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Edição 124 > Uma caminhada democrática
Uma caminhada democrática
Talvez o mais importante resultado da parceria entre o PT, o PCdoB e os outros partidos da nossa coligação, nesses 10 anos de governo democrático e popular, tenha sido justamente o fato de o povo ter passado, pela primeira vez em nosso país, a ser protagonista da história. Não foi à toa que adotamos o slogan ?Do povo, pelo povo, para o povo? nas celebrações dos 10 anos dos nossos governos. Agora, para ampliar a democracia, precisaremos de reformas estruturais, entre elas a reforma política e a democratização da comunicação

O Partido Comunista do Brasil (PCdoB) é, desde a constituição da Frente Brasil Popular em 1989, um dos principais parceiros do Partido dos Trabalhadores (PT) na luta por um país mais democrático e socialmente justo. Na raiz dos nossos partidos está a fé inabalável no futuro do Brasil. Queremos um país sem miséria e dividimos as responsabilidades na construção de um governo popular, que traga respostas às profundas contradições existentes em nossa sociedade.
Desde a origem crítico à ideia dos regimes de partido único, o PT bateu-se, desde seu 5º Encontro Nacional, por uma política de alianças, dentro e fora do parlamento, que desse conta da complexidade da sociedade brasileira, a fim de poder alcançar nosso objetivo estratégico de construir uma sociedade justa, fraternal e democrática - uma sociedade socialista.
Decorre daí a articulação de um amplo bloco de forças políticas e sociais que, em 2002, construíram juntas um programa de governo e uma vitória eleitoral, guindando à presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva. Primeiro operário a governar o país, Lula escalou um ministério pluripartidário, organizando uma coalizão que, sob a liderança do PT, tem sido responsável pelas profundas transformações políticas, econômicas, sociais e culturais na última década.
Desde então, e sempre em parceria com o PCdoB, teses comuns amplamente discutidas em seminários e conduzidas pelos líderes dos dois partidos acabaram se materializando em revolucionárias mudanças sociais. Destaco aqui, apenas para ficar em duas propostas extremamente representativas, a valorização do salário mínimo e o reconhecimento formal das centrais sindicais.
As coalizões partidárias são importantíssimas, principalmente se analisarmos o sistema político vigente no Brasil. Vivemos em uma espécie de -presidencialismo parlamentar-, onde nem sempre o partido que vence as eleições tem maioria no Congresso. Todo partido que assume a responsabilidade de governar deve buscar ampliar seu leque de apoio, desde que os integrantes da coalizão aceitem as premissas do nosso programa de governo. Em nosso país, o apoio ao Executivo no Congresso é fundamental para conseguirmos o que, popularmente, é chamado de governabilidade. Nesse trabalho, de criar uma maioria que dê condições efetivas para a execução do nosso plano de governo, o PCdoB tem se mostrado um parceiro fiel e alinhado com os objetivos estratégicos de mudança liderados por Lula e pela presidenta Dilma Rousseff.
Nessa caminhada, o PCdoB tem se destacado ao fornecer quadros de altíssima qualificação para compor nossos governos. São pessoas profundamente engajadas na luta pela mudança e que apresentam sempre ideias e projetos originais e de grande viabilidade prática.
Importante destacar ainda a importância da atuação dos comunistas do Brasil em nossa sociedade, durante 91 anos, liderando entidades populares representativas e que realizam o -bom combate-. Trabalhando nas bases sociais para que as ideias e os planos dos nossos governos recebam apoio da população. Apoio, diga-se, fundamental, na perspectiva de que enfrentamos forças imensas ligadas à manutenção dos privilégios arcaicos das classes dominantes.
Talvez o mais importante resultado da parceria entre o PT, o PCdoB e os outros partidos da nossa coligação, nesses 10 anos de governo democrático e popular, tenha sido justamente o fato de o povo ter passado, pela primeira vez em nosso país, a ser protagonista da história.
Não foi à toa que adotamos o slogan -Do povo, pelo povo, para o povo- nas celebrações dos 10 anos dos nossos governos. Mais que tudo, o aprofundamento da democracia está na raiz de todos os avanços do Brasil na última década. Depois de séculos de opressão e, por último, do alinhamento ao neoliberalismo, acumulamos conquistas populares que antes só faziam parte da nossa utopia, graças à nossa convergência em torno desses governos.
Utopia, aliás, que continua latente, tanto no PT quanto no PCdoB. Temos ainda muito por fazer. Como disse o ex-presidente Lula em seu primeiro governo, começamos fazendo apenas o necessário. -Depois, vamos fazer o possível e, quando menos se esperar, nós estaremos realizando o impossível-. Nós não perderemos isso de vista.
Nestes 10 anos, aconteceu realmente o que Lula disse em 2003: demos mais atenção aos que mais precisam, mas sem excluir ninguém. Como eu disse na celebração dos 10 anos, no Anhembi, em São Paulo, provamos que -aquilo que era considerado estorvo pelos governos anteriores era, na verdade, força e impulso para o Brasil crescer-.
Não foi pouco o que fizemos juntos. Mais de 36 milhões de brasileiros saíram da miséria. Priorizando os mais pobres, nossos governos expandiram a economia do país, gerando mais de 18 milhões de empregos formais, aumentando significativamente a renda dos trabalhadores, gerando inclusão social e diminuindo o flagelo da pobreza. Garantimos a inclusão dos mais pobres e dos negros nas universidades, avançamos no combate à violência contra as mulheres.
A inflação foi controlada, diminuímos a relação entre a dívida e o PIB e a vulnerabilidade externa, além de passarmos de devedores para credores do FMI. Sob a liderança de Lula e Dilma, hoje somos respeitados como potência econômica e referência quando se fala sobre diminuição das desigualdades. Nunca tivemos tanta respeitabilidade no exterior, inclusive agora quando, em conjunto com os chamados BRICS, constituímos um fundo alternativo ao FMI para socorrer os parceiros em uma crise eventual.
Mais que tudo, a melhoria nas condições de vida do nosso povo significou elevação da cidadania. Também a interlocução permanente e solidária de nossos governos com os movimentos sociais, como jamais ocorreu, é outro exemplo de ampliação dos direitos democráticos.
Para nós, democracia implica, necessária e simultaneamente, democracia política e democracia social. E precisamos fazer muito mais para aprofundar a democracia. Por isso, precisamos investir no aperfeiçoamento sempre constante das instituições e na ampliação da participação popular, para a consolidação de uma moderna democracia de massas. Desigualdade social também significa desigualdade política.
Campanhas para 2013
Para ampliar a democracia precisaremos de reformas estruturais. Priorizamos duas para a nossa luta em 2013. São inadiáveis uma reforma política que corrija mazelas de nosso sistema e também o alargamento da liberdade de expressão nos meios de comunicação, tal como previsto nos artigos da Constituição Federal e à espera de regulamentação legal.
Na agenda prioritária de 2013 do PT, estamos caminhando juntos com o PCdoB também em duas grandes campanhas por essas mudanças. Reforma política e regulação da mídia são dois temas de alta relevância que, embora diferentes, convergem muito nos intuitos e nos próprios princípios de nossos partidos, de ampliação da democracia no Brasil.
A reforma política é urgente para combatermos a corrupção, baratear custos das campanhas, ampliar a unidade entre candidatos e partidos e ampliar a participação de gênero na política. Depois de muitas tentativas no Congresso, nós decidimos lançar, em abril deste ano, uma grande campanha nacional. Queremos chegar ao final do ano com mais de 1,5 milhão de assinaturas da população e o encaminhamento de um projeto de lei de iniciativa popular. Vamos lançar essa campanha em nosso próximo Diretório Nacional, que realizaremos em São Paulo neste mês de abril.
Nossa proposta se fixa em três pontos fundamentais: o financiamento público exclusivo de campanha, o voto em lista com paridade entre homens e mulheres e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte exclusive para a reforma política.
Estamos convencidos de que o financiamento público exclusivo inverterá a espetacularização eleitoral, combaterá a corrupção e acabará com o peso do poder econômico na política eleitoral. Além disso, com as listas partidárias, haverá mais sintonia entre os candidatos e seus partidos.
Outra campanha que está em curso em nossas bases e nos movimentos populares e sindicais foca na regulação da mídia no Brasil. Nossa avaliação destaca a urgência da democratização da mídia e está resumida na resolução do Diretório Nacional que realizamos no início de março, em Fortaleza (CE). Nós pontuamos que nosso governo tem uma dívida com a sociedade, ao não ter conseguido adotar a regulação exigida pela Constituição e cujas linhas gerais foram definidas pela Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Por isso, estamos, junto com o PCdoB, apoiando a campanha do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e da CUT neste sentido.
No PT, nós priorizamos o cumprimento dos artigos da Constituição que proíbem a existência de monopólios e oligopólios, além da aplicação da complementaridade, ou a convivência de três tipos de sistema de comunicação. Claro que há uma grande e poderosa resistência, manifestada em setores da mídia, que tem optado por confundir a sociedade ao apregoar que pretendemos instituir censura. Logo os partidos do campo popular, que enfrentaram a ditadura e a censura, inclusive aquela promovida pelos donos dos veículos sobre os jornalistas.
Mas confiamos em que as ações de nossos partidos e dos movimentos sociais e sindicais, no diálogo com a sociedade, serão vitoriosas. Vamos conseguir reunir, juntos, mais de 1,5 milhão de assinaturas para esse projeto de Lei de Iniciativa Popular, esclarecendo a opinião pública sobre as mudanças necessárias. Vamos unir forças e furar o bloqueio daqueles que hoje estão interditando o debate político com a sociedade.
Todos os países têm algum tipo de regulação sobre os meios eletrônicos. Mas no Brasil o debate não tem prosperado. Com a convergência das mídias, cada vez mais o direito à informação é interativo, coletivo e social. É preciso que o Estado, em nome da sociedade, fixe parâmetros e regras que não impliquem restrição de conteúdo, mas normas de funcionamento para esses meios, que são cada vez mais poderosos, formam opiniões e difundem interesses.
No Brasil, a Constituição fixou algumas regras para os meios de comunicação: os artigos 220, 221, 222 e 223. O que temos defendido no PT é que o marco regulatório se restrinja ao que está escrito na Constituição, que carece de regulamentação. É preciso também estimular o surgimento de um setor público de comunicação, ter novas normas e leis que protejam as rádios comunitárias para que não aconteça como atualmente, com boa parte funcionando ilegalmente. A própria normatização das TVs abertas exige um percentual de conteúdo nacional e, para isso, precisa produzir um conteúdo que atenda à complexidade do país, as culturas, aos sotaques.
Com relação à mídia impressa, não há nenhuma interferência do marco regulatório, a não ser a discussão sobre a necessidade ou não de uma lei específica para o direito de resposta, que não tem relação direta com o marco regulatório. A revogação da velha Lei de Imprensa, produzida na ditadura, deixou um vazio jurídico no Brasil. Pessoalmente, entendo que deveríamos ter uma lei específica que não jogasse sobre o jornalista e sim sobre as empresas a responsabilidade sobre reparações de conteúdo e, até, financeiras, em caso de dano moral.
Na reunião do Diretório no início de março, fizemos um apelo ao governo para que reconsidere sua decisão de não fazer essa discussão agora. O próprio Congresso Nacional, se quisesse, poderia regulamentar os artigos da Constituição independentemente do Executivo. Mas não parece ser esse o quadro no Congresso. Será por meio da pressão da sociedade que conseguiremos avançar na necessária regulação da mídia. Com a campanha, devemos frisar que não queremos regular conteúdos além do que a Constituição estabelece, sequer estabelecer censuras. Ninguém vai mexer com o futebol na TV, ninguém vai acabar com as novelas. Ao contrário: em vez de acabar com o futebol, é preciso democratizar a possibilidade de mais gente transmitir as partidas.
Estamos há anos falando da democratização da comunicação e fica parecendo que não vamos conseguir isso tão cedo, mas a pressão da sociedade e a influência das mídias digitais, a sociedade em movimento, uma grande pressão social podem mudar a cabeça das pessoas. Por isso a importância dessa campanha ir às ruas. Sabemos que, mais uma vez, o PCdoB estará ao lado do PT e dos movimentos sociais, coletando assinaturas.
O que acabamos de ver acontecer na Inglaterra inspira ainda mais nossa luta tão antiga. Em resposta ao escândalo que revelou os crimes do News of the World, os principais partidos ingleses anunciaram um acordo para regulação de jornais, revistas e da internet. Foi criada uma instância, que é independente do governo e das empresas de mídia, para substituir a agência Press Complaints Commission, que vinha sendo considerada incapaz de combater os crimes da imprensa, funcionando até como lobby da própria mídia.
A nova agência aplicará multas de até três milhões de reais ou de até 1% do faturamento das empresas. E poderá adotar medidas para proteger o cidadão, além de ter o poder de obrigar a publicação a realizar as correções de reportagens e publicar pedidos de desculpas. A adesão das empresas de mídia ao órgão será voluntária, mas a não adesão implicará o risco de punições ainda maiores caso elas sejam enquadradas nas novas normas. O texto final será submetido à rainha agora em maio.
O acordo produzido no Parlamento britânico foi bem aceito pelos grupos de mídia ingleses. A lição que fica é que mídia é fundamental para que a liberdade de expressão seja de todos e não apenas de alguns poucos, porque visa a garantir direitos, e não o contrário. E a outra é que o diálogo pode melhorar a credibilidade e solucionar problemas sociais. Mas os capitães da mídia brasileiros não dão sinais de semelhança com os britânicos.
Ao lado da campanha liderada pelo FNDC -Para Expressar a Liberdade - Uma nova lei para um novo tempo-, e para chegarmos a um Projeto de Lei de Iniciativa Popular, há de se envolver ativamente nossos partidos políticos e o Congresso Nacional.
O desafio de 2014
O desafio agora é consolidar e dar efetividade às conquistas democráticas dos governos de Lula e Dilma, justamente em um momento em que nossos adversários propagandeiam teses esdrúxulas como o -descontrole da inflação- e, até, sobre uma reedição do racionamento de energia ao qual o país foi submetido justamente durante a gestão dos tucanos e seus aliados neoliberais.
Entendemos que os ataques desferidos contra o governo Dilma destinam-se a precipitar a campanha eleitoral de 2014 e atrapalhar a tarefa incessante de concretizar o conjunto de medidas populares em curso. Não por outra razão, eles se opuseram à redução das tarifas de energia, à isenção de impostos para os produtos da cesta básica e insistem na elevação das taxas de juros.
Trata-se de uma reação desesperada à grande aprovação e popularidade da presidenta e de nosso governo registrada em todas as pesquisas de opinião.
Vamos continuar dando apoio e sustentação à presidenta Dilma e, no momento apropriado, construir as condições para sua reeleição em 2014. Estamos certos de que, também para esta tarefa, além dos aliados da coalizão governamental, teremos novamente o PCdoB como parceiro fundamental.
A estrada para os nossos projetos, de fortalecer e aprofundar a democracia no Brasil,está solidamente pavimentada para 2014.
* Rui Falcão é presidente nacional do PT e deputado estadual em São Paulo