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Edição 127 > CTB promove campanha contra o PL 4.330
CTB promove campanha contra o PL 4.330
Dezenove ministros do TST condenaram o projeto do capitalista Mabel, mas a mídia burguesa silenciou e a opinião pública não faz ideia do que pode significar a generalização da terceirização

Tramita na Câmara Federal uma proposta que escandaliza a consciência jurídica nacional e deixa o movimento sindical em estado de alerta e mobilização. Trata-se do Projeto de Lei 4.330, que escancara a terceirização na economia brasileira a pretexto de regulamentá-la. Tal projeto é repudiado pelas centrais sindicais, por parlamentares de esquerda, advogados, juízes, ministros e especialistas da Justiça do Trabalho. Mas a nossa burguesia não abre mão de sua aprovação, fechou questão e promove um poderoso lobby no Congresso para impor seus interesses.
Em geral, no Brasil, como em quase todo o mundo, o recurso à terceirização do processo de produção e distribuição avançou com o neoliberalismo e a chamada reestruturação produtiva, como parte da ofensiva capitalista para reduzir o custo da força do trabalho, driblar a legislação trabalhista e ampliar os lucros empresariais aumentando o grau de exploração da classe trabalhadora.
Estudo recente do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) não deixa margens a dúvidas a este respeito. O assalariado terceirizado ganha, em média, 27% menos que o contratado diretamente pela empresa-mãe; trabalha mais tempo; está sujeito a uma rotatividade maior; não goza dos mesmos benefícios; e é tratado, até pelos colegas, como um indivíduo de quinta categoria. A degradação do trabalho se reflete de forma dramática na saúde. O trabalhador terceirizado é quem mais sofre acidentes de trabalho.
A terceirização ocorre quando a força de trabalho do peão é vendida por um intermediário, que lucra com isto -, ou seja, arranca-lhe -, a famosa mais-valia revelada por Karl Marx. Deste modo, o terceirizado é submetido a uma dupla exploração: produz ao mesmo tempo o lucro da contratante e da contratada. Exacerba-se aí a chamada alienação do trabalho, pois o terceirizado é ainda mais estranho e alheio aos desígnios e destinos da empresa onde produz, e geralmente não fica por muito tempo.
A terceirização não é um desdobramento natural e inevitável da globalização nem uma mera modernização do processo de trabalho, como sustentam os porta-vozes do capital. Trata-se de uma política deliberada da burguesia para precarizar as relações trabalhistas, arrochar salários, cortar direitos e dividir a classe trabalhadora. Não é de estranhar que seja também um canal para o trabalho escravo em pleno século XXI.
O número de terceirizados no Brasil cresceu admiravelmente ao longo dos últimos anos, a despeito da resistência do movimento sindical, e é estimado hoje em 12 milhões. Atualmente, a Lei limita a terceirização, admitindo-a apenas em quatro hipóteses: contratação de trabalhadores por empresa de trabalho temporário (Lei 6.019, de 03 de junho de 1974); contratação de serviços de vigilância (Lei 7.102, de 20 de junho de 1983); contratação de serviços de conservação e limpeza; contratação de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexista a pessoalidade e a subordinação direta.
O PL 4.330 generaliza a terceirização, nos setores privados e públicos, estendendo-a à atividade-fim, além de consolidar a responsabilidade subsidiária da empresa-mãe (e não solidária, como querem as centrais) em relação aos débitos trabalhistas. O deputado Sandro Mabel, um capitalista goiano, é capaz de jurar que o PL de sua autoria vai proteger o trabalhador contra o mau patrão. O argumento, repetido em uníssono pelo empresariado, não ilude os representantes da classe trabalhadora, que estão convencidos do contrário; e contam, neste sentido, com amplo e inesperado respaldo da Justiça do Trabalho.
Surpreendentemente foi da Justiça de Trabalho, e não dos partidos e sindicatos, que emergiu a consciência mais aguda e avançada sobre os riscos embutidos no PL 4.330. Nada menos que 19 dos 26 ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) subscreveram um parecer encaminhado à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal no dia 27 de agosto deste ano, no qual condenam o projeto do capitalista Mabel com invulgar energia e apontam seus prováveis desdobramentos.
-A diretriz acolhida pelo PL 4.330-A/2004, ao permitir a generalização da terceirização para toda a economia e a sociedade, certamente provocará gravíssima lesão de direitos sociais, trabalhistas e previdenciários no País, com a potencialidade de causar a migração massiva de milhões de trabalhadores hoje enquadrados como efetivos das empresas e instituições tomadoras de serviços em direção a um novo enquadramento, como trabalhadores terceirizados, deflagrando impressionante redução de valores, direitos e garantias trabalhistas e sociais-, alertam os ministros, cujo documento foi depois apoiado e subscrito por todos os presidentes e corregedores dos 24 Tribunais Regionais do Trabalho (TRT) existentes no território nacional.
A generalização da terceirização abre a possibilidade da existência de empresas sem funcionários próprios ou com um quadro reduzido ao extremo do necessário. Neste sentido, conforme os juízes, -o PL esvazia o conceito constitucional e legal de categoria, permitindo transformar a grande maioria de trabalhadores simplesmente em -prestadores de serviços- e não mais -bancários-, -metalúrgicos-, -comerciários-, etc.-. Isto também significaria o esvaziamento, ou mesmo o desaparecimento, dos sindicatos na forma como existem hoje, além das repercussões negativas sobre a organização nas bases e formação da consciência de classe.
Sintomaticamente, a mídia burguesa silenciou diante do petardo lançado pelos 19ministros do TST contra o PL 4.330, limitando-se a editoriais invariavelmente favoráveis ao patronato, num comportamento que apenas revela o seu caráter antidemocrático, reacionário. Neste tema, os interesses do capital e do trabalho são antagônicos e inconciliáveis, o que explica o fracasso da comissão quadripartite criada com a ilusão de que se poderia chegar a um consenso em torno da proposta.
A Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) entende que a luta contra a generalização da terceirização é uma batalha de classes indeclinável e que tem grande dimensão e relevância, embora sobre isso haja hoje uma escassa consciência. Por isto, estamos em campanha contra o PL 4.330, que pode ir a voto no Plenário da Câmara a qualquer momento. Não mediremos esforços para esclarecer e conscientizar o povo trabalhador sobre o que está em jogo e a importância desta nossa luta em defesa da dignidade e dos interesses da nossa classe.
* Adilson Araújo é presidente da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil)
LEGENDAS
Adilson Araújo, presidente da CTB
Cartaz da campanha da CTB contra o PL 4330