Economia
Edição 136 > Governo Dilma: breve balanço de sua política econômica e a necessidade do ajuste fiscal
Governo Dilma: breve balanço de sua política econômica e a necessidade do ajuste fiscal
O artigo analisa a adoção do ajuste fiscal a partir de um balanço das ações do primeiro governo Dilma no sentido de resolver o problema da perda de competitividade externa em meio à crise internacional. O fracasso das medidas desembocou na atual situação em que se exige um ajuste fiscal. O ajuste é analisado do ponto de vista da correlação de forças em um momento de quebra do equilíbrio social que veio dando sustentação ao governo desde Lula

O debate que se dá sobre a adoção do ajuste fiscal como centro da política do novo governo Dilma é alimentado pela preocupação com as consequências de sua aplicação sobre a vida do povo. Porém, parte dessa discussão está eivada, por um lado, de argumentos principalistas sobre política econômica e, por outro, de argumentos que distorcem a dinâmica capitalista, tal como entendida pelo marxismo, e ignoram a natureza cíclica e inescapável das suas crises periódicas. Os termos dessa discussão – que desconhecem a realidade do capitalismo e relevam a correlação de forças políticas – terminam por turvar o entendimento do cenário econômico que enfrentamos no momento e as opções concretas e disponíveis ao governo Dilma para enfrentar a crise.
Minha contribuição aqui está voltada para o entendimento da ação do governo Dilma na tentativa de reverter nosso principal problema diante da crise internacional: a continuidade da perda de competitividade industrial externa. Para tanto, apresento um resumido balanço dessas medidas, o porquê de seus fracassos e o papel do grande capital nessa derrota. Abordo, ainda, como a estratégia “neodesenvolvimentista” de Lula, após a continuidade da crise internacional, tornou-se contraproducente, por não incorporar medidas defensivas contra a crise internacional desde seu início, em especial após 2008.
1. A estratégia de desenvolvimento: seu sucesso e as consequências indesejadas
Pode-se dizer que a estratégia de desenvolvimento do governo Lula, em resumo, era formada por três políticas: o aumento da produção nacional centrada no mercado interno; a redução da desigualdade social; e o fortalecimento de relações externas Sul-Sul, tendo como instrumento para essa última política o nosso “soft power”. Essa estratégia – geralmente associada ao neodesenvolvimentismo – foi implementada sem alteração do chamado “tripé” de políticas macroeconômicas: a livre flutuação cambial; uma política monetária conservadora, que utiliza a taxa de juros como único instrumento de ação; e uma política fiscal restritiva de obter superávits para sustentar a dívida pública. Desse modo, a estratégia permitia atender a reivindicações tanto do capital como do trabalho, com o Estado fazendo concessões que traziam sustentação e estabilidade ao governo, desde que houvesse crescimento do “bolo”.
Essa estratégia, mesmo com a manutenção do “tripé”, obteve um sucesso extraordinário, até 2010-2011, tendo inclusive, a partir da grande crise internacional, sido capaz de sustentar uma forte política anticíclica, inicialmente bem sucedida.
O sucesso inicial da estratégia deveu-se a duas causas fundamentais. A primeira, a boa condução política por parte do governo. E a segunda, a conjuntura internacional favorável, iniciada em 2003, de grande liquidez externa (dólar abundante e a baixa taxa de juros), associada a uma inversão nos termos de troca no comércio internacional, baseada na forte expansão de consumo conjunto dos EUA, União Europeia e China, que se estendeu até a eclosão da crise internacional de 2007-2008.
A inversão dos termos de troca favoreceu o comércio externo do Brasil, bem como o de toda a periferia, em especial no período pré-crise. Houve também uma entrada de investimento externo, gerando uma entrada recorde de divisas. Isso aconteceu mesmo com a desvalorização do dólar, tal era a força da demanda mundial. Após 2008, com essa demanda caindo e uma desvalorização mais forte do dólar, os termos de troca voltaram a ser desfavoráveis à periferia, retomando sua condição secular. No Brasil, a acumulação de superávits comerciais no período foi transformada em uma grande reserva internacional de dólares, formando um colchão de liquidez e uma barreira contra ataques especulativos, protegendo o país de uma futura escassez de divisas que levaria ao colapso cambial, como vem acontecendo sucessivamente após as fases de prosperidade da economia nacional desde o século 19. Logrou-se com isso um sucesso inédito, pois as reservas internacionais suspenderam a restrição externa, característica fundamental das economias dependentes.
O sucesso também nas contas externas, apesar do dólar fraco, abasteceu largamente o mercado interno, somando-se ao aumento da produção local. O que proporcionou, sem maiores obstáculos, uma redistribuição significativa de renda, a elevação da produção nacional, baixa inflação e bons resultados fiscais.
2. A crise e a perda de competitividade: a inversão das expectativas
Como se sabe, a fase de prosperidade internacional anterior a 2008 escondia a gestação do colapso do sistema capitalista internacional, invertendo a situação favorável. Os preços internacionais caíram, tanto para bens primários como para bens industriais. Essa queda revelou a desagradável realidade de que tínhamos perdido competitividade externa da indústria durante a bonança, mantendo, embora de forma mais desacelerada, a tendência do mais longo prazo, sempre desvantajosa para a periferia. Esse declínio de competitividade atingiu tanto as exportações como a concorrência no mercado interno. O que é bem ilustrado pela participação relativa da indústria na formação do Produto Interno Bruto (PIB) e na pauta de exportação (Gráfico 1).
A competitividade é determinada por variáveis econômicas e institucionais, dentre as quais se destacam: a produtividade do capital e do trabalho, os custos de infraestrutura, em especial de energia e transporte, e as políticas macroeconômicas, em especial a política cambial.
Quanto à produtividade, houve uma queda relativa frente aos parceiros comerciais, devido tanto ao capital industrial por não ter evoluído o suficiente para ganhar mais produtividade do trabalho, quanto ao enfrentamento de uma rápida evolução do salário real desde 2005 – pelo menos para a camada inferior dos salários. Os gargalos da infraestrutura de transporte e de energia, fruto de décadas de sucateamento e de má regulamentação, foram outras fontes de elevação de custo. Em especial, porque a burocracia estatal torna muito lentas as obras de retomada da ampliação dessa infraestrutura.
A continuidade das políticas macroeconômicas que privilegiam a acumulação financeira – com a manutenção de altas taxas reais de juro – e mantêm a flutuação cambial foi o mais importante fator na elevação dos custos industriais. A política de flutuação cambial, em particular, que permite uma tendência permanente de valorização do real, tornou-se a causa principal da desvantagem de nossa indústria. A característica da variação cambial, de agir no curto prazo e com grandes margens de flutuação das taxas, pode desfazer em um mês ou menos ganhos de produtividade e de custos de infraestrutura acumulados em anos.
3. O comportamento do capital industrial frente à crise
Mesmo com esse conjunto de fatores adversos, a fase de prosperidade deteve a queda da participação da indústria no PIB, que vinha se acentuando desde a década de 1990 (ver Gráfico 1). Assim, o crescimento mais acelerado da economia concentrou-se nos setores primário e de serviços. O enfraquecimento relativo da indústria continuou pela perda de mercados externos e pela abertura de espaço para o avanço da importação, que inundou de manufaturas o mercado nacional.
Mesmo nos anos de crescimento acelerado, parte da produção industrial nacional já começava a migrar. Insumos começaram crescentemente a ser importados de países rivais, transferindo crescentemente a produção para o exterior. Um movimento que vem encurtando a cadeia de produção interna e a agregação de valor. Em vários casos a indústria limitou-se apenas a montar no país seus produtos finais ou transformou-se em empresa importadora.
Tabela 1 - Exportações e importações de bens industriais entre Brasil e países industrializados em crise (EUA, Europa Oc., Japão) - US$ milhões
Exportações Importações Déficit BR
Crescimento 2001-02 (recessão) 0% -13% -61%
2001 24.656 41.098 -16.442,5
2002 26.074 34.211 -8.137,2
Crescimento 2003-06 (crescimento) 84% 48% -66%
2003 29.619 32.838 -3.219,4
2004 37.641 39.812 -2.170,9
2005 42.317 45.471 -3.153,8
2006 47.860 50.629 -2.769,3
Crescimento 2007-13 (crise) 4% 143% +2.638%
2007 53.965 65.493 -11.527,2
2008 58.148 89.692 -31.544,4
2009 37.769 71.789 -34.020,7
2010 45.467 95.304 -49.837,1
2011 54.625 114.500 -59.875,6
2012 52.783 114.797 -62.013,6
2013 49.930 122.993 -73.063,9
Fonte: Comex, MDIC
A situação agravou-se rapidamente após a inversão dos termos de troca e à medida que o grande capital, pondo em dúvida a viabilidade da estratégia “neodesenvolvimentista” frente à continuidade da crise internacional, reduziu seu investimento e mais ainda a participação de capital próprio no financiamento do investimento. Como se vê na Tabela 1, o grande déficit explodiu no período da crise (2007 em diante), quando os grandes países industriais com seus custos de trabalho deprimidos pelos cortes de direitos trabalhistas e pelo desemprego aproveitaram a chance de invadir um dos únicos mercados internos do mundo que mantiveram sua expansão e permaneceram abertos à importação.
Em termos políticos, esse novo posicionamento do grande capital, em especial a partir de 2012, levou à quebra do equilíbrio na base social que sustentava o governo, permitindo o avanço das oposições.
4. A continuidade do esforço do crescimento num mundo hostil e a divergência com as classes dominantes
Mesmo tendo o mundo mudado após 2008, o governo Dilma persistiu na estratégia “neodesenvolvimentista”. Diante da situação cada vez mais premente da perda de competitividade, seu governo adotou várias iniciativas para recuperar a competitividade, ao tempo em que mantinha a política distribuidora de renda via benefícios sociais e os ganhos reais do salário-mínimo.
Sua primeira iniciativa, no entanto, inovou a estratégia com uma mudança na política de juros com o objetivo de desestimular a entrada de dólares especulativos no país e, assim, reduzir a valorização do real, principal problema a afetar nossa competitividade. Por iniciativa do Banco Central, em agosto de 2011, houve uma mudança radical na política de juros altos com a rápida e progressiva redução da taxa básica. A inédita iniciativa, que mexia na política monetária, também trazia ganhos para a economia e o fisco: reduzia o custo do crédito doméstico e aliviava o aumento do custo fiscal do subsídio à crescente carteira de financiamento do BNDES. Como se vê no Gráfico 2, a redução na taxa de juros real atingiu valores inferiores a 2% ao ano em 2013. Entretanto, a redução não teve nenhuma ação sobre o câmbio, que continuou a se valorizar. Além disso, a partir de 2012, ocorreu uma inesperada elevação da taxa de inflação que, depois, se mostrou persistente. Esses resultados adversos fizeram com que a política perdesse sustentação ao longo de 2012, e o BC abandonasse a iniciativa, em meados de 2013, retomando a elevação dos juros(Gráfico 02).
A derrota deveu-se à inesperada ação do FED (Federal Reserve) em retomar sua política de “afrouxamento quantitativo” (quantitative easy) de 2008-2010, emitindo, no período 2011-2013, um trilhão e meio de dólares, 10% do PIB dos EUA, com o objetivo de desvalorizar o dólar (Tabela 2). Uma iniciativa que logo foi seguida pela ação defensiva dos maiores bancos centrais do mundo em defesa de suas moedas, fazendo emissões que, no seu total, atingiram alguns trilhões de dólares. Com a desvalorização do dólar frente às demais moedas, essa verdadeira “guerra cambial” neutralizou a política brasileira desde seu início, fazendo o real não só manter sua valorização como aumentá-la.
Tabela 2 - Emissão monetária dos principais bancos centrais pós-crise – Valor de ativos em carteira dos bancos centrais, em % do PIB de cada país
2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
B. Inglaterra 5 18 15 18 20 27 27
BCE 15 21 20 21 25 32 23
FED 5 12 20 21 28 31 22
B. Japão 24 27 28 28 30 33 21
Fonte: FMI
Sem conseguir resolver o principal problema que afetava a competitividade, o governo voltou-se para outras soluções. Empenhou-se então em um grande esforço para reduzir o custo do investimento privado e reduzir os custos de infraestrutura.
Para financiar o investimento, o BNDES ampliou ainda mais sua carteira de empréstimo, a juros subsidiado. Lançou-se mão também de isenções tributárias, dirigidas tanto à produção interna como à exportação. Mas a contrário senso, os investimentos privados continuaram seu recuo, iniciado em 2010, com o capital mantendo-se em defensiva, e passando a pleitear um ajuste fiscal frente ao retorno da inflação e ao enfraquecimento fiscal do governo.
Mesmo diante da mudança de posição do capital frente ao investimento, os recursos baratos e abundantes de financiamento continuaram a jorrar. Mas, em vez de se somarem aos recursos privados, o financiamento apenas substituiu os recursos privados (Tabela 3). Como resultado, a expansão do financiamento fez com que, na prática, o BNDES e outros bancos públicos se tornassem os principais financiadores de todo o investimento privado, além de financiar a forte expansão das empresas estatais. Na prática, o financiamento do investimento de capital foi estatizado.
Tabela 3 - Fonte de financiamento do investimento privado em % do total
Média 2006-08 2009-13
Fontes públicas 47,7 60,0
Fontes privadas 52,3 40,0
Fontes: Ministério da Fazenda; Ministério do Planejamento; Banco Central.
Elaboração própria.
Essa “estatização” do financiamento, juntamente com a expansão das estatais, criou ainda maior desconfiança no capital, mesmo que dela se beneficiando.
Em outra frente de ataque, o governo voltou-se para a redução dos custos internos, via incentivos fiscais e redução de tarifas de infraestrutura, trazidas por novas regulamentações em dois importantes setores: o da energia elétrica e o dos portos. Ações que também teriam efeitos sobre a taxa de inflação, reduzindo a pressão sobre os preços.
As isenções fiscais se sucederam sempre de forma pontual destinando benefícios para segmentos específicos ou tipo de produtos a este ou àquele setor, numa enxurrada. Elevando sobremaneira o custo fiscal, sem contrapartida visível nos preços.
Já as iniciativas de regulamentação da energia elétrica e dos portos – embora corretas – terminaram por prejudicar ainda mais a relação do governo com os grandes capitais.
Embora a reforma das tarifas de energia tenha gerado de imediato uma redução expressiva dos custos industriais, causou forte perda de caixa para as operadoras do sistema e gigantescos prejuízos a fundos de investimento em ações e deprimiu a bolsa de valores, gerando hostilidade das operadoras e de todo o mercado financeiro. Por outro lado, a crise hídrica de 2013-2014 terminou por elevar as tarifas acima dos valores anteriores, anulando de imediato o ganho obtido e ainda obrigando o governo a socorrer as distribuidoras de energia, criando outro passivo para o Estado. Já a reforma da regulamentação do setor portuário, apesar de trazer mudanças reclamadas por um setor de novos investidores, desagradou fortemente o grupo de antigos operadores concentrados nos grandes portos (Santos, Paranaguá, Rio de Janeiro etc.). E como os efeitos positivos de novos portos levarão anos para aparecer, restou, de imediato, o confronto político com esse setor do capital.
Essas ações também fracassaram. Não geraram, de imediato, nenhum efeito sobre a competitividade e nem mesmo sobre a taxa de inflação, que manteve sua tendência de alta. Por outro lado, trouxeram uma hostilidade generalizada dos grandes capitais financeiros e produtivos contra o governo, e que ainda permaneceram frustrados pela não adoção de um ajuste fiscal que trouxessem medidas anti-inflacionárias, reduzindo a demanda e afetando a renda dos trabalhadores. Colocado contra a parede, o governo Dilma fez a opção por manter os ganhos do trabalho e a elevação dos gastos públicos, na tentativa de manter a demanda e proteger o nível de vida do povo. Embora o nível de consumo do povo tenha se mantido, o estado da economia só piorou, juntamente com a competitividade externa. Pela primeira vez, a economia ia mal, enquanto o povo continuava bem. Mas a situação tornou-se insustentável, gerando uma crise de confiança.
5. As consequências indesejadas da estratégia no sistema internacional em crise
Dessa forma, com a persistência da crise internacional, a continuidade da estratégia de elevação da renda interna das camadas mais baixas (por benefícios previdenciários e assistenciais e pela valorização do salário mínimo) acabou por agravar o conjunto dos problemas.
Por um lado, com a continuidade da política distributiva a demanda continuou a subir, mas por outro lado, graças à reação defensiva do capital, não houve contrapartida na produção. O que aumentou a oportunidade de exportação para o Brasil por parte de países industriais em crise e para a China. Viabilizando a sobrevivência de capitais que não mais contavam com seus mercados internos em forte recessão. Ao contrário do pretendido, em vez de o mercado interno fazer crescer os capitais internos, ampliando seus investimentos, ajudou a acumulação de capitais nos países industriais.
A estratégia “neodesenvolvimentista”, com o “tripé” macroeconômico, passou a ser contraproducente com o crescimento, a expansão do capital nacional e uma melhora sustentada das condições de vida do povo. Não por ser uma estratégia equivocada desde o princípio, mas por não ter sido adaptada a uma situação de crise internacional sistêmica, que gerou medidas agressivas dos EUA e do centro capitalista, criando um ambiente hostil ao crescimento da periferia. E o problema central, mas não único, foi o não rompimento com o “tripé” de políticas macroeconômicas, especialmente coma livre flutuação cambial. Isso talvez pudesse ser feito nas condições políticas de 2010 e 2011, mas essas condições se perderam daí em diante, coma inversão da correlação de forças com o conservadorismo.
6. A imposição do ajuste fiscal
Por essa situação insustentável e pela inversão da correlação de forças, a proposta do capital do ajuste fiscal acabou por se transformar em uma opção inelutável.
O que falta é investimento e produção e, mas a realidade é que o grande capital não se dispõe a fazê-lo enquanto a inflação não seja debelada, o setor estatal volte a se ajustar e o Estado retorne a sua condição de produzir superávit para dar sustentação ao valor da dívida. O que só se pode alcançar com o ajuste fiscal. Para o capital são essas as únicas condições que trarão de volta a competitividade e o crescimento. A teoria ortodoxa, mesmo não sendo correta, é aquela em que o capital acredita, o que faz com que ela possa mudar as expectativas em uma situação crítica.
Medidas que mantenham a demanda e a elevação da renda do trabalho, na atual situação, resultarão apenas em um desastre de inflação alta, déficit fiscal, crise nas contas externas e perda de divisas, forçando um ajuste fiscal ainda mais radical e draconiano. Mesmo que o ajuste fiscal não traga garantia de uma breve retomada do crescimento, ele tornou-se, infelizmente, na única opção politicamente disponível.
É útil relembrar que, enquanto vivermos no capitalismo, a variável principal da economia é a acumulação do capital. E, a contrário senso, o que move a acumulação é a expectativa de maior taxa de lucro e o baixo risco, não apenas a demanda. São as limitações próprias do capitalismo e de suas crises.
Desse modo, concluo que o ajuste fiscal na situação da política atual deve ser considerado seriamente. Não para substituir a estratégia do “neodesenvolvimentismo”, mas como instrumento emergencial à manutenção dessa estratégia em longo prazo. A estratégia dos governos Lula não se mostrou errada; o problema, a meu ver, foi não ter havido sua adaptação às condições da crise, introduzindo medidas defensivas, como fizeram outros países, em defesa da economia nacional.
Embora sejam claros os limites da atual correlação de forças, não é possível ser favorável a qualquer medida adotada pelo ajuste fiscal. É necessário manter a defesa dos direitos dos trabalhadores e de suas conquistas sociais. Os ajustes devem ser efetivos para que haja uma reversão das expectativas, devendo surtir efeitos ainda em 2015, mas não podem ser centrados na redução da proteção do emprego, da renda do trabalho e dos direitos conquistados.
* Lecio Morais é economista, mestre em Ciência Política e assessor parlamentar na Câmara dos Deputados