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Edição 136 > O Brasil deve dar início a um novo ciclo de política externa altiva e ativa

O Brasil deve dar início a um novo ciclo de política externa altiva e ativa

Ricardo Alemão Abreu* e Rubens Diniz**
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Atualizar e relançar a política externa altiva e ativa é contribuir com o desenvolvimento do projeto nacional, e isto é necessário mesmo neste contexto de dificuldades nos âmbitos nacional e mundial, inclusive para a superação dessas dificuldades

Na campanha eleitoral de 2014 confrontaram-se dois projetos políticos que expressavam visões antagônicas do papel e do lugar do Brasil no mundo, e do seu projeto nacional de desenvolvimento. O projeto liderado pela presidenta Dilma Rousseff, que busca aprofundar o ciclo de políticas desenvolvidas na última década, foi o grande vitorioso.

No entanto, no início do segundo mandato, aproveitando-se de um cenário internacional adverso e de pressões externas, forças à direita do espectro político buscam reorientar a política externa para uma ação subordinada às políticas das potências imperialistas.

Neste contexto, impõe-se retomar a iniciativa política, a partir da atualização e relançamento da política externa altiva e ativa que caracteriza o atual ciclo político, para as novas condições do mundo e do Brasil.

O atual contexto internacional

A luta política em curso no Brasil deve ser entendida situando o Brasil, a América Latina, e mesmo os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), no contexto de um mundo regido por uma crise estrutural e sistêmica do capitalismo que se estende para seu oitavo ano, denominada a -grande recessão-. Pelo mundo todo há uma crescente resistência dos trabalhadores e dos povos à dominação da oligarquia financeira e das forças pró-imperialistas. O mundo também está envolvido em uma luta que abrange países e blocos de países da qual resultará o desfecho da atual transição nas relações de poder em curso no mundo. O imperialismo estadunidense manobra no sentido de reverter seu declínio relativo e busca relançar sua hegemonia. Nesse sentido, ganha destaque na situação internacional uma ação das potências imperialistas, lideradas pelos EUA, para conter e agredir qualquer país que contrarie seus interesses.

Os países que persistem em projetos nacionais soberanos e têm política externa autônoma são alvo dessa -contenção-, como a China, a Rússia, o Irã, além de vários países da América Latina e Caribe. Em nossa região, há uma escalada de direita que utiliza variados meios como a guerra midiática, a guerra econômica, a judicialização da política, os intentos de golpe de Estado, as ameaças de agressão militar, o apoio e o financiamento externo da oposição, dentre outros, para tentar lograr as -mudanças de regime- que almeja, ou seja, a derrubada dos governos de esquerda e progressistas na região. Tais governos latino-americanos e caribenhos inspiram esperança em todo o mundo, que infelizmente vive um contexto marcado politicamente pelo crescimento de forças de direita e até neofascistas.

Dos principais países da América do Sul, Argentina, Brasil e Venezuela passam por situações políticas críticas e são alvos dessa investida neste momento. Cada um com singularidades, mas tendo em comum a forte influência de fatores externos. Em suma, a tentativa de desestabilização do governo Dilma, embora siga uma dinâmica muito própria da luta política no Brasil, é parte dessa investida das direitas do continente e do imperialismo estadunidense para tentar derrotar o ciclo progressista já em vigor há mais de 16 anos na América no Sul.

Diante da crise capitalista mundial e dessas ameaças, é necessário ampliar e consolidar as relações Sul-Sul, e aprofundar e acelerar o processo de integração solidária da América Latina e Caribe. Também é necessário impulsionar a unidade das forças populares e as ações de solidariedade internacional para dar suporte político-social à política externa do Brasil e dos países sul e latino-americanos e caribenhos.

A ofensiva liberal conservadora contra a atual política externa brasileira

A escalada conservadora tem na crítica à política externa brasileira (2003-2015) um de seus alvos prediletos. Sob os argumentos de que a política externa se partidarizou e de que Brasil tem se -isolado- do comércio mundial, por estar preso à Argentina e à Venezuela, é que o senador José Serra, em sua saga liberal, afirma que nesta legislatura fará o que for preciso para revogar a união aduaneira, o coração do Mercado Comum do Sul (Mercosul). O que busca a direita brasileira é quebrar a regra que obriga os países a negociarem conjuntamente, para com isto levar o Brasil a assinar acordos bilaterais de livre comércio, visando a -reativar a Área de Livre Comércio das Américas (Alca)- (1). Em essência, o objetivo da oposição é retomar a agenda neoliberal da década de 1990.

Além do ataque ao Mercosul, a agenda conservadora da oposição liberal se concentra em defender a participação em acordos de livre comércio com os países desenvolvidos, a participação do Brasil na Aliança do Pacífico, e a adesão do país às chamadas cadeias globais de valor. Além disso, ataca as políticas de cooperação regional como a que proporcionou a construção do Porto de Mariel, em Cuba.

A oposição liberal ignora ou esconde que em 2002 o Brasil exportou US$ 4,1 bilhões para o Mercosul, e já em 2011 as nossas exportações para o bloco atingiram a cifra de US$ 32,4 bilhões, ou seja um crescimento de 690%. Dessas exportações brasileiras para o Mercosul, 90% dos produtos são manufaturados e com alto valor agregado, e esse comércio representou um superávit ao Brasil de 72 US$ bilhões.

Os adeptos das políticas neoliberais que levaram a América Latina à situação de tragédia econômica e social no final do século passado compram o discurso da Aliança do Pacífico, mesmo sabendo que ela não representa nenhum acréscimo ao comércio brasileiro, pois a maior parte das barreiras tarifárias entre esses países e o Mercosul já foi eliminada via acordos conduzidos pelo próprio Mercosul. Ignoram da mesma forma (ou escondem) que a maior dificuldade para se firmar um acordo equilibrado do Mercosul com a União Europeia está nas políticas do velho continente, que não abre mão de seu protecionismo e de seus subsídios agrícolas.

Longe de ser partidarizada, a política externa altiva e ativa dos governos Lula e Dilma é um resgate e uma atualização da tradição de -autonomia- e de defesa dos interesses e da soberania nacionais que tem origem em San Tiago Dantas e na Política Externa Independente (PEI). No entanto, o que a oposição quer esconder por trás de um suposto -interesse nacional- é uma visão (neo)liberal para nossa política externa.

A forma de responder a esta disputa de opiniões e ideias, é avançando na reformulação e no relançamento do atual ciclo de política externa que vem desde 2003, repactuando temas, agendas e prioridades.

A nosso ver, a política externa do segundo mandato da presidenta Dilma deve construir uma agenda prioritária que tenha, dentre outros elementos, as seguintes agendas e prioridades: contribuir para uma nova ordem mundial e para o incremento das relações Sul-Sul; estabelecer uma prioridade renovada à integração regional; e reforçar a atuação do Brasil no sistema multilateral de relações internacionais.

Para aumentar o debate e a defesa de uma política externa ativa e altiva, é importante a criação de um Conselho Nacional de Política Externa, como defende o Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais (GR-RI).

As relações Sul-Sul e a luta por uma nova ordem internacional

Contribuir para a construção de uma nova ordem mundial fundada na paz, na soberania de todos os países, na cooperação e no desenvolvimento, reforçando a tendência à multipolaridade, tem sido uma das prioridades da política externa dos últimos 12 anos, que deve ser aprofundada neste segundo mandato da presidente Dilma.

Entre as distintas iniciativas destaca-se a contribuição brasileira para a consolidação dos BRICS, um dos legados mais importantes da política externa de Lula e Dilma. O segundo ciclo de encontros dos países BRICS, iniciado com a cúpula de Fortaleza (novembro, 2014), deixou como resultado a constituição do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) e do Arranjo Contingente de Reservas (CRA), iniciativas de significado histórico, que fortalecem a autonomia dos países e contribuem na formatação de um novo quadro internacional. Ainda em fase de implementação, o novo banco terá cerca de US$ 100 bilhões para financiar projetos de infraestrutura, ao tempo em que o Arranjo estará destinado a contribuir com a estabilidade financeira, garantindo liquidez para seus membros. O Novo Banco de Desenvolvimento poderá ser um importante instrumento para o financiamento de projetos de integração em infraestrutura na América do sul, dando resposta a um dos principais obstáculos para o avanço dessa agenda.

A próxima cúpula dos BRICS será na Rússia, na cidade de Ufa, nos dias 8 e 9 de julho deste ano. Ainda sem uma agenda exata, é certo que alguns temas estarão no debate, dentre eles os desdobramentos das resoluções adotadas em Fortaleza e a condenação às severas sanções que as potências -ocidentais- têm implementado contra a Rússia. Temas adicionais podem surgir, como uma cooperação maior em matéria de energia e segurança internacional. Adicionalmente, o debate sobre -governança da internet- pode aparecer com o intuito de restringir seu uso para fins bélicos, como ataques cibernéticos, a partir do estabelecimento de um acordo internacional de segurança da informação.

Além da participação nos BRICS, o Brasil deve continuar desenvolvendo iniciativas de -alianças de geometria variável-, ou seja, acordos e parcerias entre distintos países e blocos regionais em torno de temas específicos. Entre as iniciativas tomadas no âmbito dos espaços regionais, destacam-se os encontros da Cúpula América do Sul - Países Árabes (CASA), Cúpula América do Sul - África (ASA), Cúpula da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), BRICS, e o Fórum China - Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), realizado em janeiro de 2015, primeiro espaço de concertação extrarregional do organismo latino-americano.

A importância dessas alianças está na diversificação de parceiros econômicos e políticos, como também na construção de acordos e ações que visem à desconcentração de poder, seja ele econômico, político ou militar.

A cooperação internacional também é um importante instrumento da política externa brasileira, que deve ser fortalecido neste novo período. Faz-se necessário um relançamento da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), órgão responsável pela cooperação técnica e vinculado ao Ministério de Relações Exteriores (MRE). Dentro deste contexto de fortalecer a cooperação, é preciso que o Brasil compartilhe com outros países seus casos de sucesso em políticas públicas. Da mesma forma, é necessário que o Brasil volte a abrir escritórios internacionais de suas agências especializadas, como o IPEA, a Embrapa, e a Fiocruz. Entre as regiões do mundo a ser priorizada está o continente africano, com o qual devemos, o Brasil e a Unasul, dar seguimento e efetividade aos acordos da Cúpula América do Sul - África (ASA).

Um novo entendimento estratégico em torno dos objetivos da integração sul e latino-americana

A integração visa ao desenvolvimento econômico, social, político e cultural de todos os países envolvidos, deve atender aos interesses nacionais de cada um dos países, a partir da convergência de objetivos estratégicos. Partindo de raízes históricas e de muitas experiências na segunda metade do século 20, houve uma iniciativa fundamental que ocorreu há exatos 30 anos, com a assinatura da Declaração de Iguaçu. Em 1985 foi iniciado o processo que levou à formação do Mercosul em 1991, e que ajudou a criar as condições para a criação posterior da Unasul e da Celac.

No entanto, ainda estamos no começo. Para a integração avançar é necessário um entendimento estratégico e coesão de objetivos. Em nosso modo de ver, é preciso renovar os objetivos estratégicos, a partir de um processo similar ao que ocorreu em 2003, quando Lula e Kirchner lançaram o -Consenso de Buenos Aires-, iniciativa que proporcionou o avanço de grande parte das ações de integração adotadas nesta última década. O papel dos chefes de Estado, fazendo uso da diplomacia presidencial, é essencial para o sucesso desta iniciativa. No plano interno de cada país é necessário construir novos consensos, envolvendo os vários setores da sociedade, em torno da agenda comum e prioritária de integração.

A Unasul, o Mercosul e a Celac são instrumentos que se complementam. Dentro de uma lógica de convergência, cada um possui sua agenda própria, mas devem assumir a agenda prioritária, que precisa ser unificada e tornar-se transversal em todas as organizações.

Em março de 2016 o Mercosul completará 25 anos. É preciso fortalecer o bloco como núcleo dinamizador da integração regional a partir de uma agenda orientada ao desenvolvimento. Isto se expressa na constituição de políticas orientadas pela formação de cadeias produtivas regionais, pela ampliação do combate às assimetrias econômicas e sociais, e no aperfeiçoamento dos instrumentos de proteção das indústrias nacionais, como o Mecanismo de Adaptação Competitiva (MAC). Da mesma maneira, deve-se dar celeridade à negociação para a adesão ao bloco de Bolívia, Equador, Guiana e Suriname. Cabe uma atenção especial ao caso do Equador, que permitirá consolidar o acesso do Mercosul ao Pacífico, ampliando sua dimensão estratégica ao estabelecer acesso aos dois oceanos.

É necessário fortalecer as instituições do Mercosul, dotando sua secretaria e seus institutos de instrumentos materiais e autoridade política para o cumprimento de suas tarefas. Neste quesito o parlamento brasileiro deve definir critérios para a eleição, por voto direto, dos representantes brasileiros ao Parlamento do Mercosul (Parlasul).

A Unasul nos últimos anos constituiu-se uma nova arquitetura de -governança- regional, com uma ampla agenda, estabelecendo vários objetivos. Acreditamos ser conveniente priorizar esforços em três dimensões: concertacão política, coordenação de projetos de infraestrutura, e política de defesa sul-americana. A concertação política possui uma dimensão interna, busca realizar esforços de mediação diante de conflitos e tensões internas, como foram os casos da Bolívia, Colômbia, Paraguai e mais recentemente da Venezuela. No que se refere à dimensão extrarregional, a Unasul se consolida como um interlocutor global, valorizando o protagonismo do continente no cenário internacional, em torno de uma agenda marcada por temas de cooperação e dialogo político.

Com uma decisão justa, e ao mesmo tempo ampla e radical, a Unasul criou a Zona de Paz da América do Sul, uma medida de cooperação intrarregional em matéria de segurança internacional, e também uma união contra ameaças extrarregionais. Na mesma linha, de criar uma doutrina e mecanismos sul-americanos de defesa comuns, uma das grandes inovações foi a constituição do Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS), e mais recentemente a constituição da Escola Sul-Americana de Defesa (ESCUDE), um feito histórico, para a formação de civis e militares dos diferentes países em torno de uma visão própria e compartilhada do mundo contemporâneo e de sua dinâmica internacional.

Além da Zona de Paz na América do Sul, o Brasil também participa da Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul, com a presença de muitos países africanos, e da Zona de Paz da América Latina e Caribe, criada pela Celac em sua reunião anual em Havana, Cuba, em 2014.

A Celac tem concentrado sua agenda em temas de desenvolvimento sustentável e combate à pobreza, e de segurança internacional. Após sua primeira cúpula o fórum regional tem se dedicado à realização de reuniões especializadas e encontros extrarregionais como foi o Fórum Celac - China. Merece destaque a atuação da Celac como grupo no âmbito da reunião de revisão do Tratado de Não Proliferação de armas nucleares (TNP), realizada nos meses de abril e maio deste ano na sede da ONU.

Agendas prioritárias para a integração regional: infraestrutura, cadeias produtivas e combate às assimetrias

A capacidade indutora de desenvolvimento dos projetos de infraestrutura pode contribuir com a redução de assimetrias intrarregionais, fortalecendo o dinamismo econômico de regiões menos desenvolvidas da América do Sul. O grande desafio é garantir o financiamento dos projetos prioritários identificados pela Unasul. Para tal, deve-se promover uma coordenação maior entre os instrumentos financeiros regionais já existentes (CAF, FONPLATA e CCR). Há outras possibilidades como a busca de financiamento internacional, a partir de parcerias com o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) dos BRICS, e como a experiência que está em curso envolvendo China, Peru e Brasil, para a construção de ferrovia transoceânica.

Outro desafio é a instituição de cadeias produtivas regionais. Sem elas, as iniciativas de integração econômica podem, a qualquer momento, produzir refluxos importantes, além de haver o risco de serem ampliadas, ao invés de diminuídas, as assimetrias já existentes. Uma das alternativas seria industrializar os vastos recursos naturais da região e fazer uso dos potenciais energéticos. Assim como devem ser promovidas, a partir de uma política industrial e tecnológica comum, as melhores capacidades industriais dos países sul-americanos, por exemplo no caso das experiências existentes como é o caso da EMBRAER brasileira e da ENAER chilena, na fabricação de jatos regionais, e a cooperação entre Brasil, Chile, Argentina e Colômbia no projeto do avião militar KC-390. Outra oportunidade para a América do Sul são os empreendimentos na região brasileira do pré-sal, que podem orientar suas atividades dentro de uma lógica que estimule a formação de uma cadeia regional, na área da indústria naval e em outros setores que envolvam fornecedores de equipamentos, componentes e serviços.

O combate às assimetrias econômicas e sociais deve ser uma prioridade no processo de integração. É necessário aperfeiçoar os instrumentos de combate a tais assimetrias, proporcionando um desenvolvimento harmonioso com benefícios mais equitativos para todos os países-membros. O Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem) tem o propósito de -financiar programas para promover a convergência estrutural, desenvolver a competitividade e promover a coesão social, em particular das economias menores e regiões menos desenvolvidas-. O fundo adota uma política de aporte de recursos, na qual os países relativamente mais desenvolvidos aportam mais e utilizam menos (o Brasil aporta 70% e utiliza 10%). Contudo, o montante de recursos de que o Focem dispõe para sua carteira de projetos é ainda pequeno, se comparado com as necessidades existentes. É preciso multiplicar os recursos do Focem, que é um instrumento fundamental do Mercosul.

A América Latina também pode se beneficiar de relações com outros países e blocos, como a China. As relações entre a China e os países da região tem se ampliado de forma expressiva nos últimos anos. Na atualidade, o país asiático se tornou o principal parceiro comercial de todos os países do Mercosul. Entre as iniciativas que estão em curso destaca-se o já mencionado Fórum Celac - China, realizado no mês de janeiro de 2015, e que busca ser um -inovador instrumento de cooperação-. Durante a abertura do evento o presidente chinês, Xi Jinping, anunciou investimentos de US$ 250 bilhões para os próximos dez anos na América Latina e no Caribe. O Fórum aprovou ainda o Plano de Cooperação Celac - China 2015-2019.

Vista por muitos analistas com preocupação, a relação com a China pode e deve ser construída na base de interesses e benefícios mútuos, em prol da integração regional de nossa Pátria Grande. No caso particular do Mercosul, torna-se necessário estabelecer um acordo macro, em torno de objetivos e visões comuns da parceria com a China.

A atuação do Brasil no âmbito dos organismos multilaterais

O Brasil, como um dos estados fundadores da Organização das Nações Unidas, tem por tradição diplomática valorizar os espaços multilaterais de participação e -governança-. Nos últimos anos, o Brasil tem contribuído presidindo importantes organizações internacionais, como é o caso da FAO e da Organização Mundial do Comércio (OMC), onde dois experientes quadros brasileiros têm dado contribuições para os temas internacionais.

Neste último período destacam-se três iniciativas importantes adotadas pelo Brasil. A primeira relacionada com o uso da força em nome dos direitos humanos, tema para o qual o Brasil apresentou a proposta de Responsabilidade ao Proteger, uma resposta alternativa à formulação da -responsabilidade de proteger-, que em essência quer legalizar o uso abusivo e inadequado da força militar em nome dos direitos humanos e sem considerar a soberania dos países, na prática legalizando as guerras de agressão promovidas pelas potências imperialistas.

A segunda iniciativa recente e importante do Brasil foi a realização da Rio+20 e a ação protagonista nas negociações sobre o clima, onde o Brasil adota uma postura que defende as responsabilidades comuns entre os países, mas com diferenciação entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento. O Brasil se prepara agora para a realização da Conferência do Clima COP 21, que será em dezembro de 2015, e irá debater um tratado que substituirá o Protocolo de Kyoto.

Por último, e como consequência da proposta brasileira de formação de um -governo mundial- da internet, no âmbito da ONU, foi sediado no Brasil o Encontro Multissetorial Global Sobre o futuro da Governança da Internet (NetMundial), evento que debateu princípios e propostas para a futura -governança- multilateral da internet.

Ainda no âmbito multilateral, o Brasil continua com a agenda da reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que será uma importante contribuição para a democratização dos órgãos decisórios da ONU, no sentido de fortalecer a luta dos povos pela paz e por uma nova ordem mundial.

Política externa, comércio internacional e desenvolvimento

Desde a conferência da Organização Mundial do Comercio de Cancun, em 2003, e graças ao movimento coordenado por países como o Brasil, as regras de negociação na OMC mudaram definitivamente, colocando os países em desenvolvimento em novas e melhores condições de negociação. No entanto, hoje a OMC vive seus momentos de impasse. Mesmo com o esforço do embaixador brasileiro Roberto Azevedo, as condições para destravar a rodada de Doha, chamada de rodada mundial do desenvolvimento, são difíceis.

Neste contexto, surgem as iniciativas dos mega-acordos de comércio e investimento promovidos pelos EUA, por fora do sistema multilateral da OMC. Nas duas inciativas dos EUA, o acordo transpacífico e o acordo transatlântico, o risco é a ampliação de normas não negociadas de forma multilateral, e que podem restringir produtos dos países em desenvolvimento discriminando produtos com financiamento de bancos públicos, criando novos tipos de barreiras fitossanitárias, entre outros tipos de cerceamento.

Porém, os EUA têm tido dificuldades com seus parceiros em fazer avançar as negociações da Parceria Transpacífica (TPP) e da Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP), que tem sido questionada por autoridades da União Europeia, por considerarem que ela abre brechas para a privatização de serviços públicos como saúde (2).

A União Europeia, por sua vez, questionou o Brasil na OMC em torno das políticas nacionais de incentivo à produção, como o Programa InovarAuto, que beneficiam empresas que tenham conteúdo local - de 8 a 14 etapas produtivas -, desenvolvendo engenharia brasileira e o setor energético na produção de combustíveis alternativos (biocombustíveis, híbridos, elétricos, células de combustível).

O Brasil deve continuar dando prioridade às negociações no âmbito multilateral, dado que as saídas para os temas mundiais devem ser encontradas não em tratados de -livre comércio- assimétricos, mas sim em negociações multilaterais, nas quais os países em desenvolvimento, hoje, têm melhores condições de se articular para defender seus interesses.

Política externa e projeto nacional

A política externa é um componente central para a realização dos objetivos e aspirações nacionais do Brasil, contribuindo para a integração solidária da América do Sul e da América Latina e Caribe, e para a construção das demais condições externas para a execução de um projeto nacional. Para isso, é preciso que os interesses nacionais sejam cada vez mais identificados com os interesses populares, da imensa maioria do povo brasileiro.

Nesse sentido, atualizar e relançar a política externa altiva e ativa é contribuir com o desenvolvimento do projeto nacional, e isto é necessário mesmo neste contexto de dificuldades nos âmbitos nacional e mundial, inclusive para a superação dessas dificuldades. Os desafios para o Brasil neste segundo governo de Dilma Rousseff são grandes, assim como também é grande a necessidade de se contar com a política externa avançada e pró-ativa como um instrumento do desenvolvimento nacional.

* Ricardo Alemão Abreu é secretário de Relações Internacionais do PCdoB e pós-graduando em Integração da América Latina na USP

** Rubens Diniz é pós-graduando em Integração da América Latina e membro da Comissão de Relações Internacionais do PCdoB

NOTAS

(1) BACHA, Edmar & FISHLOW, Albert. -Momento de reativar a Alca-. O Globo, 04-04-2015, http://oglobo.globo.com/opiniao/momento-de-reativar-alca-15768406

(2) Valor Econômico, 29-05-2015, p. A11.

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