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Fórum Social Mundial

Edição 106 > O protagonismo dos movimentos sociais no FSM

O protagonismo dos movimentos sociais no FSM

Lúcia Stumpf e Rubens Diniz
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Obra de intensas mobilizações e da capacidade de convergência dos movimentos sociais brasileiros e internacionais, o Fórum Social Mundial surgiu, em Porto Alegre no ano 2001, como reação ao avanço da hegemonia neoliberal na economia. Passados 10 anos o FSM se mantém como um importante espaço para as forças progressistas de todo o mundo

O Social Mundial completa 10 anos em 2010. Este marco será comemorado com a realização de uma série de eventos ao redor do mundo. A arrancada desta jornada foi dada em Porto Alegre com o Fórum da Grande Porto Alegre, que contou com a participação do presidente Lula, e a realização de um seminário sobre os dez anos do FSM. Logo em seguida, o território FSM se deslocou para Salvador, que sediou o Fórum Social Temático Bahia. Somados, os dois eventos realizados em terras brasileiras contabilizam mais de mil atividades inscritas, cerca de 50 mil participantes vindos dos cinco continentes, duas grandes passeatas e duas exitosas Assembleias Mundiais de Movimentos Sociais (1).
 
O FSM nasce das lutas travadas pelos movimentos sociais na década dos 1990

O FSM surge em 2001 em um contexto de intensas mobilizações sociais contra o neoliberalismo. Ao longo da década de 1990, a América Latina e outras regiões do mundo viveram o recrudescimento das lutas populares e a rearticulação de organizações e redes internacionais.

O povo latino-americano não assistiu calado à ofensiva conservadora patrocinada pelos Estados Unidos e apoiada pelos governos locais de então. A resistência ganha às ruas com o Caracazo de 1989 na Venezuela, seguido pelo Fora Collor dos estudantes cara-pintadas do Brasil em 1992, e do levante indígena de 1994 em Chiapas. Paralelamente a isto, inicia-se um lento processo de surgimento e fortalecimento de organizações e redes internacionais, como Aliança Social Continental (ASC), FCOC (Frente Continental de Organizações Comunitárias), CLOC (Coordenação Latino-Americana de Organizações do Campo) e a OCLAE (Organização Latino-Americana e Caribenha de Estudantes), entre tantas outras.

A realização de encontros como o Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes realizado em Cuba em 1997, que reuniu 16 mil jovens na defesa de uma nova ordem internacional, a campanha contra o Acordo Multilateral de Investimentos (AMI) realizada entre 1997-98, as grandes mobilizações de Seattle em 1999 inspiraram a muitos demonstrando ser possível a coordenação de ações internacionais dentro de um espectro político diverso e, desta forma, resistir à escalada global do neoliberalismo.

No Brasil, também em 1999, o Fórum Nacional de Lutas, espaço amplo de unidade de setores político e sociais, organizava a marcha dos 100 mil a Brasília, questionando os rumos da política econômica do governo FHC.

O FSM realizado em janeiro de 2001 em Porto Alegre surge, portanto, com a força das mobilizações organizadas internacionalmente e da capacidade de unidade e convergência das organizações e entidades dos movimentos sociais brasileiros (2).

Uma usina de força na resistência ao neoliberalismo

De sua primeira edição até hoje, o FSM tornou-se uma usina de forças na resistência ao neoliberalismo, contribuindo principalmente com as mudanças políticas em curso na América Latina. Sobre este prisma é que os 10 anos do FSM devem ser avaliados: quanto avançaram os movimentos sociais, forças progressistas e partidos políticos na constituição do chamado “outro mundo possível”? Ou, como questiona o sociólogo Emir Saber, quanto o FSM viu avançar a conquista “dos objetivos a que se propôs, quando começamos a organizá-lo, há uma década atrás”?(3).

Quando relembramos o cenário político em que vivíamos em 2001, de hegemonia do pensamento único e das ideias liberais expressas em projetos neocolonialistas como a Alca (Área de Livre Comércio das Américas), e o comparamos com o cenário atual, não devemos subestimar a contribuição dada pelo FSM nesse processo de avanços de conquistas políticas e sociais.

Passados 10 anos da realização do primeiro FSM, o mundo se mantém sob a hegemonia conservadora, com os EUA utilizando uma política externa militarista para se manterem como o epicentro do sistema internacional. No entanto, emergem novos polos de poder oriundos essencialmente do sul político do Globo, traços de um mundo em transição.

A América Latina, ao contrário de ser anexada pela Alca, hoje é um desses novos polos de poder que se distanciam cada vez mais da influência dos EUA. Os governos progressistas, eleitos com apoio dos movimentos sociais, têm dado prioridade a políticas que promovam o desenvolvimento com soberania e bem-estar social. Na área externa, têm priorizado a defesa da integração latino-americana fortalecendo instâncias como Mercosul, Unasul e Alba. Políticas como a criação do Banco do Sul, a substituição do dólar nas transações comerciais, a luta pelo fim das assimetrias econômicas entre os países do continente e a constituição de uma doutrina própria em matéria de segurança e defesa, expressa pelo Conselho de Defesa Sul-Americano, são projetos de forte caráter contra-hegemônico e anti-imperialista.

Os movimentos da América Latina passaram nesta década de uma fase de resistência a uma etapa de construção e implementação de alternativas. E várias delas foram formuladas e debatidas nos eventos realizados no FSM. Os próprios presidentes da região têm participado dos Fóruns mais recentes, com o intuito de escutar e debater propostas com os movimentos sociais para avançar na construção deste “outro mundo”.

Desta forma é possível afirmar que nestes 10 anos o Fórum Social Mundial tem dado uma importante contribuição para a luta dos movimentos sociais na América Latina, servindo de inspiração para milhares de outras pessoas ao redor do mundo.
 
Disputa de ideias e convergência na ação

O Fórum Social Mundial é, portanto, marca deste tempo. Ao mobilizar centenas de milhares de ativistas em suas diversas edições, estabelece-se o cenário mundial como palco privilegiado para que movimentos sociais articulem suas lutas e calendários, aprofundem debates, lancem campanhas e plataformas.

Isso é possível, pois cada vez mais o FSM se consolida como um espaço aberto e democrático, propício à batalha de ideias e concepções. Aos poucos, velhos preconceitos e falsas dicotomias presentes nas primeiras edições do Fórum vão perdendo a centralidade. A ideia de que o FSM seria “o movimento dos movimentos”, a oposição entre novos e velhos movimentos, a negação dos partidos políticos, a chamada “nova geração política” e a negação do papel das lutas nacionais foi superada. Hoje prevalece a compreensão de ser possível alcançar a união entre movimentos, partidos e governos progressistas, respeitando-se os preceitos expressos na Carta de Princípios do FSM.

Conforme afirmou o intelectual Boaventura de Souza Santos em entrevista recente, o FSM “precisa ser compreendido exatamente como o espaço de diálogo crítico entre as diversas instâncias de luta pela emancipação social, respeitando inteiramente a autonomia dos movimentos sociais e reconhecendo neles novos protagonistas, e também de entabular novas interações com a luta na esfera política e suas instâncias próprias – incluídos os partidos de esquerda” (4).

A experiência da Assembleia Mundial dos Movimentos Sociais

Uma experiência que merece ser avaliada com destaque no decorrer dos 10 anos do FSM é a realização das Assembleias Mundiais dos Movimentos Sociais (AMMS), momento de convergência de bandeiras e ações dos movimentos em nível internacional. Realizadas desde a primeira edição do FSM, as AMMS foram incentivadas pelo conjunto dos movimentos sociais brasileiros que, como já afirmado anteriormente, possuem uma rica experiência em trabalhar dentro da diversidade no intuito de criar unidade de ação.

As AMMS buscam ser o espaço onde os movimentos presentes no Fórum apresentem sua leitura sobre a conjuntura e as ações que desenvolverão no decorrer do ano, construindo convergências de agendas. Entre as lutas convocadas pelas AMMS está a mobilização de 15 de fevereiro de 2003 contra a guerra no Iraque. Esta foi a maior mobilização internacional dos últimos anos, reunindo mais de 30 milhões de pessoas ao redor do mundo. O mais recente chamado foi a jornada realizada Contra a Crise e as Guerras convocada no FSM de Belém e realizada em 30 de março de 2009, que no Brasil reuniu mais de 10 mil pessoas.

A construção das AMMS foi pensada com o cuidado de não sobrepor as redes internacionais e temáticas já existentes. Propõem-se a ser o momento catalisador dos debates e das lutas que se articulam no decorrer do Fórum, expressando tal convergência em um calendário comum de ações. Isto as fez serem uma espécie de plataforma internacional de movimentos sociais sem, no entanto, ter como objetivo dirigir a ação desses movimentos. Ao mesmo tempo, às AMMS não compete, e nem buscam, superar o FSM, espaço que tem propiciado esses encontros, como já foi afirmado no artigo “O Fórum Social Mundial e os Movimentos Sociais”, publicado na edição 88 desta revista (5).

As AMMS desde sua criação realizaram dois seminários para avaliar seu papel e sua relação com o processo FSM. O primeiro na Bélgica em 2006 e o último em São Paulo às vésperas da realização das atividades em Porto Alegre e em Salvador. Conforme avalia o Seminário de São Paulo, a conjuntura atual é marcada pela gravidade da crise sistêmica e seus impactos nos países mais pobres do mundo. Explicita a continuidade dada pelo presidente Obama à militarização das relações internacionais, expressa em nosso continente com a instalação de novas bases militares em Colômbia e Panamá e a recente intervenção no Haiti. Denuncia o desrespeito das grandes potências com o meio ambiente, ao se eximirem de buscar soluções para a degradação em curso e tentar penalizar os países em desenvolvimento pelo aquecimento global.

Neste seminário, que contou com a representação de cerca de 40 entidades e redes de América Latina, Ásia, África e Europa, valorizou-se a importância da construção de uma agenda política comum, a começar por uma plataforma de lutas da América Latina que deverá ser articulada com movimentos de outros continentes. Entre suas prioridades está o fortalecimento das AMMS como uma plataforma de lutas e a articulação dos movimentos sociais em nível internacional. Para isto, ao longo do próximo período, distintos encontros regionais devem ser organizados, com a preocupação de agregar novos movimentos sociais e forças políticas  ao processo. O objetivo é fortalecer a construção de uma ampla Assembleia Mundial dos Movimentos Sociais no Fórum Social Mundial que acontecerá no Senegal em 2011.

No Brasil, devemos valorizar sua contraparte nacional ser a Coordenação dos Movimentos Sociais, por ser o espaço mais amplo e com possibilidade de dar lastro nacional para as iniciativas encampadas nas AMMS.
 
Desdobramentos das AMMS na agenda de luta dos movimentos sociais no Brasil

Não por acaso, nas reuniões da Coordenação dos Movimentos Sociais é que ecoou o chamado feito pelo Seminário das AMMS e se organizaram as Assembleias realizadas nos Fóruns de Salvador e de Porto Alegre. Com presença expressiva de público e amplo espectro de entidades participando de sua costura política, é possível afirmar que as edições 2010 das AMMS marcaram com sucesso seu relançamento, dando consequência ao debate gestado no Seminário preparatório.

Em Porto Alegre, mais de mil ativistas lotaram a Usina do Gasômetro para debater e aprovar a Carta dos Movimentos Sociais: 10 anos do FSM, outro mundo é possível e necessário. Em Salvador a mobilização se repetiu, ocupando a quadra do Sindicato dos Bancários na manhã que antecedeu a marcha de encerramento do Fórum, e uma Carta com o mesmo teor foi aprovada. A Assembleia denunciou a natureza da crise mundial: “a crise financeira mundial é uma crise do sistema capitalista. Ela expôs as contradições intrínsecas a esse modelo e quebrou as certezas e a hegemonia do mercado como um deus regulador das relações comerciais e sociais”, afirma a declaração final do encontro (6).

Com forte participação de entidades brasileiras, a Carta dos movimentos sociais não deixou de se manifestar sobre as pautas que mobilizarão os movimentos na batalha eleitoral que se avizinha. “No Brasil, muitos avanços foram conquistados pelo povo durante os sete anos do governo Lula. (...) Porém, muito mais há para ser feito. As reformas estruturais capazes de enraizar as conquistas democráticas não foram realizadas e a grave desigualdade social perpetrada por mais de cinco séculos em nosso país está longe de ser resolvida. Por isso, devemos lutar pelo aprofundamento das conquistas nesse período de embate político que se aproxima”, continua o texto aprovado em Salvador.

Para dar consequência a essas reivindicações, foram convocadas pelos dois encontros a Assembleia Nacional dos Movimentos Sociais e a Conferência Nacional da Classe Trabalhadora para 31 de maio e 1º de junho, respectivamente, ambas em São Paulo.

Os dois eventos, que juntos pretendem reunir mais de 10 mil militantes, têm como objetivo articular e potencializar a intervenção dos movimentos sociais e dos trabalhadores nas eleições de 2010, e serão precedidos de encontros regionais e estaduais.
 
Principais campanhas continentais que emergem do FSM em 2010

Também em âmbito global, vêm dos movimentos sociais as principais contribuições políticas resultantes deste FSM. Dentre os principais consensos alcançados, destacam-se a luta contra a presença de bases militares estrangeiras na América Latina e pela integração solidária de nosso continente, a resistência à volta do neoliberalismo ao poder central de países onde ele começa a ser superado, a luta contra a criminalização dos movimentos sociais e a preocupação com a questão ambiental e as mudanças climáticas em âmbito global.

Em Porto Alegre, uma das mais relevantes atividades do Fórum aconteceu na tenda do Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz), onde foi lançada em âmbito continental a campanha América Latina e Caribe, uma região de paz! Fora bases militares estrangeiras. Tal iniciativa tem possibilitado articular a unidade entre entidades e campos políticos diversos do continente, inédita desde as lutas contra a Alca.

A denúncia contra a criminalização dos movimentos sociais apareceu com destaque em distintas atividades, como nas Mesas organizadas pela UNE e a UBES, no seminário promovido pela centrais sindicais CTB, CUT, FS, UGT, CGTB, NCS além do ato convocado pelo MST que reuniu centenas de militantes.

A preocupação com o acelerado processo de mudança climática em curso no mundo mobilizou os ativistas sociais. No FSM de Porto Alegre foi feita uma avaliação da participação dos movimentos sociais na COP-15, realizada em Copenhague em 2009, apontando a necessidade da realização de debates nacionais que aprofundem os consensos e potencializem a ação dos movimentos nesta luta.
 
Os movimentos Sociais no FSM: muito mais a contribuir

Passados 10 anos, é possível afirmar que o FSM se mantém como um espaço importante na articulação da luta dos movimentos sociais e de forças progressistas de todo o mundo.

Como desafio, está colocada a necessidade de fortalecer a Assembleia Mundial dos Movimentos Sociais em articulação com o espaço FSM. É das AMMS a responsabilidade de mobilizar a sociedade contra o neoliberalismo e apresentar alternativas claras na busca do “novo mundo possível” pensado e discutido nos Fóruns.

Se é certo que os movimentos sociais e articulações progressistas não podem depender visceralmente do FSM para construir essa alternativa, é certo também que ainda hoje o apelo popular do Fórum só tem a contribuir com esta luta. Afinal, o Fórum Social Mundial é marca deste tempo.


Lúcia Stumpf é jornalista e secretária Nacional de Movimentos Sociais do PCdoB.

Rubens Diniz é psicólogo, diretor do CEBRAPAZ e membro da Comissão de Relações Internacionais do PCdoB.

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