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Edição 129 > 1964 - retrocesso democrático e civilizacional
1964 - retrocesso democrático e civilizacional
O golpe militar que rompeu a legalidade constitucional e depôs o presidente João Goulart, em 1964, completa 50 anos neste 1º de abril, mas suas consequências ainda perduram meio século depois

Golpe de 1964 se insere na história da luta de classes no Brasil, e só assim pode ser compreendido em toda a sua complexidade; ele foi um episódio também da disputa imperialista que ocorria no mundo da guerra fria, época em que o imperialismo norte-americano fomentou golpes de Estado direitistas em vários países. O Brasil sofreu, em 1964, a intervenção direta dos EUA na política interna. Os agentes dessa intromissão foram empresários e funcionários do governo dos EUA, com a participação direta do embaixador Lincoln Gordon e apoio do presidente John Kennedy à conspiração contra João Goulart.
O Brasil tem sido cenário da luta renhida entre dois projetos excludentes de nação e sociedade - um projeto patriótico, democrático e desenvolvimentista; o outro, de subordinação ao imperialismo, antidemocrático e anti-industrialista. Eles opõem as forças antinação, que sempre foram contrárias ao desenvolvimento autônomo do Brasil e a toda reforma democrática, contra as forças sociais e políticas que lutam para construir um país moderno, democrático, avançado e soberano.
O golpe de Estado de 1964 faz parte desta luta que tem raízes no passado colonial. As forças antinação, que influíram desde a Independência e controlaram o país desde o período imperial, foram as responsáveis pela permanência do atraso, do autoritarismo e da subordinação do país à divisão internacional do trabalho dominada pelas nações que detinham o poder mundial.
Essas forças compunham a aliança retrógrada formada pela alta finança, que controlava o comércio exterior (inclusive, no seu tempo, o tráfico de escravos), os senhores de terras e escravos, somados aos representantes das potências coloniais e, depois, imperialistas. Elas mudaram de feição ao longo da história, mas mantiveram sempre o mesmo programa antidemocrático e antinacional e hoje sua expressão é a frente rentista e neoliberal que se opõe à modernização efetiva e profunda do país.
Ao longo da história essas forças enfrentaram uma permanente oposição das camadas que formam a nação: o povo, os trabalhadores do campo e da cidade, amplas camadas da pequena burguesia e os setores nacionalistas da burguesia, sobretudo a industrial. O programa destas camadas é o desenvolvimento social e econômico, a ampliação da democracia, com amplo protagonismo político popular, e a afirmação da soberania nacional.
O Brasil viveu mudanças profundas depois da Segunda Grande Guerra. Após a Revolução de 1930 as forças antinação, da oligarquia liberal, tiveram o poder reduzido, mas não foram derrotadas; continuaram atuantes, sendo o esteio da resistência anti-Vargas que terminou com o suicídio do presidente em 1954. Foram os conspiradores que tentaram impedir a posse, em 1955, do presidente Juscelino Kubitschek, eleito democraticamente, e do vice João Goulart, também ungido pelas urnas, depois da renúncia de Jânio Quadros, em 1961. E foram as forças que promoveram a intensa articulação dos setores retrógrados da classe dominante que resultou no golpe militar de 1964 e deu início à ditadura que durou 21 anos.
Essas forças golpistas e antidemocráticas já eram, então, o principal fator de instabilidade política no Brasil. O golpe de Estado de 1964 foi o anticlímax de um intenso processo de lutas democráticas, iniciado bem antes, com o fim do Estado Novo, em 1945. Processo marcado por duas demandas principais - a exigência da consolidação da democracia e a do desenvolvimento econômico.
Com altos e baixos, o período da Constituição de 1946 foi de avanços na busca pelo desenvolvimento e pela democracia, sendo cenário de um intenso protagonismo democrático dos trabalhadores e das forças patrióticas e nacionalistas.
Esse avanço foi sinalizado, institucionalmente, pelas eleições que ocorreram então. Um exemplo foi o pleito de 1962, que revelou o fortalecimento dos setores progressistas e democráticos.
A eleição de 1962 foi uma espécie de estopim para a aliança entre a alta burguesia industrial e financeira, agentes do imperialismo (inclusive com a participação direta da CIA, o serviço de espionagem dos EUA), latifundiários, oficiais militares, alto clero, reacionários e intelectuais antidemocráticos, entre outros setores conservadores. Ela foi, assim, um momento importante, que ativou a conspiração direitista que resultou no golpe militar de 1964. A encruzilhada histórica que o Brasil vivia então foi ultrapassada pela direita, com a instauração da ditadura militar. A conspiração golpista foi a resposta aos avanços sociais e políticos por parte da classe dominante antidemocrática, sobretudo os setores conservadores do latifúndio e de grandes empresários aliados ao imperialismo norte-americano.
O golpe militar teve - pode-se dizer - dois significados principais. O primeiro deles foi sua natureza profundamente antidemocrática, manifestada já nos primeiros atos do governo ditatorial, e que se traduziu em cassações de mandatos parlamentares, prisões de lideranças sindicais, operárias e populares, com uma repressão mais violenta e aberta contra a luta democrática e patriótica do povo.
O outro significado, intimamente ligado ao primeiro, foi a reordenação do desenvolvimento brasileiro, com a imposição do arrocho salarial e de regras econômicas favoráveis ao imperialismo e ao grande capital, sobretudo estrangeiro, gerando falências de empresas nacionais, desemprego e perdas salariais para os trabalhadores.
O comício de 13 de março de 1964, na Central do Brasil (Rio de Janeiro), foi um passo importante de Goulart no compromisso com as reformas de base. Diante de 200 mil pessoas e militantes sindicais e populares, o presidente anunciou um programa que incluía reformas necessárias para a modernização do país. Entre elas, destacavam-se a reforma agrária, a renegociação da dívida externa, o controle da remessa de lucros das empresas estrangeiras e a regulamentação do ingresso do capital estrangeiro no país, além das reformas urbana, administrativa, bancária, da previdência social, da educação, a regulamentação do direito de greve, a nacionalização das concessionárias de serviços públicos etc. Aquele comício foi outro pretexto usado pelos golpistas para mobilizar os setores conservadores contra Goulart.
Apesar do índice de sindicalização ainda ser baixo (em torno de 25% dos trabalhadores), aquela foi uma época de crescimento da organização sindical. Foram criadas as primeiras centrais sindicais, como o Pacto de Unidade e Ação (1961), que levou, depois, à criação do Comando Geral dos Trabalhadores (1962). No campo, as primeiras ligas camponesas surgiam desde meados da década de 1950 e, no governo Goulart, crescia a organização de sindicatos de trabalhadores rurais.
Toda essa luta se traduziu em ganhos salariais que alarmavam os conservadores. O salário mínimo alcançou, então, os valores mais altos desde sua criação em 1940. Em 1960, por exemplo, o conservador Roberto Campos constatou que a parcela dos trabalhadores na renda do setor urbano passava de 60% do total.
Os comunistas e o governo Goulart
O movimento comunista brasileiro havia saído da crise que o atingiu desde meados da década de 1950, opondo os dirigentes revolucionários aos reformistas que seguiam a orientação revisionista que vinha do Partido Comunista da União Soviética, desde seu XX Congresso, que favorecia a coexistência pacífica com o imperialismo e a via eleitoral para o socialismo.
Enquanto o PCB perdia-se em ilusões legalistas ante o golpe que era articulado pela direita, o Partido Comunista do Brasil, reorganizado em 1962, e ainda muito pequeno em relação àquele que era chamado de -Partidão- (de cujo reformismo precisava inclusive se diferenciar), teve uma postura esquerdista em relação ao governo Goulart, da qual fez autocrítica no documento O Golpe de 1964 e seus ensinamentos, de agosto daquele ano.
O reformismo levou o PCB a enganos. Por exemplo, no dia 22 de março (pouco mais de uma semana antes do golpe, portanto), Luiz Carlos Prestes avaliou, em uma reunião - diz o historiador Leôncio Basbaum -, que -se os conspiradores levantarem a cabeça o Exército a cortará-; dizia que os comunistas chegariam ao poder -por via pacífica, assenhoreando-se, pouco a pouco, da máquina do Estado-. Anos mais tarde, em 1982, o próprio Prestes reconheceu o engano daquela política, que ele mesmo chamou de direitista; disse que foi um erro ter orientado seus partidários a recuarem em todas as frentes, pois imaginava que o golpe seria passageiro e a normalidade democrática voltaria logo.
O PCdoB, que chamava o povo a cobrar do governo o atendimento de suas reivindicações, avaliou o golpe de maneira correta, como um atentado duradouro à democracia. A articulação golpista foi percebida muito cedo pelo Partido e denunciada pelo jornal A Classe Operária; em 28 de março, em uma reunião em Niterói (RJ), o Comitê Central constatou a iminência do golpe de Estado e flexibilizou sua oposição a Goulart, decidindo apoiá-lo em defesa da legalidade. Depois da tomada do poder pela direita, o documento O golpe de 1964 e seus ensinamentos apontou que o alvo dos golpistas foi a luta democrática e popular. Voltava-se contra a relativa liberdade que permitia a organização dos trabalhadores da cidade e do campo; o -avanço do movimento democrático e anti-imperialista preocupava seriamente os reacionários do país e dos Estados Unidos-, registrou aquele documento, onde foi feita também uma autocrítica de erros esquerdistas.
O regime nascido em 1964 eliminou a democracia, perseguiu, torturou e assassinou democratas, nacionalistas e progressistas. E aumentou a dependência externa do país, ao ancorar o desenvolvimento na busca de capitais estrangeiros e na atração de empresas multinacionais.
A luta contra a ditadura militar
Entretanto, o regime militar foi marcado pela resistência popular e também por contradições entre as classes dominantes e entre os próprios chefes militares. A ditadura só conseguiu durar duas décadas à custa de prisões, perseguições políticas contra os adversários, torturas e assassinatos de democratas, patriotas e progressistas, que passaram a ser encarados como -inimigos internos-.
O esforço para derrotar o regime ditatorial exigiu a união de todos os setores democráticos, proletariado e trabalhadores do campo, intelectuais, profissionais liberais, classes médias e setores antiautoritários da burguesia. Na desagregação final da ditadura, até mesmo setores oligárquicos dissidentes juntaram-se a esse arco de forças.
Essa ampla unidade patriótica e democrática era preconizada, já em junho de 1966, pelo documento União dos brasileiros para livrar o país da crise da ditadura e da ameaça neocolonialista, aprovado pelo PCdoB em sua 6ª Conferência Nacional. Aquele documento sinalizava que a tarefa urgente para os democratas brasileiros era lutar contra a perseguição política, por liberdade para os presos políticos e exigia, pioneiramente, a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. Pregava o uso de todas as formas de luta contra a ditadura, como -desfiles, comícios, greves, marchas contra a carestia, assembleias sindicais, paralisações parciais de trabalho- e até a luta armada, dependendo da situação política e das -condições concretas de cada lugar-.
Em condições extremamente desfavoráveis, o povo resistiu à ditadura. Logo de início, nos primeiros meses do arbítrio, cresceu a resistência dos estudantes. Em 1968, a repressão ao Congresso da UNE em Ibiúna (SP), com dezenas de presos, é um exemplo da resistência; vários estudantes deram a vida nessa luta pela liberdade, como Honestino Guimarães, assassinado sob tortura em 1973.
As populações da periferia das grandes cidades voltaram a se mover em meados da década de 1970. A Igreja católica progressista teve, então, um importante papel, ao abrigar os lutadores do povo e muitos de seus dirigentes e militantes mais destacados, entre eles os comunistas. Defendiam o atendimento de necessidades imediatas, como creches, transporte público, abastecimento de água e saneamento. Em 1973, surgiu a Carta das Mães da Periferia de São Paulo, que exigia providências do governo contra a alta do custo de vida. O movimento cresceu e levou à criação, em 1977, do Movimento do Custo de Vida (mais tarde rebatizado como Movimento Contra a Carestia), em uma assembleia popular ocorrida em São Paulo, com mais de sete mil pessoas. Nessa assembleia foi lançado o abaixo-assinado pelo congelamento dos preços que, até agosto de 1978, reuniu 1,3 milhão de assinaturas dirigidas ao general Ernesto Geisel, que ocupava a presidência da República.
As ações armadas na cidade e no campo - em especial a Guerrilha do Araguaia - impuseram forte desgaste ao regime militar. Quando elas foram vencidas pela repressão feroz e sanguinária, a resistência contra a ditadura começou a tomar a forma de ações de massa, sinalizadas pela eleição de 1974 e também pela movimentação das classes médias, dos trabalhadores e dos moradores das periferias das grandes cidades. Um marco que simboliza a ferocidade da repressão policial contra os lutadores do povo é a Chacina da Lapa, ocorrida em 16 de dezembro de 1976, na qual dirigentes do PCdoB foram assassinados, a tiros e sob tortura, e outros presos e torturados. O objetivo daquela ação repressora - diria anos depois o então comandante do II Exército, sediado em São Paulo, o general Dilermando Monteiro - era assassinar João Amazonas, que os sicários da repressão imaginavam participar da reunião do Comitê Central que ocorria naquele local.
Em 1977, importantes setores sociais e populares irromperam no cenário político democrático, como os advogados e os estudantes. Era a luta de massas que retornava ao cenário. Os primeiros divulgaram a Carta aos Brasileiros, em 11 de agosto de 1977, na Faculdade de Direito de São Paulo, assinada por 100 juristas que exigiam o retorno ao Estado de Direito e a convocação de uma Assembleia Constituinte. Os estudantes já haviam se destacado na luta contra a ditadura nas décadas de 1960 e 1970. A UNE e outras organizações, duramente perseguidas, reapareceram em 1977, quando os estudantes voltaram às ruas exigindo anistia e liberdades democráticas.
A onda democrática cresceu inicialmente na forma da exigência pela anistia, que surgiu desde o início da ditadura. Mas somente em 1975 foi criado o Movimento Feminino pela Anistia, que ajudou a popularizar aquela bandeira; em 1979 surgiu o Comitê Brasileiro pela Anistia, que massificou e fortaleceu a luta, desembocando na anistia de 1979, que, embora limitada, permitiu a abertura de uma nova etapa, com o retorno de lideranças populares e progressistas que estavam na clandestinidade ou no exílio.
Apesar das limitações, a anistia ampliou o espaço democrático, ao criar condições para a volta à atividade, embora em condições ainda semiclandestinas, de organizações políticas populares que os militares tentaram, sem êxito, banir. Como o PCdoB que, desde 18 de outubro de 1979, publicou seu jornal de massas, a Tribuna da Luta Operária.
Foi o início do vagalhão da luta popular que, nos anos seguintes, levou a ditadura de roldão. Em 1978 reaparecem as greves de trabalhadores da indústria, bancários, professores, médicos, funcionários públicos e outras categorias. Em 12 de maio de 1978, a greve dos operários da Saab Scania, em São Bernardo do Campo, foi o estopim do grande movimento que rompeu o silêncio imposto à classe operária e aos trabalhadores. O auge da luta de massas foi a greve de 1980, que infringiu uma derrota política decisiva ao projeto de abertura restrita e limitada dos generais. A ditadura mobilizou forças policiais e militares, tentou cooptar lideranças moderadas, prendeu, impôs perdas econômicas aos trabalhadores. Tudo em vão. Nos anos seguintes, a luta continuou e se aprofundou com a reorganização das entidades centrais, cujo marco foi a realização da I Conferência Nacional das Classes Trabalhadoras (I Conclat), em agosto de 1981.
Em 1982, um passo importante na busca da normalidade democrática foi a eleição direta de governadores - a primeira desde 1965 -, levando destacados líderes da oposição aos governos estaduais em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e outros sete estados, abrangendo a maior parte do poderio econômico, da população e do território nacional. As oposições estavam agora, depois de décadas, em condição de usar aqueles governos para impulsionar a luta democrática.
A ditadura terminou, mas a direita continua atuante
A oposição legal à ditadura deu um salto com a vitória eleitoral do partido de oposição legal à ditadura, o MDB, na eleição de 1974. A Arena, partido dos generais e da direita, vencera as eleições realizadas em 1966 e 1970, à base da fraude, repressão e perseguição aos candidatos oposicionistas. Na eleição de 1974, a vitória da oposição foi insofismável. O MDB teve 59% dos votos para o Senado (elegendo 16 dos 20 senadores) e 48% para a Câmara Federal (obtendo 165 dos 364 deputados federais).
Desde 1983 a campanha pelas Diretas Já ganhou o país num movimento que teve importante participação dos comunistas. Mais de 8 milhões de pessoas saíram às ruas das capitais e grandes cidades. Quando a emenda constitucional que propunha a eleição direta para presidente da República não foi aprovada pelo Congresso, em 25 de abril de 1984, começou o esforço para manter as ruas ocupadas e derrotar a ditadura no próprio colégio eleitoral espúrio que ela criara para homologar a indicação de seus presidentes.
A candidatura oposicionista de Tancredo Neves à presidência tomou forma depois de um esforço de convencimento que teve a participação decisiva do dirigente comunista João Amazonas, que garantiu à sua candidatura o necessário apoio da militância. Em agosto de 1984, a candidatura de Tancredo Neves foi formalizada com José Sarney como vice e com o compromisso de formar um governo de transição, cuja principal tarefa seria convocar uma Assembleia Nacional Constituinte em 1986.
O fim da ditadura militar resultou da prolongada luta do povo pela democracia. O candidato das oposições à presidência da República na última eleição indireta em 1985, Tancredo Neves, teve 480 votos contra os 180 de Paulo Maluf, candidato do PDS, dos generais e das forças mais retrógradas da sociedade brasileira.
Aquele foi o desfecho da sucessão presidencial do general João Batista Figueiredo, o único general presidente que não conseguiu indicar seu sucessor. Pela primeira vez desde 1964 a sucessão presidencial ganhava as ruas, contando com uma influência popular decisiva apesar do ambiente de dificuldades que, em documento publicado em setembro de 1984, a direção nacional do PCdoB caracterizou como antidemocrático e de -grande descontentamento popular e crise em expansão-.
Para o povo e os trabalhadores, a superação da ditadura significava o fortalecimento da democracia, a ampliação da soberania nacional, com distribuição da renda, saúde, educação e democratização das relações de trabalho. As liberdades democráticas reconquistadas em 1985 foram institucionalizadas pela Assembleia Constituinte que elaborou a Carta Magna de 1988 e reconciliou os brasileiros com o regime democrático de direito.
Foi com base num programa que atendia a essas exigências que o então candidato da Frente Brasil Popular, Luiz Inácio Lula da Silva, concorreu (com chances reais de vencer) à presidência da República, em 1989. Ele teve o apoio do PCdoB e demais correntes progressistas e democráticas.
Mas foi o programa neoliberal das classes dominantes que prevaleceu, inicialmente, na ultrapassagem daquela encruzilhada histórica. A queda do Muro de Berlim e as mudanças ocorridas nos países socialistas do Leste Europeu fomentaram o surgimento de um ambiente político conservador fortemente explorado pela direita. Foi nesse quadro que Fernando Collor de Mello venceu a eleição para a presidência da República, em 1989, mas não chegou a concluir seu mandato. Foi sob Fernando Henrique Cardoso, eleito em 1994, que o programa neoliberal foi aplicado mais intensamente, embora tenha encontrado forte resistência popular, democrática e mesmo em setores empresariais.
Os anos seguintes à redemocratização foram marcados pelo conflito acirrado entre os dois modelos. Um - o neoliberal, antidemocrático e antipopular - baseado na subordinação do país ao imperialismo e à divisão internacional do trabalho. O outro - democrático, popular e patriótico - exigia o desenvolvimento autônomo e soberano, com valorização do trabalho e distribuição de renda. Com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, voltaram a surgir as condições para a retomada de um modelo de desenvolvimento nacional e democrático. A vitória de Lula recolocou na pauta política as profundas reformas representadas, duas décadas atrás, pelo programa das reformas de base derrotado militarmente no golpe de Estado de 1964. O Brasil reencontrava seu caminho para o desenvolvimento e a modernização efetiva.
* Renato Rabelo é presidente nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB).
Referências
BANDEIRA, Moniz. O Governo João Goulart: as lutas sociais no Brasil (1961-1964). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
BASBAUM, Leôncio. Uma vida em seis tempos: memórias. São Paulo: Alfa-Ômega, 1976.
MORAES, Dênis de & VIANA, Francisco. Prestes: lutas e autocríticas. Petrópolis: Vozes, 1982.
PROJETO BRASIL Nunca Mais. T. III: Perfil dos Atingidos. In: http://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/nunca/05.pdf, consultado em 29 de janeiro de 2013.
RUY, José Carlos & BUONICORE, Augusto (orgs.). Contribuição à história do Partido Comunista do Brasil. São Paulo: Anita Garibaldi, 2010.
LEGENDAS
Passeata estudantil pela anistia, Viaduto do Chá, São Paulo, 1978
Atividade do PMDB na campanha eleitoral de 1982