Internacional
Edição 145 > A luta pela paz e soberania em tempos de crise do capitalismo
A luta pela paz e soberania em tempos de crise do capitalismo
Pacifistas do Brasil e do Mundo se reuniram em São Luís, no Maranhão, para analisar a atual conjuntura política mundial e renovar as estratégias da luta anti-imperialista em defesa da paz e da soberania dos povos

O estado do Maranhão, no Nordeste do Brasil, é famoso por suas paisagens paradisíacas e por sua história política marcada por décadas de exploração da oligarquia local. Foi este cenário paradoxal, hoje com um comunista à frente de seu governo – Flávio Dino (PCdoB) –, que serviu de palco para receber pacifistas de mais de 40 países e 17 estados brasileiros para participarem do Congresso do Conselho Mundial da Paz, realizado pela primeira vez no Brasil, e da 4ª Assembleia Nacional do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz).
Em meio à crise capitalista que massacra os povos do mundo, principalmente os trabalhadores, o encontro reuniu pessoas dos pontos mais extremos do planeta – do Rio Grande do Sul ao Amapá e do Chile à China – para analisar a conjuntura social e política atual e debater formas de avançar na luta em defesa da paz, da soberania, contra o imperialismo e a indústria bélica.
Para receber os dois encontros, o Maranhão promoveu um mês inteiro de atividades voltadas à população local focadas na cultura de paz. Ao longo deste período, aconteceram atividades ao ar livre, debates, palestras, campanhas de conscientização e ações voltadas para os eventos que se integraram à rotina dos maranhenses durante os quatro dias de duração. São Luís foi declarada a Capital Mundial da Paz, status que toda cidade responsável por acolher o Conselho Mundial da Paz recebe.
O governador do estado, Flávio Dino (PCdoB) participou da mesa de abertura do Congresso do CMP no dia 18 para dar as boas-vindas aos pacifistas dos mais de 40 países. Ele fez uma breve apresentação de seu governo e de sua região e agradeceu pela presença aos participantes.
Dino explicou aos participantes que os princípios da paz e da boa convivência são responsáveis por nortear o projeto político implementado por seu governo no estado. “Consideramos que o nosso estado vive um momento que nos permite contribuir, aqui desta nossa porção territorial do mundo, para que estes valores sejam vitoriosos”.
“Nós procuramos representar as ideias generosas, as ideias de justiça e igualdade que ultrapassam as noções de intolerância, de ódio e de medo. Por isso, consideramos que este encontro se situa plenamente nos objetivos do nosso governo”, finalizou o governador.
O secretário estadual de Articulação Política e Comunicação, Márcio Jerry, também participou da abertura das atividades no dia 17, quando aconteceu a Assembleia Nacional do Cebrapaz. O dirigente saudou os participantes e destacou a atuação do governador Flávio Dino na luta pela redução das desigualdades sociais numa das regiões com os mais baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do país.
Para Jerry, a administração de Flávio Dino, dedicada a melhorar a qualidade de vida dos habitantes do Maranhão, vai ao encontro dos anseios dos pacifistas do mundo que defendem a soberania e a autonomia dos povos.
Assembleia Nacional do Cebrapaz
A Assembleia Nacional do Cebrapaz reuniu 123 delegados e convidados, representantes de 17 estados – Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Piauí, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Sergipe e São Paulo – para debaterem a luta internacionalista e a solidariedade entre os povos.
A então presidenta, Socorro Gomes, deixou a função depois de 12 anos à frente da entidade, desde a sua fundação. O dirigente Antônio Barreto (Barretinho), da Bahia, assumiu a presidência, Jussara Cony, do Rio Grande do Sul, ocupou a vice-presidência e Wevergton Brito, de São Paulo, será o responsável pela secretaria geral. A nova direção, que coordenará o Cebrapaz durante o próximo triênio (2016-2018), foi eleita por aclamação.
Logo ao assumir a presidência, Barreto fez um breve discurso onde destacou o empenho dedicado por Socorro Gomes ao longo dos 12 anos em que esteve à frente da entidade. “Socorro Gomes é um exemplo de lutadora consequente. A existência do Cebrapaz deve muito a Socorro Gomes, que seguirá no Cebrapaz e será sempre uma referência para nós”.
Socorro, por sua vez, manifestou completa confiança na capacidade de Barreto e da diretoria eleita de fazer avançar o trabalho e declarou que, depois de 12 anos de mandato como presidenta do Cebrapaz, seis deles acumulando também a presidência do Conselho Mundial da Paz, irá poder se dedicar mais às tarefas do CMP e seguirá colaborando com o Cebrapaz, inclusive como membro de seu Conselho Consultivo.
O Documento Político da 4ª Assembleia recebeu diversas emendas das delegações presentes, e todas foram incorporadas pela comissão de redação, coordenada pelo atual diretor de Pesquisa do Cebrapaz, José Reinaldo Carvalho. Os delegados também aprovaram 12 moções de solidariedade ao povo sírio, ao povo venezuelano, ao acordo de paz na Colômbia, ao povo saarauí, ao povo palestino, a Cuba, ao povo turco, ao povo porto-riquenho, ao povo haitiano, às ocupações de escolas e universidades no Brasil, à luta do movimento social brasileiro para barrar a PEC 55, e uma moção de repúdio à mineradora Samarco/Vale e suas controladoras pelo rompimento da barragem de Fundão em Mariana (MG), no dia 05 de novembro de 2015.
Ao abrir a mesa de trabalhos da Assembleia, Socorro destacou que “o que acontece no cenário internacional afeta diretamente o dia a dia da população e principalmente dos trabalhadores. A fome, a injustiça, a opressão, a violência atingem todos os povos do mundo em menor ou maior grau e as causas são, em essência, as mesas”.
De acordo com o Documento Político para debate na 4ª Assembleia, “o capitalismo há muito descobriu que a guerra é um negócio lucrativo”. Estudos apontam que os gastos em armamentos representam de 1% a 3% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. Em contrapartida, dados da Organização das Nações Unidas (ONU) mostram que 1 bilhão e 800 milhões de pessoas do planeta passam fome ou estão desnutridos.
Segundo um relatório divulgado em 2015 pelo Instituto Internacional de Estocolmo de Pesquisas para a Paz (Sipri), são gastos cerca de 1,7 trilhão de dólares com armas. Ao mesmo tempo, a ONU aponta que, para erradicar a fome no mundo, seria necessário um investimento de 267 bilhões de dólares, isso significa apenas 15% do que se gasta com armamento.
Atualmente, os Estados Unidos é o país que mais investe na indústria bélica, apenas em 2016 o seu orçamento militar foi de 665 bilhões de dólares. Segundo o Pentágono, esta nação mantém 865 bases militares em aproximadamente 130 países, onde são destacados 350 mil soldados, cujo custo anual chega a mais de 100 bilhões de dólares.
A guerra é uma arma política e lucrativa a serviço da dominação dos povos e da soberania dos Estados, cujo objetivo é garantir-lhes o domínio das fontes de energia fóssil e de outros recursos naturais estratégicos, além de assegurar-lhes o controle das rotas marítimas e terrestres e ampliar a área de influência do imperialismo. Segundo a análise de Socorro Gomes, todo este aparato bélico “está a serviço das grandes multinacionais e do sistema financeiro internacional”.
Diante deste cenário catastrófico, Socorro Gomes alerta que “fazer com que isso seja do conhecimento geral, e que as pessoas se mobilizem em torno da bandeira da paz mundial exige um trabalho árduo, paciente e cotidiano de divulgação e esclarecimento. O mundo enfrenta hoje graves ameaças à paz. A busca por consolidar, a ferro e fogo, a hegemonia política de uns poucos países ricos sobre o restante da humanidade tem impacto direto na vida de milhões de pessoas ao redor do globo”.
Congresso do Conselho
Mundial da Paz
A Assembleia do Conselho Mundial da Paz, realizada entre os dias 18 e 19, teve o Cebrapaz como anfitrião e reuniu cerca de 50 delegados de 33 países, além de 13 convidados de outros dez países. Na ocasião, o governador do estado, Flávio Dino, deu as boas-vindas aos debatedores, e a presidenta nacional do PCdoB, Luciana Santos, também fez uma saudação. O lema da assembleia neste ano foi “Fortalecer a solidariedade entre os povos na luta pela paz, contra o imperialismo!”.
No dia 20 foi realizada ainda a Conferência do Conselho Mundial da Paz que recebeu o público local. Entre os participantes, estavam estudantes universitários, jornalistas e pessoas interessadas em ouvir o debate sobre a conjuntura mundial, os desafios da luta contra o imperialismo e a ameaça de uma guerra generalizada.
A presidenta do CMP, Socorro Gomes, foi reeleita, bem como o secretário-geral, Thanassis Pafilis, da Grécia. Os coordenadores regionais eleitos foram: Aqel Taqaz, da Palestina (Oriente Médio), Chris Matlhako, da África do Sul (África), Ilda Figueiredo, de Portugal (Europa), Rabindra Adhikari, do Nepal (Ásia) e Silvio Platero, de Cuba (América).
Durante a Conferência, alguns representantes de organizações de lutas pelas causas sociais do mundo apresentaram as demandas de seus países. Estiveram presentes a Associação Popular Chinesa para a Paz e o Desarmamento (CPAPD), encabeçada pelo secretário-geral Zhu Rui, e a Associação do Vietnã de Vítimas do Agente Laranja (VAVA), liderada pelo secretário-geral Nguyen Van Rinh. Outros convidados internacionais: a consulesa de Cuba, Laura Pujol; o embaixador da República Árabe Saaraui Democrática (RASD), Mohamed Laarosi Bahia; o deputado nicaraguense no Parlamento Centro-Americano, Daniel Ortega Reyes; o porta-voz nacional da Marcha Patriótica da Colômbia, Andrés Elias Gutierrez; e o jornalista e escritor belga, Michel Collon.
Durante seu discurso de abertura da Assembleia, Socorro Gomes denunciou o impacto negativo causado pelo golpe contra a presidenta Dilma Rousseff na atuação externa do Brasil. “[A destituição de Dilma] foi uma ação política concertada entre as classes dominantes brasileiras e círculos imperialistas estrangeiros, para deter o processo de construção da democracia no Brasil e impedir que continuasse desempenhando um papel proativo na luta contra a hegemonia das grandes potências, pela democratização das relações internacionais, em defesa da paz, da integração soberana e da solidariedade entre os povos. É um fato político que não deve escapar à atenção das forças do movimento pela paz. O povo brasileiro precisa da solidariedade das forças progressistas por todo o mundo”, conclamou a presidenta do CMP.
Socorro também destacou a última Cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), realizada em Havana em 2014, que declarou a América Latina e o Caribe como “Zona de Paz”. “A Proclamação diz: ‘A paz é um bem supremo e anseio legítimo de todos os povos e sua preservação é um elemento substancial da integração da América Latina e Caribe e um princípio e valor comum da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos’”.
Os princípios de solidariedade, não ingerência, defesa da soberania e luta pela paz nortearam os trabalhos dos debatedores ao longo dos dois dias de Assembleia, resultando em um documento com um balanço dos desafios e ênfase na esperança e na possibilidade de vencer as ameaças de guerra do imperialismo.
O documento denuncia o avanço da agressividade imperialista e a militarização do planeta, as agressões aos povos, as guerras, as tentativas de desestabilização e os golpes de Estado, como no Brasil, na Ucrânia, no Paraguai, em Honduras, e as tentativas incessantes na Venezuela, para deter os processos de conquistas sociais, democráticas e progressistas que desafiem as políticas imperialistas estadunidense e europeia. São também resultado disso a destruição do Estado líbio e os cinco anos de guerra na Síria, assim como a manutenção de um regime beligerante e colonialista como o israelense, dominado por uma extrema-direita disposta a manter a ocupação da Palestina; além da disputa territorial no mar Meridional da China, cenário onde os EUA tentam causar desunião entre os países vizinhos.
Por outro lado, o texto destaca a “vitória incontestável” do povo colombiano com a assinatura do Acordo de Paz entre as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército do Povo (Farc) e o governo colombiano para dar fim aos mais de 50 anos de guerra. Ressalta ainda a luta dos povos indígenas por direitos culturais, sociais e políticos e a luta com a qual o CMP sempre esteve comprometido pela descolonização do planeta.
Ao final dos dois dias de intensos trabalhos, os membros do CMP reafirmaram seu compromisso com a resistência anti-imperialista e a urgência da luta para promover integrações regionais soberanas e solidárias, uma nova ordem mundial assentada no multilateralismo e na cooperação, livre das ingerências, da militarização, das guerras, da opressão e da exploração.
* Mariana Serafini é jornalista, integra a equipe de redação do portal Vermelho
O Conselho Mundial da Paz
O Conselho Mundial da Paz (CMP) surgiu em 1949, logo após o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), quando havia no mundo um clima de insegurança e medo do surgimento de um novo conflito. À época, o CMP contou com a participação de intelectuais de todo o mundo e hoje é a maior estrutura pela Paz Internacional mundial, presente em dezenas de países.
Trata-se de uma organização internacional anti-imperialista, democrática, independente e não alinhada, de ações de massa. Desde a sua fundação, luta pelo desarmamento e pela segurança global, pela independência nacional dos países, por justiça econômica e social e desenvolvimento das nações. Além disso, pela proteção ao meio ambiente, defesa dos direitos humanos e do patrimônio cultural. E mantém a solidariedade e o apoio aos povos e movimentos de libertação pelo mundo.
Os membros do CMP respeitam os princípios e objetivos estabelecidos por seus fundadores, inspirados na Carta das Nações Unidas, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, nos princípios do Movimento dos Países Não Alinhados e na Ata Final da Conferência de Helsinque sobre Segurança e a Cooperação na Europa.
O CebrapazO Cebrapaz foi fundado em 10 de dezembro de 2004, logo após a invasão do Iraque, promovida pelos Estados Unidos e Pela Grã-Bretanha em 2003. A violação do direito internacional e a afronta à consciência democrática dos povos fizeram surgir, em todo o mundo, uma grande onda de protestos em defesa da paz e contra o imperialismo. Neste contexto, nasceu a entidade brasileira que, desde o início, participou, promoveu, impulsionou e organizou diversas ações, diversos seminários, campanhas e missões de solidariedade em vários países para fomentar a luta pela paz e pela soberania.
O Cebrapaz é uma entidade da sociedade civil, plural, democrática, patriótica, solidária e humanista cujo principal objetivo é defender a paz mundial com justiça, progresso social, distribuição de renda e de riqueza, democracia e soberania nacional.
Ao longo destes 12 anos, a entidade se dedicou a lutar pela paz mundial, contra as guerras de ocupação e em defesa das nações; além disso, denunciar os crimes de guerra, os massacres de populações civis, as práticas de tortura e defender os direitos humanos.
Atualmente o Cebrapaz está organizado em núcleos estaduais em 11 estados brasileiros e no Distrito Federal: Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo.