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Especial China

Edição 104 > Os 60 anos da Revolução Chinesa

Os 60 anos da Revolução Chinesa

Aldo Rebelo e Luis Antônio Paulino
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Nos 60 últimos anos a história da China poderia ser dividida em dois grandes períodos: um que vai de 1949 a 1978, quando houve a fundação e consolidação da Nova China; e outro que vai de 1978 até os dias de hoje, marcado pela política de reformas e abertura. Tal processo levou a China à condição de grande potência mundial, sob a bandeira do socialismo

A criação da República Popular da China, em 1949, mudou a história da grande nação asiática e influenciou de forma decisiva os destinos do mundo. A Revolução Chinesa extinguiu um regime social e político atrasado, dominado por senhores da guerra e feudais, que condenava o país ao atraso interno e o tornava vulnerável à cobiça das potências ocidentais. A Nova China deu início a um novo tempo para seu povo e demonstrou, na prática, o potencial das ideias transformadoras lideradas por forças políticas consequentes.

A Revolução Chinesa, com todas as suas vicissitudes, não foi diferente de outras revoluções. No seu ímpeto transformador, são como barragens que se rompem arrastando o que encontram pela frente. São momentos radicais, de quebra de paradigmas, quando se põem abaixo velhas estruturas sociais, econômicas e políticas que já não correspondem às necessidades da maioria, e sobre seus escombros se começa a construir algo novo, que não se sabe ainda como será. São instantes de fúria e reflexão, de coragem e sagacidade, de heroísmo e criatividade, de ousadia e paciência. São momentos singulares, enfim, em que todas as fibras da alma humana se retesam no seu limite e em que todas as virtudes e vícios das sociedades afloram sem subterfúgios. Passados aqueles momentos críticos, entretanto, cada revolução segue seu próprio rumo, condicionada pela potência das forças transformadoras e pelas resistências do passado que sobreviveu.

Chama a atenção na Revolução Chinesa o fato de a construção na Nova China ter se dado sobre uma base econômica extremamente atrasada, o que tornou seus desafios e conquistas ainda mais surpreendentes. O povo chinês costuma utilizar a expressão “pobre e inexpressivo” para descrever seu baixo ponto de partida. Tomando como referência o nível de desenvolvimento entre 1930 e 1940, a atividade industrial moderna representava cerca de 10% da produção nacional, enquanto a agricultura e a indústria artesanal representavam mais de 90%. No seu nascedouro, a Nova China foi, portanto, um país agrícola atrasado.

Em 1949, a China já era o país mais populoso do mundo, de modo que sua produção industrial e agrícola per capita era uma das mais baixas do planeta. A produção de máquinas não existia. Equipamentos como aviões, automóveis e tratores não havia como ser produzidos. A cultura e a educação estavam igualmente atrasadas. O analfabetismo era da ordem de 80%, e a expectativa de vida ao nascer de apenas 35 anos.

No início, o governo do povo e o Partido Comunista realizaram grandes esforços para consolidar o novo poder político e o desenvolvimento econômico. Em outubro de 1951, governos do povo foram estabelecidos em províncias, cidades, distritos e vilas, e algumas regiões introduziram a autonomia para grupos étnicos minoritários. O capital monopolista da velha China foi confiscado para criar um sistema estatal de produção industrial, que passou a representar 66% do capital industrial do país, com o objetivo de implantar uma economia estatal socialista. No momento da criação da Nova China, entre as grandes dificuldades enfrentadas estavam o domínio do capital especulativo, a ordem econômica caótica e a inflação descontrolada. O Estado chinês tomou medidas para combater a especulação, melhorar o funcionamento do mercado, estabilizar o sistema de preços e reunificar as rendas e os gastos nacionais, com o objetivo de alcançar melhoras contínuas na situação fiscal e econômica do país.

Um movimento nacional de reforma agrária foi posto em marcha. Na velha China os grandes proprietários rurais e os camponeses ricos, que representavam menos de 10% da população, dominavam 80% da terra. Os grandes proprietários alugavam suas terras e exploravam os agricultores por diversos meios, principalmente a agiotagem. A reforma agrária colocou um fim na propriedade feudal da terra, liberando a força produtiva de mais de 300 milhões de agricultores que puderam ter acesso à terra e dedicar-se com entusiasmo à produção.

Grande trabalho foi feito para livrar a sociedade de vícios, como o tráfico, o consumo de drogas e o jogo. A China sofreu muito com o ópio. Durante os mais de 100 anos posteriores à Guerra do Ópio – quando a Inglaterra obrigou a China a receber o ópio exportado pelos mercadores ingleses em troca de seu chá, sua seda e porcelana desejados pelo Ocidente –, o hábito de fumar ópio cresceu muito e adquiriu dimensões alarmantes. O número de viciados na droga alcançou mais de 20 milhões de pessoas. No fim de 1952, esse hábito havia sido praticamente eliminado.

Depois de anos de trabalho duro, a economia nacional foi restaurada e retomou o caminho do desenvolvimento. Em 1952, a produção industrial já havia aumentado em 77,6% em relação ao índice de 1949. A produção agrícola ultrapassou os números de antes da revolução e o nível de vida do povo melhorou de forma generalizada. Comparado com o nível de 1949, os salários dos trabalhadores aumentaram em 70% em 1952 e a renda dos agricultores em 30%.

Em 1952, Mao Tsetung propôs completar a transição para o socialismo num período de 10 a 15 anos. O governo central lançou o primeiro Plano Quinquenal (1953-1957) de Desenvolvimento da economia nacional, que marcou o início da produção industrial em larga escala, incluindo a produção de aço, aviões, máquinas, ferramentas, automóveis e produtos petroquímicos. Por volta de 1956, a transformação socialista da propriedade dos meios de produção estava basicamente realizada e as suas duas formas públicas – propriedade de todo o povo e propriedade coletiva das massas trabalhadores – alcançaram posição dominante e o sistema econômico socialista foi então estabelecido.

Em 1954, a primeira sessão do Congresso Nacional do Povo, realizada em Pequim, aprovou a Constituição da República Popular da China e escolheu novos líderes nacionais. Mao Tsetung foi eleito presidente da República Popular da China, Liu Shaoqi, presidente do Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo e Chou En-lai, primeiro-ministro.

Realizar a modernização de um país como a China não era, contudo, tarefa fácil. A base a partir da qual se partiu era muito rebaixada, e também por isso muitos erros foram cometidos. Em março de 1957, o Partido Comunista Chinês decidiu realizar uma campanha de retificação no Partido e eliminar ideias consideradas erradas. Esse movimento, de cunho esquerdista – que colocava, equivocadamente, a luta de classes como contradição principal no processo de transformação da sociedade chinesa no momento em que as questões nacional, democrática e anti-imperialista deveriam se constituir no seu elo principal – afetou seriamente o entusiasmo popular de construção nacional, prejudicou a democracia socialista e o equilíbrio da vida social e política.

Em 1958, o movimento do Grande Salto à Frente foi pensado como forma de eliminar a pobreza e o atraso e promover o avanço para o comunismo. Seu fracasso foi uma dolorosa lição. Sua linha geral era alcançar rapidamente grandes resultados econômicos para construir a sociedade socialista. Embora baseado no desejo universal das pessoas de superar o atraso econômico e cultural do país, o plano era voluntarista, com ênfase excessiva no ritmo de construção econômica, fiando-se mais na vontade do povo e no papel dos esforços subjetivos, mas ignorando as leis objetivas do desenvolvimento. O resultado do Grande Salto à Frente não foi o desenvolvimento e o progresso da sociedade chinesa, mas o retrocesso econômico. A economia chinesa declinou rapidamente por três anos consecutivos e o povo viu-se frente a grandes dificuldades.

De 1959 a 1962, o Partido Comunista Chinês tomou diversas medidas para corrigir os erros e por volta de 1965 a situação já era consideravelmente melhor. Entretanto os desvios esquerdistas no seio do Partido não foram corrigidos e a proposta de manter a luta de classes como contradição principal na sociedade resultou na equivocada diretriz de “tomar a luta de classes como elo principal”. Desse modo, em 1966, quando a economia nacional apresentava um bom ritmo de desenvolvimento depois de anos de ajustes, outro retrocesso ocorreu com o início da Revolução Cultural (1966-1976).

Após dez anos de Revolução Cultural a economia encontrava-se, em 1976, à beira do colapso. A segunda geração de líderes chineses, sob a liderança de Deng Xiaoping, colocou um fim à precária situação deixada pela revolução cultural e abriu o caminho para a construção do socialismo com características chinesas, cujo marco principal foi o movimento de reforma e abertura iniciado em 1978.

A reforma e abertura em larga escala e sem precedentes motivou a iniciativa e a criatividade de centenas de milhões de pessoas e criou a bem sucedida transformação de uma altamente concentrada economia planificada para uma viável economia socialista de mercado e de um Estado fechado e semifechado para um Estado aberto ao mundo.

A China começou a levar a cabo a reestruturação do seu sistema econômico rural no final dos anos 1970. Desde 1982, o sistema de responsabilidade de cotas de produção agrícola, e trabalho contratado com base nas unidades familiares, rapidamente expandiu-se por todo o interior da China. Esta forma de organizar a atividade agrícola estabeleceu uma ligação direta entre a produção dos agricultores e os seus ganhos. Como resultado, a prática do sistema de contrato de responsabilidade em base familiar não apenas aumentou o entusiasmo pela produção, como também permitiu à China realizar ganhos contínuos na colheita de grãos.

Em 1981 o partido retificou noções incorretas que não estavam de acordo com os fatos e confirmou que uma economia de mercado poderia existir em uma sociedade socialista. Em 1982, foi apresentada a teoria segundo a qual “a economia planejada estava em primeiro lugar e a regulação por meio do mercado em segundo”. Em 1992 o país avançou no estabelecimento da economia socialista de mercado, o que fez com que o próprio mercado cumprisse um papel essencial na alocação de recursos sob o controle macroeconômico do Estado. Em 1997, a China enfatizou que o país deveria alcançar a transformação no sistema econômico, ou seja, deveria mudar de uma economia planejada para uma economia socialista de mercado e do crescimento econômico extensivo para o crescimento econômico intensivo.

Vistos em perspectiva estes 60 anos da Nova China poderiam ser divididos em dois grandes períodos. O que vai de 1949 a 1978 é o período de fundação e consolidação da Nova China, muito duro para o povo chinês, pois a tarefa de modernizar um país tão vasto, com uma população enorme, uma economia atrasada e um desenvolvimento regional desequilibrado exigiu grande sacrifício do povo e uma enorme capacidade de liderança do Partido Comunista para manter o povo unido em torno do objetivo de construção de uma República Popular e Democrática. A grande figura desse período foi o presidente Mao Tsetung.

O segundo vai de 1978 até os dias de hoje: é o período das reformas e da abertura. Durante essa fase a China realizou uma ampla reforma no campo e nas cidades e nos diferentes setores econômicos, abriu sua economia para o mundo, liberou a energia criadora de milhões de pessoas e levou a cabo uma transformação histórica de uma economia planejada altamente centralizada, que buscava a autossuficiência por meio do isolamento em relação ao sistema econômico mundial, para uma viável economia socialista de mercado integrada à economia global. A grande figura desse segundo período foi Deng Xiaoping. Os grandes acontecimentos que marcaram essa fase foram a Terceira Sessão Plenária do 11º Comitê Central do Partido Comunista Chinês, no final de 1978, que adotou a decisão histórica de reforma e abertura, e a visita de Deng Xiaoping a Shenzen, na primavera de 1992, quando em sua fala aos líderes locais apontou a necessidade de se buscar um novo caminho do socialismo com características chinesas.

Desde então a China tem passado por profundas transformações e todos os que a visitam atualmente ficam maravilhados, pois o que encontram é uma sociedade vibrante onde se percebe o povo orgulhoso de sua cultura e tradições, mas comprometido com o futuro e unido em torno do grande objetivo de construir uma nação rica, próspera e independente.

Esses 60 anos de construção da Nova China nos trazem inúmeras lições. Primeira grande lição: não existem fórmulas prontas para o desenvolvimento. Segunda: é preciso ter ousadia, não se prender a dogmas, se apegar aos fatos e ter sempre a prática como o critério da verdade. Terceira: ideias têm consequências: sem uma ideologia do desenvolvimento nacional não há desenvolvimento nacional. Quarta: as pessoas são capazes de realizar grandes esforços e sacrifícios para desenvolver o país se elas confiam nas suas lideranças e percebem que o resultado do seu esforço se reverte em benefícios para todos e não para apenas uma minoria. Quinta: é preciso valorizar a iniciativa individual, liberar a energia criadora das pessoas, não sufocar o seu espírito empreendedor e permitir que seus esforços sejam devidamente reconhecidos pela sociedade e que o fruto de seu trabalho resulte em melhora de suas condições de vida.

Até 1978 o modelo de desenvolvimento da China buscava a autossuficiência econômica com base no isolamento em relação à economia mundial. Com a política de reforma e abertura iniciada a partir de 1978 a China não apenas transformou seu sistema econômico de uma economia centralmente planejada para uma economia socialista de mercado, como também se integrou plenamente à economia mundial. A China é hoje uma economia mais aberta do que a do Japão. O seu comércio exterior representa mais de 60% do Produto Interno Bruto, o que significa que o fantástico crescimento econômico da China nos últimos anos cria oportunidades de renda e emprego não apenas na China, mas em todos os países do mundo. Atualmente a contribuição da China para o crescimento da economia mundial é superior à contribuição dos Estados Unidos.

O fato de a China ser um país tão grande e populoso torna as coisas sempre mais difíceis. Por maior que seja qualquer número na China, quando dividido por 1,3 bilhão de pessoas se torna muito pequeno e qualquer problema da China, por menor que seja, quando multiplicado por 1,3 bilhão de pessoas se torna muito grande. O peso econômico de um país na economia mundial se reflete naturalmente no seu peso político e diplomático. Na medida em que a China ocupa os primeiros lugares da economia mundial seu peso político e diplomático é cada vez maior. As opiniões da China sobre qualquer questão, desde a reorganização do sistema financeiro internacional até a questão do meio ambiente e segurança internacional, são ouvidas com atenção por todos os países e líderes do mundo. Se isso representa o reconhecimento da força e pujança do país, também representa uma grande responsabilidade, pois, cada vez mais, o que acontece na China repercute de forma intensa no resto do mundo. Isso para a China é um grande desafio, pois ao mesmo tempo em que ela precisa resolver seus problemas internos de desenvolvimento, tudo o que ela faz tem grande repercussão na economia mundial. Países como Estados Unidos e Inglaterra se tornaram potências mundiais quando já eram relativamente ricos, o que lhes permitia fazer certas concessões para exercer sua liderança. A China, entretanto, ao mesmo tempo em que se torna uma grande potência mundial é ainda um país relativamente pobre. Essa é uma grande contradição, que coloca sobre a China um duplo desafio: preocupar-se com o seu desenvolvimento interno e com as repercussões de suas políticas no resto do mundo.

Aldo Rebelo, 53, jornalista, é deputado federal pelo PCdoB-SP, e presidente do Grupo Parlamentar Brasil-China. Foi presidente da Câmara dos Deputados e ministro-chefe da Secretaria de Coordenação Política e Assuntos Institucionais (2004)

Luis Antonio Paulino, professor de economia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e diretor do Instituto Confúcio na Unesp

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