• Home
  • Nossa História
    • Nosso Time
  • Edições
    • Principios de 101 a atual
    • Coleção Principios - 1 a 100
  • Índice Remissivo
  • Contato

Revista Principios

  • Home
  • Nossa História
    • Nosso Time
  • Edições
    • Principios de 101 a atual
    • Coleção Principios - 1 a 100
  • Índice Remissivo
  • Contato

Capa

Edição 148 > Os 80 anos da morte de Antonio Gramsci: um esboço biográfico

Os 80 anos da morte de Antonio Gramsci: um esboço biográfico

Augusto Buonicore
Twitter
FaceBook

A infância e a adolescência na Sardenha

Gramsci nasceu em 22 de janeiro de 1891 numa pequena cidade na ilha da Sardenha. Aos 20 anos ingressou na Universidade de Turim para fazer o curso de Letras. Ali entrou em contato com a filosofia de Croce e Gentile, idealistas neo-hegelianos. Dentro desse espírito, num artigo de 1914, afirmou: “Os revolucionários (…) concebem a história como criação do próprio espírito.”.

Esse idealismo antipositivista se traduziu também no famoso artigo sobre a revolução socialista na Rússia. Segundo ele, a Revolução Bolchevique havia sido uma “revolução contra O Capital de Karl Marx”. Continua ele: “Os fatos fizeram explodir os esquemas críticos segundo os quais a história da Rússia deveria desenvolver-se conforme os cânones do materialismo histórico (…), se os bolcheviques renegam algumas afirmações de Marx de O Capital, não renegam seu pensamento imanente, vivificador.”.

Naquela época entrou em contato com os círculos marxistas e o movimento operário. Então, Gramsci abandonou o curso e se tornou redator d’ O Grito do Povo e colunista do Avanti!, órgão oficial do Partido Socialista Italiano (PSI). Em 13 de agosto de 1917, Turim realizou uma grande manifestação de apoio à Revolução Russa ainda em curso. Uma semana depois eclodiu uma greve geral que rapidamente se transformou numa insurreição. Cinquenta operários morreram e cerca de duzentos ficaram feridos. A prisão de quase todos os membros da seção turinense do PSI levou Gramsci a assumir uma função na direção partidária. No entanto, Gramsci acabou sendo preso.

Os Conselhos de Fábrica de Turim

Em abril de 1919 Gramsci e um grupo de jovens socialistas turinenses – como Togliatti, Tasca e Terracini – lançaram L’Ordine Nuovo. Sob forte influência da Revolução Russa, o jornal rompeu com a linha “culturalista” e lançou-se a uma ação nitidamente política. O grande objetivo era elaborar uma estratégia compatível com a realidade italiana, que possibilitasse ao proletariado conquistar e manter o poder político. Mas para realizar tal objetivo era preciso responder a uma pergunta crucial: “Existiria na Itália (…) um germe, um projeto, um esboço de sovietes?”.

A resposta de Gramsci era que sim. E este germe eram as comissões internas de fábricas. Mas era preciso mudar o seu caráter. Elas deveriam deixar de ser meros aparelhos dos sindicatos burocratizados e passar a ser eleitas pelo conjunto dos trabalhadores, independentemente de serem sindicalizados. Assim, as comissões de fábrica se transformariam em verdadeiros Conselhos de Fábricas, embriões dos sovietes.

Em pouco tempo mais de 150 mil operários haviam eleitos suas comissões de fábrica, somente em Turim. Entre 1919 e 1920 o movimento atingiu o seu auge. No mês de abril de 1920, diante da uma medida governamental que alterava a jornada de trabalho, os metalúrgicos de Turim ameaçaram deflagrar uma greve geral. Os patrões ameaçaram fechar as fábricas e começaram a demitir os dirigentes operários. 

Os trabalhadores responderam com uma greve. Ela ficou conhecida como “greve dos ponteiros” e se transformou numa greve geral em Turim – em seguida se estendeu por toda a região do Piemonte, atingindo mais de 500 mil trabalhadores.  Apesar da derrota e da repressão patronal que se seguiu, os operários conseguiram manter sua organização dentro das fábricas. A “Torino Rossa” continuava sendo uma ameaça à burguesia italiana. Era preciso quebrar a espinha dorsal da organização dos trabalhadores, destruindo as comissões de fábrica.

Em junho, a Federação Italiana dos Operários Metalúrgicos (FIOM) apresentou novamente aos industriais suas reivindicações. Os patrões recusaram-se a atendê-las. A FIOM decidiu-se pelo desencadeamento de um processo de obstrução da produção por toda a Itália. A entidade dos Industriais ordenou o fechamento das fábricas. Ao lock-out patronal os operários responderam com uma nova tática, a ocupação das fábricas. Em Turim mais de 140 empresas foram ocupadas. Os operários passaram a organizar a produção, estabelecendo a autogestão. O movimento pouco a pouco foi adquirindo um caráter insurrecional. Mais de 500 mil operários participaram da luta.

Diante de tal quadro o governo interveio e convidou as partes a negociar. Os patrões a contragosto concordaram com a concessão de um aumento salarial e ampliação do direito de férias. A burguesia então se preparou para uma contraofensiva. Entre 1921 e 1922, as principais lideranças das comissões de fábricas foram demitidas e incluídas nas “listas negras”. 

Ainda no meio dos acontecimentos, Gramsci e seus camaradas procuraram tirar lições daquele importante movimento. “Os operários turinenses”, afirmou ele, “compreenderam que não basta invadir as fábricas e nelas hastear a bandeira vermelha para fazer a revolução, sabem que a conquista das fábricas não pode substituir a luta pela conquista do poder político”. A partir deste momento Gramsci se jogaria na tarefa de organizar o Partido Comunista da Itália e colocá-lo à altura das grandes tarefas da revolução na Itália.

A constituição do Partido Comunista

Desde 1919 Amadeo Bordiga organiza uma fração comunista no interior do Partido Socialista. Esta corrente, contudo, possuía uma linha esquerdista e fazia uma avaliação fatalista da crise do capitalismo e da vitória iminente do socialismo. O resultado foi o predomínio do doutrinarismo estéril e do imobilismo político. Sua concepção de partido era de um pequeno agrupamento de revolucionários puros que não se contaminasse quer pelas lutas cotidianas econômicas das massas quer pela ação político-institucional – e estivesse preparado para o “grande dia” da ruptura que chegaria necessariamente pela própria dinâmica (espontânea) do desenvolvimento capitalista.

Em 21 de janeiro de 1921 os delegados da fração comunista, dirigidos por Bordiga, se retiraram do Congresso do Partido Socialista em Livorno e fundaram o Partido Comunista da Itália (PCI). Gramsci passou a ser membro da nova direção e L’Ordine Nuovo tornou-se o seu órgão oficial.  
A primeira grande polêmica interna no PCI foi quanto à necessidade de participação nas eleições. Bordiga era contra e Gramsci a favor. A intervenção da Internacional Comunista fez com que as posições abstencionistas fossem derrotadas. No segundo congresso da III Internacional, Lênin fez referências positivas às posições de Gramsci e seu grupo.

A Internacional Comunista e a ascensão do fascismo

Em um artigo publicado no início de 1921, Gramsci procurou analisar as particularidades do fascismo italiano e identificar o que o diferenciava dos demais movimentos reacionários. Segundo ele, o fascismo possuía uma base de massa, sustentado na pequena burguesia urbana, que buscava recuperar espaço econômico e político perdido com a ascensão do capitalismo monopolista. No mesmo ano escreveu outro texto no qual constatava que além de possuir uma base de massa, o fascismo não se prendia à legalidade burguesa e, em certo sentido, negava-a. O fascismo era a junção entre as massas pequeno-burguesas – impregnadas de um sentimento antioperário e antissocialista – e os agrupamentos reacionários ligados aos latifundiários no campo – mobilizados contra a possibilidade de uma revolução agrária no Sul.

Os esquerdistas, liderados por Bordiga, acreditavam que o governo de Mussolini não passava de uma simples mudança de ministério. Gramsci, num primeiro momento, foi fiel à maioria e defendeu a sua política junto à Internacional. O representante soviético Zinoviev culpou os comunistas italianos pelo fracasso da tentativa de unidade da esquerda e pelo avanço do fascismo.

No entanto, em Moscou, Gramsci se pôs em total acordo com a tese de “frente única” e começou a articular a formação de um novo grupo dirigente para o PCI. Escreveu ele: “O camarada Lênin nos ensinou que, para vencer nosso inimigo de classe – que é poderoso, que tem muitas reservas à sua disposição –, devemos aproveitar qualquer rusga em seu seio e devemos utilizar todo aliado possível, ainda que incerto, vacilante e provisório.”. 
Finalmente em 1924 a corrente dirigida por Gramsci e Togliatti vence o congresso do PCI. O Partido Comunista entrava numa nova fase. Começava a deixar de ser uma organização de poucos, mas bons. Afirmou Gramsci: “Foi na última Conferência que o nosso Partido se colocou, pela primeira vez, o problema de se tornar o partido das mais amplas massas italianas.”. Ele passou a advogar a necessidade de utilizar palavras de ordem intermediárias que não fossem apenas um apelo vazio à constituição de sovietes e à conquista da Ditadura do Proletariado. Dentro da nova linha política, o PCI conclamou a unidade dos partidos de esquerda visando às eleições. O resultado foi favorável e os comunistas elegeram 19 deputados, entre eles Gramsci. 

Naquele mesmo ano eclodiu o “caso Matteotti”. Um grupo de fascistas sequestrou e assassinou o deputado socialista Giacomo Matteotti. Abriu-se uma crise política profunda. Os deputados oposicionistas abandonaram o parlamento e se reuniram em outro lugar chamado Aventino. Realizaram-se manifestações massivas contra o assassinato. O regime de Mussolini chegou a balançar. Os comunistas propuseram a realização de uma greve geral, mas a ideia não foi aprovada pelos demais partidos. 

A assembleia do Aventino também recusou a proposta de constituir-se em um poder alternativo. Constatando as vacilações dos adversários, Mussolini cassou os mandatos dos ausentes e transformou o parlamento mutilado em assembleia nacional constituinte. Pouco antes os comunistas haviam resolvido reassumir suas cadeiras na Câmara dos Deputados. Em tese, isto os excluía da cassação dos mandatos. Mesmo assim, os fascistas os destituíram dos seus cargos.

No dia 16 de maio de 1926 o deputado Gramsci subiria pela última vez à tribuna. Neste dia enfrentou o próprio Mussolini. Dirigindo-se a ele afirmou: “Vocês podem ‘conquistar o Estado’, podem modificar os códigos, podem procurar impedir a existência das organizações nas formas até então vigentes, mas vocês não podem prevalecer sobre as condições objetivas nas quais são obrigados a se movimentar (…). Em outras palavras, nós queremos declarar ao proletariado e às massas camponesas italianas, desta tribuna, que as forças revolucionárias italianas não se deixarão abater e que o seu turvo sonho (do fascismo) não conseguirá realizar-se.”. A sua postura combativa no parlamento e o seu desafio ao próprio Duce o colocaram na mira do Estado fascista. Por isto foi obrigado a entrar na clandestinidade.

As Teses de Lyon e alguns temas da questão meridional

O III Congresso do PCI se realizou em janeiro de 1926 na cidade francesa de Lyon. Ele representou a vitória definitiva de Gramsci sobre Bordiga. As teses da maioria receberam mais de 90% dos votos. Foi a primeira tentativa de uma interpretação marxista da realidade italiana e da construção de uma tática e de uma estratégia revolucionária nacional. O congresso reforçou a importância da aliança operária e camponesa. 

Em setembro de 1926 Gramsci começou a escrever Alguns temas da questão meridional. Este ficou inacabado devido à sua prisão. Nele, ele trata fundamentalmente do problema da construção da hegemonia operária. Escreveu: “O proletariado pode se tornar classe dirigente e dominante à medida que consegue criar um sistema de aliança de classe que permita mobilizar contra o capitalismo e o Estado burguês a maioria da população trabalhadora; o que significa, na Itália, (…) na medida em que consegue obter o consenso das amplas massas camponesas.”. Continuou: “O proletariado, para ser capaz de governar como classe, deve se despojar de qualquer resíduo corporativo, de qualquer preconceito ou incrustação sindicalista.”. Os proletários “devem dar outro passo à frente: devem pensar como membros de uma classe que tende a dirigir os camponeses e os intelectuais, de uma classe que só pode vencer e construir o socialismo se for seguida pela grande maioria desses estratos sociais.”.

Gramsci no cárcere

No início de novembro de 1926, o Conselho de Ministro tomou medidas que anularam as liberdades individuais, instituiu a pena de morte e um Tribunal Especial para julgar os crimes contra o Estado. A ditadura fascista fechava o seu cerco. No dia 8 daquele mês, Gramsci e os demais deputados comunistas foram presos.

Gramsci circulou de prisão em prisão numa verdadeira via crucis. Seu julgamento foi marcado apenas para 28 de maio de 1928. Nele, dirigindo-se aos seus algozes, afirmou: “Os senhores conduzirão a Itália à ruína: a nós comunistas caberá salvá-la.”. Em resposta, num duríssimo discurso acusatório, o promotor fascista declarou: “É preciso impedir que este cérebro funcione durante 20 anos.”. A sentença foi vinte anos, quatro meses e cinco dias de prisão.

Gramsci já estava havia mais de um ano e meio preso quando foi remetido à prisão de Turim. Em fevereiro de 1929, quase três anos depois da prisão, começou a redigir seus Cadernos do Cárcere. Durante aproximadamente seis anos preencheu 33 cadernos com uma letra miúda. Escreveu sobre temas variados, principalmente sobre teoria política (estratégia e tática no Oriente e Ocidente, concepção ampliada do Estado, hegemonia etc.). 
O seu estado de saúde – sempre frágil – agravou-se muito na prisão. No final de 1933 o governo fascista autorizou sua transferência para uma clínica. Duas dezenas de guardas vigiavam o perigoso paciente. Em 25 de abril de 1937 foi suspensa sua pena de prisão e ele foi solto. Dois dias depois um derrame cerebral pôs fim à sua vida. Togliatti, ao saber da notícia, escreveu: “Gramsci foi assassinado do modo mais desumano, do modo mais bárbaro, do modo mais requintado e cruel. Dez anos durou a sua morte” e concluiu: “Com a sua morte desapareceu o primeiro bolchevique do movimento operário italiano.”.

* Augusto Buonicore é historiador, presidente do Conselho Curador da Fundação Maurício Grabois. E autor dos livros Marxismo, história e revolução brasileira: encontros e desencontros; Meu verbo é lutar: a vida e o pensamento de João Amazonas; e Linhas Vermelhas: marxismo e dilemas da revolução. Todos publicados pela Fundação Maurício Grabois e a Editora Anita Garibaldi.

Bibliografia

COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci. Rio Grande do Sul: L&PM, 1981.
FIORI, Giuseppe. A vida de Antônio Gramsci. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
LAJOLO, Laurana. Antônio Gramsci: Uma vida. São Paulo: Brasiliense, 1982.
TOGLIATTI, Palmiro. Antônio Gramsci. Lisboa: Seara Nova, 1975.

 

voltar

Editora e Livraria Anita Garibaldi - CNPJ 96.337.019/0001-05
Rua Rego Freitas 192 - República - Centro - São Paulo - SP - Cep: 01220-010
Telefone: (11) 3129-4586 - WhatsApp: (11) 9.3466.3212 - E-mail: livraria@anitagaribaldi.com.br