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Internacional

Edição 122 > Sobre o 18º Congresso do PCCh e a visão de mundo dos chineses

Sobre o 18º Congresso do PCCh e a visão de mundo dos chineses

Elias Jabbour*
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O informe apresentado por Hu Jintao ao 18º Congresso do Partido Comunista da China (PCCh) deve ser analisado e estudado à luz não somente de um documento político. A essência do documento está na síntese da visão chinesa de mundo sob as hostes do que se convencionou chamar de “socialismo com características chinesas”. Trata-se de uma junção original do marxismo com uma cultura e filosofia com cerca de 2.500 anos de existência

O final de 2012 foi marcado, de forma quase simultânea, por dois eventos de grande monta, cujas consequências deverão se sentir no futuro imediato. O primeiro deles foi as eleições gerais nos Estados Unidos com a vitória apertada do candidato democrata Barack Obama. O evento seguinte ocorreu sob os auspícios do 18º Congresso do Partido Comunista da China.

1 - Não foi surpreendente a forma como a mídia e a intelectualidade cobriram ambos os eventos. De um lado, a -festa- da democracia representativa, da participação popular e da politização circunscrita ao passado, presente e futuro dos EUA. Do outro lado do mundo, uma sinfonia autoritária ressoava nas paredes do Grande Salão do Povo. Os -especialistas- convocados para exporem suas opiniões sobre ambos os processos não vacilavam em separar o bem (eleições nos EUA) e o mal (18º Congresso do PCCh).

Aos menos incautos ficou latente que a impressão que se tentou passar encerrava - independentemente da crise financeira - amplas possibilidades ao desenvolvimento futuro dos EUA, enquanto a China se esvai em suas contradições internas; contradições essas que tendem ao insuportável diante de um governo de -partido único- inepto e corrupto. As viúvas de Chiang Kaishek deixam claro, em outras palavras, que não será tranquila a inserção política chinesa num mundo marcado por (não) valores liberais de -democracia-, -liberdade de expressão- e -direitos humanos-.

O que pouco se atenta é que aos poucos os chineses vão fazendo valer uma visão muito particular de mundo, calcada numa cada vez maior independência intelectual com relação ao Ocidente e sob o tacão de valores que remontam à contemporaneidade entre a filosofia clássica chinesa (Confúcio, Laotsé) e a fundadora da visão de mundo ocidental na Grécia (Sócrates, Platão etc.). A diferença é que enquanto o homem chinês ainda é pautado por uma formação ética e moral milenar, há muito tempo que os clássicos gregos foram substituídos pelo mercado, a ingerência e a intolerância de todas as matizes na América do Norte e na Europa. Está aí uma diferença essencial a ser anotada e que deve ser levada em conta na análise dos processos encerrados nos EUA e na China.

Existe, de fato, uma Nova China que cresce e se reproduz sem proscrever a herança da Velha China. A Nova China, fundada em 1949, é neta e filha das duas revoluções sociais mais marcantes de que se tem notícia: as Revoluções Francesa e Russa. Da Velha China advêm os alicerces de uma visão de mundo tolerante e civilizatória. Exemplo disto foi a consolidação, neste 18º Congresso, da junção de conceitos como socialismo e sociedade harmoniosa e entre marxismo e estabilidade social. Diferentemente de noções messiânicas de mundo surgidas no Mediterrâneo Ocidental (-Destino Manifesto-, por exemplo), noções de caráter puramente moral se impõem diante dos desafios externos e internos chineses. Neste sentido, é evidente que para os chineses o poder mundial, muito antes de ser atributo político econômico e militar, é parte essencial da promoção de ideias benignas de governança. Em curtas palavras, o poder externo não pode se impor por meios puramente coercitivos e expansionistas e sim pelo -bem tratar dos amigos e vizinhos-, numa feliz expressão confuciana. Está aí uma tradução do significado, histórico e estratégico, de uma política externa pautada pela intransigente defesa da paz, da estabilidade e do direito ao desenvolvimento.

Nada disso significa que existem limites ao desenvolvimento do poderio militar chinês. A necessidade de maior protagonismo militar e marítimo da República Popular da China foi expressa sem meias palavras no Informe ao Congresso. O processo de cerco militar e político da China por parte dos EUA não poderia passar despercebido diante de um país cuja soberania e independência está acima de qualquer adjetivo ou conceito. Tanto a guerra propriamente dita quanto a economia são continuação da política por meios especiais. Clausewitz guarda profunda razão histórica. E os chineses buscam, assim, dar conta de uma estratégia onde a guerra convencional é substituída pelo comércio como arma política; porém sem descuidar do -meio especial- em última instância.

Grande destaque foi dado pela imprensa à temática da corrupção. Realmente, o destaque dado por Hu Jintao a este tema/problema não foi pequeno. Fenômeno objetivo, contradição aguda do processo de abertura ao exterior e da ampliação das relações internas de mercado, a corrupção - do ponto de vista político - é o maior desafio à continuidade da governança do PCCh. O lastro deste desafio de vida ou morte tem largo lastro histórico. A história da Velha China é a história de revoltas camponesas contra dinastias que se desgastavam ao longo do tempo, tornando ineptas, burocráticas e altamente corruptas. Todas as transições da história chinesa foram levadas a cabo por levantes no campo; inclusive a última grande revolta camponesa levou o PCCh de Mao Tsetung ao poder em 1949.

 

 

 

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A China que Hu Jintao entrega a seu sucessor, Xi Jinpeng, é um país muito diferente daquele de 2003. Desde então, o país saltou ao posto de segunda economia do mundo, seu PIB duplicou de tamanho e a sociedade foi ganhando formas mais complexas com a ascensão de uma robusta classe média. A influência política e econômica chinesa elevou-se na mesma proporção de sua transformação em uma potência comercial e financeira. O país hoje é o maior provedor de crédito liquido do mundo.

A crise financeira internacional iniciada em 2008, e ainda sem data para acabar, impôs novos e difíceis desafios à governança do PCCh. Alguns ensaios de reação a crises financeiras localizadas já haviam sido testados com sucesso, notadamente no que concerne à crise asiática de 1997. Remeto-me, novamente, à consolidação de uma visão de mundo chinesa diante desses desafios: um contraponto político ao Consenso de Washington surgiu em Pequim com a execução de políticas monetárias expansionistas para enfrentar crises. Ou seja, no caminho oposto das receitas impostas aos países periféricos na década de 1990 por instituições como o FMI e o Banco Mundial.

É central compreender o processo de constituição da China em uma potência financeira. Para tal, proponho três referenciais que se relacionam diretamente não com o enfrentamento de crises econômicas. Devemos ir mais além e compreender os fatos partindo das respostas que os chineses encontraram diante do desmoronando do socialismo na URSS e no Leste Europeu. O primeiro referencial está na formação, partindo de um amplo processo de fusões e aquisições no setor estatal, de 149 imensos conglomerados empresariais/estatais calcados nos setores estratégicos da economia. São esses conglomerados que lideram tanto os investimentos internos quanto a estratégia global chinesa.

O segundo referencial reside na rápida transformação de um rústico sistema financeiro (de tipo soviético) em um amplo, complexo e diversificado sistema assentado em grandes bancos de investimentos setorizados, em uma dezena de policy Banks e o encaminhamento da fusão de 30 mil cooperativas de crédito rural em cerca de 20 bancos de desenvolvimento voltados à agricultura. Importante relacionar os dois referenciais acima com a importância que Hu Jintao coloca, em seu Informe, ao avanço da ciência, tecnologia e inovação. Vivemos em um país onde as incompreensões acerca deste tema (C, T & I) beiram as raias do absurdo, onde se amplificam máximas nascidas com o neoliberalismo onde o centro do problema é desviado da centralidade da agenda macroeconômica, nesta matéria, para um lúdico discurso de -salvação pela educação- e, no máximo, pacotes de incentivos fiscais. Ciência, tecnologia e inovação num mundo onde o capital está cada vez mais concentrado e centralizado se transformou, há tempos, em um problema de ordem financeira cuja solução encontra-se numa interação maior entre os sistemas produtivo e financeiro.

Resumindo, atualmente a China encontra-se numa previsível transição de uma economia que crescia de forma quantitativa, mais baseada em exportações para outro tipo de crescimento de tipo qualitativo, centrado na incorporação e no valor agregado pela via da incorporação de novas e novíssimas tecnologias engendradas não em território chinês, mas no centro do sistema capitalista. Esta transição é marcada, por entre outros fatores, não mais pelo aumento da produtividade do trabalho pela importação de simples parafusos ou mecanismos simplificados. A produtividade do trabalho, e seu aumento, passam a depender cada vez mais da capacidade financeira do país em importar e investir dezenas de bilhões de dólares em pacotes completos de novas e novíssimas tecnologias. Importante destaque é cabido no aparecimento de uma agenda ecológica como parte integral do que os chineses chamam de Conceito Científico de Desenvolvimento. Mais uma vez chamo a atenção, ao sucesso desta agenda, à incorporação dos aspectos empresarial e financeiro anexos a esta temática nada lúdica.

O terceiro referencial, que se entrelaça diretamente com os dois anteriores, está no programa lançado na primavera de 1999 voltado ao desenvolvimento do oeste. É a etapa final que unificará todo o território chinês num único mercado interno, superando a era da hinterlandia litorânea. Sempre bom repetir (lembrando as observações do embaixador Amaury Porto de Oliveira) que desde seu lançamento cerca de US$ 3 trilhões já foram remetidos para e região tendo como epicentro as regiões autônomas do Tibet e do Xinjiang, sendo - a título de exemplo - a primeira o epicentro de um corredor comercial ligando a China ao subcontinente indiano.

Os três referenciais expostos encerram a face do mundo que adentrará ao final do primeiro quarto do presente século. O mundo (e o próprio socialismo), certamente, será resultado da fusão entre o sistema produtivo e financeiro chinês e da formação desta economia continental. Lembremo-nos da base economia e territorial que serviu de suporte ao poderio norte-americano a partir da segunda metade do século 19.

 

 

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O que são de fato a sociedade e o Estado chineses atualmente- Que indicações podemos tirar do 18º Congresso do PCCh-

É notória a capacidade chinesa de pensar adiante, elaborando estrategicamente seu caminho. Algo que remonta ao congresso que levou Mao Tsetung ao topo do PCCh em 1935, perpassando a iniciativa do próprio Mao de aproximação com os EUA em 1971 até a presente fase, iniciada em 1978 por Deng Xiaoping sintetizada na fusão do Estado Revolucionário fundado em 1949 com a internalização do Estado Desenvolvimentista de tipo asiático em 1978. Um desdobramento de 1978 está, no que tenho repetidamente dito, na elaboração e execução de novas e superiores formas de planejamento, resultado tanto da capacidade milenar do país em planificar seu desenvolvimento (modo de produção asiático ontem, socialismo de mercado hoje) quanto da capacidade financeira chinesa em intervir rapidamente em seu território. A essência do -socialismo do século 21- (tendo a China como seu núcleo) encontra-se exatamente na relação entre socialismo, grandes conglomerados empresariais, sistema financeiro estatal e planificação de nível superior.

Nada disso decorre de uma sociedade amorfa e um partido sem capacidade de se reinventar a cada processo histórico, a cada fase de uma longa transição. Como apontado mais acima, uma das características que marcaram o processo do último Congresso do PCCh está no surgimento de uma intelectualidade com características chinesas, capazes de produzir uma visão chinesa e moderna de mundo que utiliza o marxismo não como um adereço ideológico e sim como aporte científico em plena evolução. Daí a formação de um dito sistema teórico do socialismo com características chinesas, tendo o -Conceito Científico de Desenvolvimento- como sua última escala.

A China do pós-18º Congresso do PCCh é um país cada vez mais pulsante numa sociedade que vai se transformando numa metamorfose ambulante de forma acelerada. Uma plena democracia com características chinesas se faz demandar. Uma democracia não liberal, porém popular. Sob o acicate da reafirmação do socialismo não como uma peça pendurada na parede. Mas de algo que deu condições ao país de trilhar o caminho do desenvolvimento e da plena independência nacional, negado pelas potências imperialistas pré-1949. Onde não existiu Bismarck ou Getúlio Vargas e onde Kerensky e Chiang Kaushek foram incapazes de tocar adiante projetos de nação à altura de suas realidades nacionais, surgiram figuras como Lênin, Mao Tsetung e seus competentes herdeiros.

 

* Elias Jabbour é doutor e mestre em Geografia Humana pela FFLCH-USP; autor de -China Hoje: Projeto Nacional, Desenvolvimento e Socialismo de Mercado- (Anita Garibaldi/EDUEPB, 2012, 456 p.); e membro do Conselho Editorial da Princípios

 

 

 

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