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Brasil

Edição 140 > Diversidade e unidade em torno de outro mundo possível

Diversidade e unidade em torno de outro mundo possível

Priscila Lobregatte
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Edição temática do FSM demonstra que horizontalidade e profusão de opiniões não tiraram o foco do principal: a união necessária à luta contra o capitalismo em sua fase mais agressiva

Em meio à grave crise do capitalismo mundial com o resultante acirramento das desigualdades, do intervencionismo e da agressividade imperialista contra a soberania dos povos, o Fórum Social Mundial Temático de Porto Alegre mostrou-se, novamente, uma importante trincheira dos diversos movimentos que lutam por uma alternativa possível ao mundo atual.
Durante cinco dias, o evento reuniu, segundo os organizadores, cerca de 15 mil pessoas de 60 países em 470 atividades autogestionadas e 14 mesas de convergência, sendo que a tradicional marcha de abertura, no dia 19 de janeiro, contou com a presença de 20 mil pessoas.
A edição temática, que precedeu o Fórum de fato, marcado para agosto no Canadá, teve como mote fazer um balanço dos seus 15 anos de existência, mas, ao mesmo tempo, apontar caminhos para enfrentar o cenário atual, no qual a crise humanitária e social ganha contornos cada vez mais dramáticos, a exemplo das migrações que aumentaram sensivelmente nos últimos anos. Tudo isso considerando a horizontalidade e diversidade de movimentos que sempre caracterizaram o Fórum.
Consenso x esvaziamento

A análise da conjuntura nacional e internacional não poderia deixar de lado o debate sobre o sentido do próprio FSM. Neste sentido, alguns setores voltaram a criticar o fato de o Fórum não fechar questão e encaminhamentos concretos sobre aspectos de âmbito político.
Sociólogo que esteve entre os idealizadores do evento, Boaventura Sousa Santos foi um dos que abordou o assunto. “O Fórum Social Mundial não toma posição política. Qual é a tragédia disso- Cultivamos o consenso, mas esvaziamos o fórum”, disse, durante o debate Globalização: desigualdade e a crise civilizatória, realizado no dia 20. 
No entanto, o caráter do Fórum neste ano parece, por si só, ter respondido a inquietações deste tipo ao demonstrar a força dos movimentos presentes e seu desejo de se articularem e se unificarem frente aos desafios colocados e atuarem politicamente para além dos limites do Fórum. 
Não à toa, dentre as principais propostas resultantes da Assembleia dos Movimentos, que encerrou o evento no dia 23, estão temas fundamentais na atualidade, tais como a formação, desde já, de uma ampla mobilização pelo 1º de Maio — em defesa da democracia, contra a perda de direitos dos trabalhadores, o conservadorismo e o golpismo — e pelo 8 de Março — pela igualdade entre gêneros e pela luta contra a violência e opressão às mulheres —, a defesa de uma auditoria da dívida pública brasileira e o fortalecimento da Frente Brasil Popular. 
Na avaliação de Mauri Cruz, da Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong) e um dos membros da comissão organizadora desta edição, “estas avaliações partem de setores descolados do enfrentamento que está colocado para os movimentos sociais”. Para ele, “o Fórum significou o fortalecimento do espírito crítico e propositivo”.
Além disso, Cruz destacou que “podemos estar diante de um ciclo de retrocessos ou não, a depender do enfrentamento que conseguirmos fazer. E um fator que nos une é a agenda política, a necessidade de lutar contra o atraso, de defender a ampliação da democracia e dos direitos, o combate à concentração de renda por meio de taxações ao sistema financeiro e às grandes fortunas”, salientou.
 Segundo Cruz, uma característica que ajuda nessa construção coletiva é a horizontalidade do Fórum. “Há uma crise geral de representatividade no mundo. As pessoas não querem mais delegar a tomada de decisão, elas querem participar e serem sujeitas da transformação. No FSM, todos podem participar e esse modelo pode dar uma grande contribuição para a formulação de novas alternativas para esta crise”. 
Representante da Câmara Municipal de Porto Alegre na mesma comissão, a vereadora Jussara Cony (PCdoB) tem avaliação semelhante. “O Fórum ocorreu numa etapa acirrada da luta de classes no Brasil e no mundo, com o aprofundamento da investida neoliberal que, liderada pelo imperialismo dos Estados Unidos, visa a aprofundar sua hegemonia na vida das nações, face ao crescimento da resistência dos povos, explícita nos debates, articulações, emocionada participação, unidade, amplitude e muita garra de mulheres e homens que colocam seus corpos e suas almas para derrotar a barbárie e construir a civilização”.
A presidenta do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz), Socorro Gomes, destacou como pontos centrais do Fórum a posição claramente contrária à guerra e em favor da paz; sua essência anticapitalista; e a sua afirmação na busca pelo futuro. “A mensagem positiva de que outro mundo é possível continua atual”, disse. 
Socorro afirmou ainda que, ao longo dos seus 15 anos, as articulações do Fórum ajudaram em mobilizações populares que, por sua vez, angariaram muitos êxitos e conquistas populares e democráticas especialmente na América Latina. “Vários países saíram do mapa da fome da ONU, o analfabetismo foi erradicado em nações como a Venezuela do comandante Hugo Chávez, Evo Morales implementou grandes avanços na Bolívia. E o Brasil conseguiu, com os governos Lula e Dilma, retirar milhões de pessoas da linha da pobreza e criar mecanismos de combate às desigualdades”. 

Crise e golpismo

Um dos destaques do Fórum Social Mundial Temático de Porto Alegre foi o debate Democracia e Desenvolvimento em Tempos de Golpismo e Crise, realizado no dia 20, no auditório Araújo Viana. A iniciativa partiu de uma articulação entre as fundações Maurício Grabois, Perseu Abramo e Leonel Brizola/Alberto Pasqualini e acabou ganhando a adesão de outras 40 organizações. O evento reuniu importantes nomes da política nacional.
Ao analisar a conjuntura nacional, Rui Falcão, presidente do PT, enfatizou o caráter golpista da direita brasileira que, não tendo obtido êxito nas urnas e desprovida de um programa para o país, busca inviabilizar o governo Dilma Rousseff e mesmo uma possível candidatura de Lula em 2018. Falcão traçou um paralelo ao AI-5 e declarou que hoje o habeas corpus “está sendo proscrito por setores do Judiciário com o apoio da mídia”. 
A referência, segundo ele, não cabe apenas à Lava Jato, mas também a procedimentos que vêm sendo aplicados Brasil afora, ao arrepio do Estado de Direito. “Está em vigor a ideologia do punitivismo. Há pessoas sendo condenadas na mídia antes do devido processo legal. Nenhum combate à corrupção, por mais amplo que seja, pode representar um risco à democracia”, enfatizou. Mais adiante, constatou: “estamos assistindo à criação do embrião do Estado de exceção dentro do Estado democrático de direito”. Segundo o dirigente petista, “o combate à corrupção não pode significar ameaças à democracia e aos direitos”. 
Sobre o campo econômico, Falcão destacou a gravidade da crise mundial comparando-a com a de 1929 e ressaltou que, como reflexo, o capital busca revogar conquistas históricas dos trabalhadores. “No governo Lula, sob condições internacionais favoráveis, foi possível uma política onde praticamente todos ganhavam. Isso acabou. A aliança que existia com setores do empresariado se estreitou muito”.
Para enfrentar toda essa situação, o dirigente petista sustentou a necessidade de haver maior mobilização dos setores sociais e fortalecimento da Frente Brasil Popular, além da Frente Brasil sem Medo. “O programa da Frente deve somar a agenda do desenvolvimento sustentável com a defesa da democratização do Estado, a defesa da Petrobras e a ampliação de direitos”. 

PCdoB a postos

Durante o debate, o vice-presidente nacional do PCdoB, Walter Sorrentino, afirmou que a jovem democracia brasileira está sendo ameaçada por uma ofensiva reacionária que pretende “fazer uma ponte para um neoliberalismo selvagem, com retirada de direitos sociais e trabalhistas, e uma política externa subserviente aos interesses do imperialismo”. O PCdoB, explicitou Sorrentino, definiu como um eixo central para enfrentar essa ofensiva golpista a formação de uma ampla frente partidária e social. “A tentativa de impeachment foi uma aliança espúria do PSDB com Eduardo Cunha, com apoio midiático. Essa ofensiva foi contida, por ora, mas essa batalha será dura e prolongada”, avaliou.
Para Sorrentino, está ocorrendo um amplo processo de criminalização da política que visa à sua desconstrução no país. “Em nome do justo combate à corrupção e da necessária correção de práticas e governança de grandes empresas nacionais, e sua relação com o Estado, a Lava Jato promove a judicialização e a criminalização da política, ao mesmo tempo que se politiza, no pior sentido do termo, com apurações e divulgações seletivas. Assim a operação transforma-se em uma espécie de justiça à parte”.
O dirigente comunista também enfatizou a necessidade de haver um grande pacto entre setor produtivo e trabalhadores para a retomada do crescimento. “Precisamos ser capazes de construir uma agenda convergente, de consensos, para relançar o processo de crescimento econômico e criar as condições para uma nova etapa do projeto nacional de desenvolvimento. A baliza fundamental para a esquerda e os setores progressistas nesta agenda é não permitir a implantação de medidas antipopulares e de regressão social. Esta é a base para a nossa unidade”, afirmou. 
Sorrentino também destacou a necessidade de reduzir os juros e estabelecer um câmbio favorável à competitividade da indústria nacional, além de destravar os investimentos públicos e privados nas áreas de infraestrutura e energia, promover acordos que permitam às empresas voltarem a operar nas grandes obras, recriar a CPMF e taxar as grandes rendas e fortunas. 
O senador Roberto Requião (PMDB-PR) também foi enfático no diagnóstico da crise atual e classificou como “absolutamente ridícula” a tese de impeachment da presidenta Dilma. No entanto, alertou para o fato de que, segundo ele, o país passa por uma “crise brutal” que está apenas no começo. “O mais grave é que há uma incapacidade de a nação reconhecer a intervenção estrangeira na economia e na política do país. Há uma tentativa de desmoralizar o próprio conceito de nação brasileira. Precisamos de uma utopia nacional para enfrentar esse cenário e o que pode nos unificar é um Estado de bem-estar aberto e multicultural”.
Roberto Amaral, ex-presidente do PSB, destacou que o país vive um momento de tentativa de aniquilamento da esquerda como um todo e não apenas do PT, bem como de acabar com a liderança popular de Lula. “É a mais enérgica e violenta tentativa da direita brasileira neste sentido. Vejo ameaças maiores inclusive que as de 1964. A direita brasileira tem um projeto proto-fascista em curso”, alertou.
Segundo Amaral, o ódio exacerbado e o crescimento da intolerância que têm sido percebidos com força em parte da população têm relação direta com a forma como a direita latino-americana historicamente lida com a ascensão das classes populares. Para ele, “o que derrubou Jango não foram as reformas de base, mas sim a emergência das massas”. Pelo mesmo motivo, disse, “a direita brasileira jamais perdoará Lula”.

Direito à comunicação

Em meio a todo o debate sobre o enfrentamento à onda conservadora na América Latina, a democratização da mídia ganha cada vez mais relevância. Afinal, para ficar apenas no exemplo brasileiro, os grandes veículos de comunicação têm sido um dos pilares de sustentação de todo o discurso de ódio, intolerância, prejulgamento, justiçamento e negação da política. Por isso, o tema foi discutido em várias mesas do Fórum, com destaque para o debate Mídia, ideologia, educação e poder, ocorrido no auditório Dante Barone da Assembleia gaúcha no dia 21 de janeiro. 
Um dos convidados foi o secretário nacional de Direitos Humanos, Rogério Sottili. Ele apontou a disparidade existente entre a visão de setores avançados da sociedade que enxergam nos direitos humanos a chave para a superação de muitos dos principais problemas brasileiros e o discurso veiculado na imprensa, em especial pelos programas policialescos, de anulação desses direitos. “O respeito aos direitos humanos sinaliza para a formação de novos paradigmas pelo fato de o ser humano estar no centro das atenções das políticas que queremos realizar”, apontou. Por isso, disse, “os direitos humanos são o principal alvo da grande mídia. São estes valores que estão sendo atacados e são justamente estes valores que queremos para o nosso país”. 
Sottili também criticou a criminalização dos jovens e dos negros e destacou que, para enfrentar preconceitos de toda espécie, é essencial que o acesso à informação seja visto como um direito humano fundamental. Afinal, questionou, “como é possível fazer um debate honesto, criativo, mobilizador, sem informação qualificada-”. E apontou: “nunca a mídia no Brasil esteve tão capturada pelos interesses econômicos como agora”.
Rosane Bertotti, do Fórum Nacional de Democratização da Mídia (FNDC), lembrou que o sistema privado midiático se construiu tendo como base sua ligação com os governos de direita, inclusive os militares, e o capital. Além disso, afirmou que estes grupos midiáticos usam de um serviço público para desconstruir todas as formas de expressão populares, demonizam o próprio Estado e o serviço público e, em contrapartida, endeusam o mercado e pregam o neoliberalismo como a grande solução. 
Rosane também abordou a baixa qualidade de alguns programas que acabam por ajudar a neutralizar o senso crítico da população. “Os reality shows querem nos bestializar, desrespeitando nossa dignidade como homens e mulheres.”
Também participante da mesa de debates, o vice-presidente nacional do PCdoB, Walter Sorrentino, afirmou: “não há dúvida de que, nos últimos 13 anos, houve profundo processo político democrático, com cidadania, lastreado num processo de distribuição de renda”. Mas, explicou, não foram mudados os aparatos de hegemonia institucional do Estado com o objetivo de “transformar as estruturas que hoje nos aprisionam, como é o caso da mídia”. 
Por isso, explicou, “nos últimos anos vimos a criminalização e judicialização da política e a politização da justiça”, com bolsões autônomos do aparato estatal que “andam de mãos dadas com a mídia plutocrática, oligopolizada, que não admite nenhum controle social efetivo”. Por isso, destacou como fator estratégico para o país a implementação das reformas política, da mídia, do judiciário, tributária, entre outras, focadas na construção de um projeto nacional de desenvolvimento com distribuição de renda que contribua para a superação das desigualdades e distorções historicamente construídas no país. 

Diversidade e unidade

No encerramento do Fórum, marcado pela Assembleia dos Movimentos Sociais, um sentimento parecia pairar no ar do auditório Araújo Viana: a certeza, de cada um daqueles participantes, de ter dado o melhor de si para a construção de uma ampla e articulada teia, diversificada, porém unitária, na busca de um contraponto ao capitalismo.
Por isso, ainda que o Fórum tenha sido marcado pelo debate sobre temas específicos, as grandes bandeiras da atualidade foram ricamente pautadas pelos mais variados movimentos sociais num grande movimento de convergência. Para Silvana Conti, da direção nacional da União Brasileira de Mulheres (UBM), “em que pesem as bandeiras das mulheres negras, lésbicas, jovens, ciganas, trabalhadoras, transexuais, nos unifica a luta por uma sociedade sem classes, contra a opressão”.
A avaliação de Silvana corrobora a visão de diversas outras lideranças dos movimentos sociais. Elis Regina, dirigente da Unegro no Rio Grande do Sul, destacou: “Pela primeira vez o movimento negro brasileiro conseguiu convergir a ponto de estabelecer uma pauta unificada. E a luta contra o retrocesso, traduzido na ofensiva da direita, acabou contribuindo para essa unidade estratégica que conseguimos obter durante o Fórum Social Mundial”. 
Presente ao Fórum, a deputada federal Jô Moraes (PCdoB-MG) sintetizou o sentido geral do evento. Lembrando que enquanto os movimentos sociais estavam em Porto Alegre, os maiores financistas do mundo se reuniam em Davos, na Suíça, destacou: “Eles estão lá para conspirar contra os povos e os trabalhadores. Cabe a nós mantermo-nos unidos e articulados para conspirar contra eles”. 

* Priscila Lobregatte é jornalista. Colaborou: Clomar Porto

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