmente”, agente direto dos “maiores escândalos de corrupção da história do país”. Nesta estilizada narrativa, os governos Lula e Dilma foram responsáveis diretos por uma crônica crise econômica, cuja causa finca raiz na crescente intervenção estatal sobre a economia. Intervenção esta que atingiu seu ápice em 2012 com as orientações anexas à “Nova Matriz Macroeconômica”.
Em verdade, o país vive uma das piores crises econômicas de sua história, com inflação e desemprego alarmantes e o PIB [Produto Interno Bruto] com dois anos consecutivos de queda próximas de 4% ao ano e uma relação dívida x PIB em trajetória ascendente. É exatamente sobre a crise fiscal onde se concentram os principais argumentos explicativos da presente crise política. E a guarida a este tipo de argumentação é essência de uma visão ultraliberal, com objetivos políticos claros, segundo a qual a própria disputa da classe média possibilita um ponto de encontro entre o fenômeno da corrupção e a própria ação do Estado na economia. Neste caso, criminalizar o Estado é apenas o primeiro passo à criminalização da própria política (1).
Ao contrário, argumentamos que a crise política é produto de um processo de aproximação de diferentes grupamentos da classe empresarial brasileira que ganha força em meio às manifestações de junho de 2013 em resposta a uma construção política de consagração de uma transição, desde 2003, a um Novo Projeto Nacional Brasileiro com grandes consequências sobre a própria estrutura de intervenção do Estado na economia a partir de induções com reflexos positivos sobre o emprego, a renda do trabalho e o padrão de vida dos trabalhadores brasileiros, sendo a crise econômica um epifenômeno.
Neste sentido, além desta introdução, este artigo está dividido em quatro seções. Na segunda seção demonstraremos que, apesar da manutenção dos alicerces macroeconômicos consagrados desde 1999 (política de metas de inflação, por exemplo), avanços significativos ocorreram em matéria de crescimento econômico, elevação da renda, queda do desemprego e investimentos públicos. Ademais, os números expostos na seção corroborarão nosso argumento acerca da inexistência de condições objetivas a uma crise econômica da magnitude que ocorre no Brasil desde 2015. A seção 3 tratará da dinâmica política da sustentação do projeto eleitoral vencedor desde 2002. Projeto este cujo característica sugere uma dinâmica de continuidade e ruptura – dadas suas características –, logo (e também) de gestação um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento; serão elencados ainda os constrangimentos, políticos e institucionais, ao avanço deste mesmo projeto. Na quarta seção analisaremos os movimentos políticos e econômicos do governo Dilma Rousseff, onde demonstraremos o processo desde o desmoronamento do pacto de poder que sustentou os dois governos Lula até a consolidação de Frente Única conservadora que se tornou vanguarda na criação de um ambiente econômico propício a um golpe de Estado de novo tipo. Nas conclusões evidenciaremos os contornos do processo como um todo.
  
2. ECONOMIA BRASILEIRA NO PÓS-
-LULA: CONTINUIDADE E RUPTURA

A crise cambial brasileira de janeiro de 1999 impôs a necessidade de mudanças importantes na condução da política econômica local, considerando-se a impossibilidade de continuação do modelo de âncora cambial utilizado no Plano Real de 1994, que operava como seu principal alicerce (2). Com a necessária variação para um regime de câmbio flutuante, a taxa de juros passou a operar como variável básica de controle da inflação, a partir da adoção do modelo de metas de inflação. De acordo com Ferreira e Jayme Jr. (2005, p. :2), o sistema de metas inflacionárias é 

“Caracterizado pelo anúncio oficial de uma meta de crescimento para algum índice de preço escolhido a priori para um determinado período [...]. Assim, tais metas coordenariam a formação de expectativas inflacionárias dos agentes e a fixação de preços e salários”.

Neste contexto, a política fiscal passa a exercer um papel de variável de ajuste no modelo – como a taxa de juros impacta a dívida pública pelas despesas financeiras, seria necessária a obtenção de superávits primários no intuito de impedir uma trajetória explosiva das contas públicas.
Apesar das mudanças ocorridas, a ideia central que domina a formação da política econômica é a mesma que orienta a gestão do Plano Real, definindo a estabilidade de preços relativos como determinante crucial para a criação de um ambiente favorável ao crescimento econômico com competitividade. Nesse caso, segundo Dantas (2013:67-68),

“Quanto à questão do crescimento econômico, a conjugação das metas inflacionárias com uma política fiscal austera garantiria, de acordo com o modelo adotado, a estabilidade econômica requerida, oferecendo aos agentes econômicos um cenário propício para as decisões de investir. A capacidade de elevar as taxas de crescimento resultaria, em última instância, do aumento de produtividade dos fatores de produção, desde que os mecanismos de mercado atuassem sem interferências, sobretudo no que diz respeito aos preços relativos estáveis e à conformação de um ambiente favorável ao aumento da concorrência na economia (em especial a concorrência externa)”.

A chegada de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência em 2003, após uma vitória eleitoral com larga margem em 2002, não trouxe mudanças na condução da política econômica, mantendo o tripé definido após 1999 (câmbio flutuante, metas de inflação e austeridade fiscal) e as regras institucionais então vigentes, com destaque para uma atuação independente do Banco Central na condução da política monetária e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Na verdade, o quadro já tinha sido definido desde antes da eleição de 2002. A viabilidade crescente de câmbio de poder político, com a iminente vitória de Lula, criou um cenário de incerteza e instabilidade, principalmente pela atuação fortemente especulativa dos agentes financeiros. Desta forma, Lula garante em carta aberta (a assim chamada Carta ao Povo Brasileiro) a manutenção da estabilidade institucional e da política econômica.
Os Gráficos 1 e 2 mostram a efetiva manutenção do compromisso assumido, incluindo o primeiro mandato presidencial de Dilma Rousseff iniciado em 2010. De acordo com o Gráfico 1, pode-se observar que o resultado primário do setor público foi mantido em superávit ao longo de todo o período, com redução apenas nos anos em que houve redução no ritmo de crescimento da atividade econômica, como em 2009 e 2014. O Gráfico 2, por sua vez, assinala o comportamento estável da inflação nos mesmos anos, sempre dentro das metas de inflação definidas.
Apesar da continuidade visualizada, entretanto, uma importante ruptura passa a ocorrer, sobretudo a partir de meados do primeiro mandato de Lula com a ampliação dos programas de transferência de renda e a criação de novos mecanismos fundamentais de políticas sociais e de desenvolvimento econômico. Destacam-se aí a política de valorização real do salário-mínimo e a elaboração de programas de investimento na infraestrutura e oferta crescente de crédito, principalmente via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Os resultados foram evidentes. Em primeiro lugar, a combinação de crescimento das despesas com transferências (com papel central para o programa Bolsa Família) e, mais importante, do expressivo aumento real do salário-mínimo (e, por consequência, do salário médio real no Brasil), determinou uma redução drástica da parcela de pessoas em situação de extrema pobreza no país, além de uma melhora substancial nos índices de distribuição de renda. Além disso, registrou-se um aumento efetivo nas inversões nos setores de infraestrutura e nos créditos fornecidos pelo BNDES.
Como mostram os Gráficos 3 e 4, o salário-mínimo real aumentou cerca de 76% entre 2002 e 2014, enquanto o rendimento médio real do trabalho elevou-se em aproximadamente 36% (2002 a 2013).
Ao mesmo tempo, os dispêndios do BNDES foram cinco vezes maiores em 2014 que em 2002, com forte aceleração a partir de 2008-2009. Já os investimentos em infraestrutura foram 3,2 maiores em 2013 frente a 2014 – Gráficos 5 e 6.
Em segundo lugar, esses fatores conjugados inauguraram uma nova matriz de crescimento da economia brasileira, cujo pilar fundamental passou a ser a evolução da massa salarial e seu impacto para o consumo das famílias (3), mas contando também com aumento importante da taxa de investimento no Brasil (4). Os Gráficos 7 e 8 apresentam a evolução da massa salarial e do consumo das famílias no período de análise. A massa salarial cresceu cerca de 2/3 entre 2002 e 2013, enquanto o consumo das famílias registrou taxa de crescimento positiva entre 2004 e 2014, em especial até 2010 (crescimento médio de 4% ao ano entre 2006 e 2014). A partir de 2011, este modelo passa a perder força, apesar de manter taxas sempre positivas – tema que será retomado à frente.
Em terceiro lugar, com o maior ritmo de crescimento empreendido pela economia brasileira (particularmente entre 2004 e 2010), registrou-se uma redução significativa da taxa de desemprego, que saiu da casa dos dois dígitos – que marcou o índice desde os anos 1990 – para 4,8% no final de 2014. Vale destacar ainda que a taxa de desemprego brasileira apresentou uma trajetória de queda constante desde o início do primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, com exceção apenas do ano de 2009, auge da crise financeira internacional, quando subiu 0,2% relativamente ao ano anterior (com queda do PIB de 0,3%) – Gráficos 9 e 10.
Finalmente, cabe acrescentar que, mesmo considerando o aumento real do salário-mínimo e do rendimento médio real, abordado anteriormente, a criação de empregos formais seguiu crescendo forte ao longo do período, embora claramente venha perdendo força desde 2012 – ver Gráfico 11.
Observa-se, portanto, que os números da economia brasileira não indicavam qualquer tendência a uma inflexão mais radical de desempenho, talvez introduzindo, no máximo, uma necessidade de reorientação de alguns movimentos de política econômica, sobretudo na contenção de um possível (mas ainda incerto, até 2014) descontrole inflacionário (um aumento para 6,41, já próximo ao teto, com expectativas de elevação). Isso tudo em um ambiente de retração do ritmo de crescimento a partir de 2011, principalmente. Do ponto de vista fiscal, nenhuma grande mudança até 2014, mas com uma menor capacidade de arrecadação em função do menor crescimento do PIB – quadro distante de uma crise fiscal anunciada de grandes proporções, principalmente pela oposição nos debates da eleição presidencial.
No que se refere ao quadro externo, a despeito da piora das condições das transações correntes, e a expectativa de queda continuada no preço das commodities e seus efeitos para a exportação brasileira, a situação das reservas acumuladas (Gráfico 12) ao longo dos anos anteriores garantia uma confortável possibilidade de gestão do balanço de pagamentos, sem qualquer prenúncio viável de crise externa (mesmo considerando a possibilidade e os pré-anúncios de perda do grau de investimento conferido ao país pelas agências internacionais de risco, cada vez mais questionadas no mundo quanto à sua credibilidade).
Todavia, o que se verificou foi uma forte reversão no contexto econômico brasileiro, com uma recessão importante em 2015 (queda de 3,8% do PIB), forte acirramento do processo inflacionário (o IPCA atingiu a marca de 10,7%) e, ao mesmo tempo, uma deterioração rápida e abrangente do resultado fiscal, tanto pelo viés primário (o déficit primário subiu para 1,9% do PIB) como, sobretudo, do déficit nominal, obviamente alavancado pela forte alta da taxa básica de juros no país (a dívida pública saltou de 33,7% em 2014 para 38,3% ao final de 2015). O resultado imediato foi o rápido avanço da taxa de desemprego (chegou a 6,8% no ano) e uma crescente insatisfação popular, ainda inflada pelas denúncias de corrupção cada vez mais abrangentes.
Uma pergunta evidente, nesse contexto, é: Como explicar uma crise econômica que se tornou tão profunda em pouco espaço de tempo, considerando um quadro (efetivo e potencial) absolutamente distinto até meados de 2014- É o que será tratado nas próximas seções deste artigo.

* Alexis Dantas é professor Associado da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCE-UERJ). E-mail: alexis.dantas@gmail.com

** Elias Jabbour  é professor Adjunto da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCE-UERJ). E-mail: eliasjabbour@terra.com.br

Leia a íntegra deste artigo na internet: A segunda parte deste artigo, que compreende as seções 3, 4 e Conclusão, bem como as referências bibliográficas estão publicadas juntamente com a primeira parte na versão digital da revista Princípios. Disponível para leitura no endereço eletrônico http://www.revistaprincipios.com.br  (busque pela edição 142) 

Notas

(1) Daí a vazão a manifestações de cunho ultradireitista que foram ganhando força na mesma medida em que o movimento pelo impeachment transformava-se em fenômeno de massa.
(2) A âncora cambial serviria como instrumento fundamental de controle dos preços relativos, em um ambiente de liberalização comercial e financeira. De acordo com Dantas (1998), a âncora cambial contribuiu para a “elaboração de planos de estabilização do nível de preços de grande sucesso em seus objetivos iniciais. A ideia básica assumida por estes planos era garantir uma flutuação interna de preços que seguisse a trajetória internacional. Para isso, era necessário que se efetuasse uma abertura comercial (e câmbio fixo, ligeiramente valorizado) de forma que, inicialmente, os tradables fossem pressionados pela concorrência internacional, comprimindo margens de lucro e estabilizando, internamente, seus preços. Em cadeia, este processo acabaria por atingir (em maior ou menor grau), o conjunto de produtos não tradables da economia permitindo a estabilização geral do nível de preços. Uma vez atingido este objetivo, mecanismos tradicionais de política monetária seriam suficientes para alongar o prazo da estabilização da moeda – com apenas um problema: a manutenção do câmbio fixo e valorizado, engessando instrumentos mais diretos de política cambial” (p. 12).
(3) Vale ressaltar ainda o papel do inconteste aumento do crédito ao consumidor e da expansão do crédito consignado no Brasil.
(4) A taxa de investimento chegou, após muitos anos, perto dos 20% do PIB (19,5% em 2010), perdendo força a partir de então, mas ainda em níveis superiores a 2002.


1-Resultado primário do setor público – Brasil – 2002-2014

2-Inflação anual (IPCA) – Brasil – 2002-2014

3-Salário-Mínimo real – Brasil – 2002-2014

4-Rendimento médio real – Brasil – 2002-2013

5-Créditos do BNDES – Brasil – 2002-2014

6-Investimentos em infraestrutura – 
Brasil – 2002-2013

7-Massa salarial real – Brasil – 2002-2014

8-Taxa de crescimento do consumo das famílias – Brasil – 2002-2014

9-Variação anual do PIB – Brasil – 2002-2014

Fonte: Elaboração própria a partir de Economia Brasileira em Perspectiva – Ministério da Fazenda – 2014

10-Taxa de desemprego – Brasil – 2002-2014

11-Criação de emprego formal – Brasil – 
2002-2014

12-Reservas internacionais – Brasil – 2002-2014

Fonte: Elaboração própria a partir de Economia Brasileira em Perspectiva – Ministério da Fazenda – 2014

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