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Internacional

Edição 122 > Os Estados Unidos, Barack Obama e a América Latina

Os Estados Unidos, Barack Obama e a América Latina

Cristina Soreanu Pecequilo
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O segundo mandato de Barack Obama traz a marca da continuidade na política interna e externa, revelada na opção do eleitorado pela manutenção do equilíbrio de forças entre o Executivo e o Legislativo, dividido entre republicanos e democratas. Para o mundo e a América Latina, a polarização destas forças domésticas representa a preservação de tendências opostas de uni e multilateralismo, do engajamento e da contenção do processo de reordenamento do poder global

A reeleição do democrata Barack Obama, em novembro de 2012, representa um ponto de inflexão na trajetória dos Estados Unidos (EUA) em meio à contínua crise econômica, estratégica, política e social que o país atravessa ao longo desta primeira década do século 21. Esta inflexão é composta por elementos internos e externos simbolizados pela permanência das polarizações domésticas e pressões estruturais que já haviam fornecido o contexto para a vitória de Obama em 2008, com base em uma agenda sustentada em promessas de reforma, mudança e esperança.

Quatro anos depois, esta tríade foi uma das principais adversárias do presidente, dado o teor populista dos acontecimentos de 2008 e pela natureza de um pleito no qual o ocupante do cargo deseja mantê-lo, o que implica uma avaliação da performance do governo. Mais do que se confrontar com o programa do Partido Republicano da chapa Mitt Romney-Paul Ryan, a tática democrata foi a de enfatizar os progressos alcançados, mudando o slogan da mudança e do -sim, podemos-, para o -caminhar adiante- (forward). O próprio Obama fez a defesa da continuidade em sua agenda interna e externa, devendo-se avaliar as consequências e dinâmicas desta opção para os EUA, o mundo e, mais especificamente, a América Latina.

A campanha e a dinâmica

do status quo

 

Da mesma forma que Barack Obama optou pela continuidade - não abrindo mão das prioridades de seu governo apesar das pressões democratas derivadas da derrota nas eleições de meio de mandato de 2010 para a linha mais radical do Partido Republicano, o -Partido do Chá- (Tea Party) -, o eleitor também escolheu a preservação do status quo no pleito nacional. Logo após a derrota nas eleições de meio de mandato, não foram poucos os democratas que recomendaram à Casa Branca o abandono de políticas mais polêmicas, que eles mesmos não haviam defendido perante o eleitorado naquela oportunidade.

Na pauta destas adaptações, encontrava-se desde o corte de gastos governamentais, ao rechaço dos projetos de cobrança de impostos dos mais ricos, até a redução do apoio a grupos sociais de direitos das minorias (sendo temas-chave deste debate, casamento de pessoas do mesmo sexo, aborto, direitos reprodutivos e imigração). Em termos de política externa, propunha-se uma atuação mais decisiva contra países inimigos, como Irã, Cuba, Coreia do Norte e Venezuela, a pressão sobre a China devido a seus ganhos econômicos em prejuízo dos empregos norte-americanos (e também sobre a Índia), o controle do tráfico de drogas (Colômbia e México) e a imigração ilegal (com, novamente, papel destacado ao México e à -guerra da fronteira-). No campo das guerras do Afeganistão e do Iraque, preservou-se, porém, o apoio ao governo devido ao sucesso do cronograma de retirada do Iraque, à morte de Bin Laden e a expectativa da futura saída de solo afegão.

Obama deveria caminhar mais ao centro e, para alguns, até a direita, o que não foi aceito pela Casa Branca. Não existiram, assim, nem alterações de agenda do lado democrata e nem a redivisão de forças em Washington, com os democratas mantendo o controle da presidência e do Senado, os republicanos da Câmara. Em muitos pleitos, a divisão de votos foi quase igual entre os partidos, 50% para cada lado - o que pode ser interpretado como uma insatisfação com republicanos e democratas, com ligeira vantagem aos democratas devido à pauta republicana. Obama, de forma ampla, foi favorecido pelas escolhas da campanha republicana em duas dimensões: a formação de uma chapa com candidatos sem razoável apelo popular ou carismático, com um vice-presidente de forte ligação com a direita religiosa; e a ausência de uma agenda programática de renovação.

 

As arenas de debate

 

No que se refere à primeira dimensão, a radicalização em temas sociais e o menor foco em questões econômicas alienaram parte significativa do eleitorado, principalmente mulheres (tema dos direitos reprodutivos) e trabalhadores da classe média e média baixa (estes mais afetados pela crise). Além disso, declarações de Romney contra esta parcela da população favoreceram a percepção de descolamento entre o partido republicano e os setores populares nos estados em disputa (i.e. estados sem tendência eleitoral pré-definida como republicano ou democrata e que mudam seu voto a cada eleição). Dentre estas declarações destacam-se as não-oficiais de Romney, criticando -os 47% que vivem do governo- e que não precisam votar nos republicanos, e a crítica aberta (e oficial) à ajuda do governo às empresas automobilísticas que impediu sua falência.

Também foram amplamente criticadas as demais políticas de incentivo e gastos governamentais para o crescimento do país e a reforma de saúde, que, segundo os republicanos, são a crescente fonte do déficit governamental e do abismo fiscal. Em contrapartida, foram reduzidos os gastos em defesa e apaziguados inimigos na visão republicana, em particular, Irã, Cuba, Coreia do Norte e Venezuela. Adicionalmente, o tratamento dado às relações bilaterais com a Rússia e a China, tema recorrente na campanha de Romney como fator responsável pela crise econômica dos EUA, foi negativo. Como se pode perceber, aqui se observa uma quase repetição de temas defendidos pelos setores democratas mais à direita em 2010.

Este conjunto de prioridades, igualmente, impediu avanços em redutos tradicionais do partido democrata, as minorias hispânica e negra, que votaram maciçamente em Obama. Contrariando a expectativa republicana de que estes grupos não votariam em 2012 devido à frustração com o governo democrata, houve forte mobilização dos setores sociais. E, no caso, uma mobilização bastante pragmática: não necessariamente acreditando plenamente na nova promessa do -mover adiante- de Obama, mas na ameaça do retrocesso que era associada à candidatura republicana.

Esta ausência de agenda programática para a dimensão interna estendeu-se à arena internacional, que reproduziu, em larga medida, um programa da Guerra Fria, visando a atrair grupos de interesse específico para o lado republicano. Dentre estes grupos, o complexo industrial-militar, o setor energético, os lobbies anti-Castro, pró-Israel são alguns dos principais interlocutores. No caso da América Latina, em termos comparativos, enquanto o programa de Obama oferecia um panorama mais abrangente das relações com o continente - incluindo comércio, meio ambiente, direitos humanos, imigração e narcotráfico, além do reconhecimento do poder brasileiro como nação emergente e estabilizadora no hemisfério -, o de Romney enfocava a preocupação com as tendências não-democráticas e agressivas de Cuba e Venezuela.

Em termos gerais, a política externa de Obama em campanha não se afastou, como a política interna, de questões estratégicas e táticas já vigentes durante os quatro primeiros anos de mandato. A retórica do poder inteligente (smart power), a defesa do multilateralismo e da cooperação com novos centros de poder, como estão presentes na Estratégia de Segurança Nacional de 2010, mantiveram-se, lembrando o porquê de Obama ter conquistado o Prêmio Nobel da Paz em 2009. Ao mesmo tempo, contrapuseram-se iniciativas de caráter unilateral, de pressão político-econômica, com avanços militares. Episódios como a intervenção da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), sob a bandeira das Nações Unidas (ONU), ilustram esta dualidade, assim como as reações à Primavera Árabe e a autonomia dos emergentes na forma dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), dos IBAS (Índia, Brasil, África do Sul) e da OCX (Organização de Cooperação de Xangai), o que se estendeu para a América Latina.

 

A América Latina na Agenda Estratégica

 

Tomando como base o primeiro mandato de Obama, a América Latina não se configurou como prioridade das relações internacionais norte-americanas - o que reflete uma tendência tradicional da política externa dos EUA ao longo do século 20 e início do 21. Em sua maioria, as políticas norte-americanas demonstram-se reativas a eventos no hemisfério de caráter intra e extrarregional que ofereçam alternativas a sua hegemonia ou representem ameaça a seus interesses. As políticas direcionam-se no sentido de preservar a zona de influência do país na região, nos moldes conhecidos da Doutrina Monroe (1823). Elas consistem em eventos que elevam as preocupações dos norte-americanos como a autonomia das nações latino-americanas, projetos de política interna e externa que se distanciem do modelo liberal na política e na economia, avanços na integração regional, ganhos de poder regionais e globais e a abertura de alternativas de cooperação extrarregionais.

Na década de 1990, a presença norte-americana no sentido de preservar estes objetivos desenvolveu-se por meio dos projetos de criação da zona de livre comércio hemisférica, da implementação da agenda neoliberal do Consenso de Washington e da defesa dos novos temas do meio ambiente, direitos humanos, imigração e narcotráfico como componentes de uma agenda de segurança compartilhada. Neste contexto, foi criado o Acordo de Livre Comércio entre EUA, Canadá e México (Nafta), reforçando o controle geopolítico e geoeconômico norte-americano ao norte.

Projetos como a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) dominaram os debates econômicos até meados dos anos 2000, alternados com declarações de parceria estratégica na região. Ao mesmo tempo, pressões foram realizadas quando, a partir do mesmo período do esvaziamento da Alca, as nações latino-americanas adotaram políticas de autonomia, sustentadas na eleição de governos de esquerda localmente como os de Hugo Chávez na Venezuela, Evo Morales na Bolívia, Rafael Correia no Equador e Luiz Inácio Lula da Silva no Brasil. Subjacente a estas iniciativas, manteve-se o viés de pressão a Cuba, preservando o embargo da Guerra Fria.

Estas políticas foram mantidas por W. Bush, somadas à tática dos acordos bilaterais de comércio (e à solidificação da zona de influência na América Central com o Acordo de Livre Comércio de 2007, o Cafta), associadas ao reforço da projeção estratégica dos EUA na América do Sul. Por sua vez, Obama, de 2009 a 2012, preservou esta agenda, esperando a sua continuidade para seu segundo mandato.

Mas, efetivamente, o que significa indicar que a política externa dos EUA para a América Latina será marcada pela continuidade em Obama II- Quais são os pilares de ação do primeiro mandato e que tendem a se repetir no segundo-

 

A contenção hemisférica

(e global)

 

Avaliando especificamente esta pauta, duas dimensões podem ser identificadas: a econômica e a político-estratégica. Em termos de dimensão econômica, a tendência é de preservação da tática corrente de estabelecimento de tratados bilaterais de comércio entre os EUA e países de América Latina, de preferência os que já se encontram mais próximos à esfera de poder norte-americana como Peru, Chile, Colômbia e nações da América Central. Neste âmbito, é baixa a probabilidade de que os EUA retomem uma proposta similar à da Alca. A integração regional deterá caráter limitado como simbolizado pelos citados Nafta e Cafta.

Como iniciativa diferenciada na integração, porém, deve-se estar atento ao estabelecimento da -Parceria Transpacífica- (TPP) no âmbito da estratégia de fortalecimento do pivô asiático militar-político-econômico dos EUA na Ásia. Embora dirigida à Ásia, a TPP estende-se ao entorno da América do Sul que detém fortes laços com o Pacífico (novamente Chile, Peru, Colômbia como países de destaque). O estabelecimento da TPP e seu sucesso podem afetar tanto a China, cuja contenção é a base da nova estratégia do pivô asiático, como o Brasil, e projetos de integração regional autônomos na América do Sul como o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e a Unasul (União Sul-Americana de Nações).

Esta resposta às ações sino-brasileiras (e também em certa medida as do continente africano, do IBAS e dos BRICS) também influencia a dimensão político-estratégica da agenda para a América Latina. Três elementos são de particular interesse para os EUA, e que podem significar perda de acesso para os norte-americanos destes benefícios e resultar, como contrapartida, em ganho de poder a estas demais nações: mercados, recursos (alimentos e matérias-primas) e energia (gás e petróleo do pré-sal).

As coalizões estabelecidas entre as nações emergentes, países em desenvolvimento e de menor desenvolvimento relativo no espaço geopolítico da América do Sul, África e Ásia, têm reforçado a cooperação e interdependência político-econômica entre estes países. Isto permite não só uma ação mais direcionada nas organizações multilaterais como as Nações Unidas, a Organização Mundial do Comércio (OMC), G-20 financeiro, Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional (FMI), como a elevação do poder de resistência destas nações em nível interestatal. A diminuição de sua vulnerabilidade tem impactos diretos nas suas relações com os EUA e na abertura de novas possibilidades de alianças de geometria variável nos eixos Sul-Sul e Norte-Sul (inclusive excluindo os norte-americanos).

Diante deste cenário, as reações dos EUA tiveram como foco a preservação da liderança na América Latina e o reposicionamento estratégico nas regiões da América do Sul e do Atlântico Sul, por meio da militarização. Dentre as iniciativas que compõem este quadro encontram-se: a reativação da Quarta Frota do Atlântico Sul, o aumento de investimentos no Comando Militar do Sul (USSOUTHCOM), a criação do Comando Militar da África (USAFRICOM), o combate ao narcotráfico na Colômbia (Plano Colômbia) e no México (Iniciativa Mérida), a instalação de bases militares na América do Sul, o combate à imigração ilegal, a definição da Tríplice Fronteira Brasil-Argentina-Paraguai como ameaça, além da instrumentalização de temas da -nova segurança compartilhada-, direitos humanos e, principalmente, meio ambiente.

Para o relacionamento com o Brasil, também não devem ser observadas mudanças, preservando o reconhecimento do país como potência regional e global, associada a ações diretas e indiretas de pressão à política e economia nacionais. Parte destas pressões, inclusive, beneficia-se da dinâmica dos grupos pró-alinhamento dentro do país.

 

Perspectivas

 

Seja no mundo, como na América Latina, ou em relacionamentos bilaterais específicos, como com o Brasil, a tendência é pela preservação das prioridades estratégicas dos EUA, mantendo uma retórica de teor multilateral, contraposta às atitudes unilaterais e aos avanços táticos que visam a dificultar a ascensão dos novos polos diante da hegemonia. Diferente de outras épocas, contudo, a preservação da trajetória de autonomia latino-americana pode ter, também, a sua continuidade diante destas políticas. Para isso, será necessária a preservação das agendas de autonomia desenvolvidas na última década, investindo na consolidação de projetos nacionais sólidos, e da base continental, por meio da integração regional e parcerias extrarregionais.

 

* Cristina Soreanu Pecequilo é professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), pesquisadora em NERINT/UFRGS, UNIFESP/UFABC e UnB. Autora de -Os Estados Unidos e o Século XXI- (Campus Elsevier, 2012)

 

 

 

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